Parte 5: As Duas Boas Irmãs

Igor Salgado
Continuistas
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2 min readAug 4, 2017

A Orgia e a Morte são duas jovens graciosas,
Fartas de beijos e de frêmitos incontido,
Cujo ventre engastado em ancas andrajosas
Jamais logrou um fruto em si ter concebido.

Ao poeta infausto, hostil às famílias virtuosas,
Favorito do inferno e cortesão falido,
Cavas e tumbas oferecem, generosas,
Um leito em que o pesar jamais foi recebido.

A sepultura e a alcova, em blasfêmias fecundas,
Nos dão de quando em vez, como boas irmãs
Os prazeres do horror e as carícias malsãs.

Hás de enterrar-me, Orgia, em tuas covas fundas?
Quando virás, ó Morte, envolta em negras vestes,
Sobre os mirtos em flor plantar os teus ciprestes?

(BAUDELAIRE; 1985,p.399)

Este soneto está inserido no capítulo As Flores do Mal, do livro de mesmo nome. Mostra a forma como os prazeres sexuais e até mesmo a morte funcionaram como um refúgio para as inquietações do autor. Conforme exposto nos versos “Jovens graciosas (…) cujo ventre engastado em ancas andrajosas; Jamais logrou um fruto em si ter a” simbolizam as prostitutas parisienses e a vida libertina.

O trecho apresenta, também, uma visão negativa da sociedade em relação a isso e explica como estas mulheres estão à margem da sociedade, exemplificando o olhar solidário do autor para com a situação das prostitutas. Logo no primeiro verso, cria-se uma personificação da morte e do sexo na figura de “jovens graciosas”. O uso dessas metáforas, são amostras do interesse do poeta por temas lúgubres ou eróticos.

Baudelaire demonstra seu posicionamento de ruptura poética, ao se apresentar como um autor infeliz que se opõe às tradições locais e tem afinidade por ambientes boêmios, nos versos: “Ao poeta infausto, hostil às famílias virtuosas; Favorito do inferno e cortesão falido”. Já os versos “Caves (espaço de bares) e tumbas oferecem , generosas, ; Um leito em que o pesar jamais foi recebido” são outros exemplos do gosto do poeta por temáticas relativas à morte e orgia.

Nos dois tercetos do soneto, Baudelaire sintetiza a relação direta entre o prazer considerado profano e a morte. Evidenciado pelos versos “A sepultura e alcovas em blasfêmias fecundas; Nos dão de quando em vez, como boas irmãs; Os prazeres do horror e as carícias malsãs.” reforça essa ideia. Neste trecho, percebe-se o porquê do título do poema.

Quando o autor questiona, nos versos: “Hás de enterrar-me, Orgia, em tuas covas fundas?” mostra como não se sente inclinado a modificar sua condição de homem de esbórnia e reconhece a iminência do fim de sua vida. O último terceto reforça essa ideia “Quando virás, ó Morte, envolta em negras vestes, Sobre os mirtos(tipo de bebida alcoólica) em flor plantar os teus ciprestes?”.

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Igor Salgado
Continuistas

Apaixonado pela sétima arte, atleticano e admirador dos clássicos do Rock.