Imagem: Huffington Post.

A Língua (18+)

Zezé Transcendental
Contos em Português
3 min readJul 26, 2014

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A pele ainda estava fresca quando a língua a tocou. Chegou por detrás da orelha — e foi tão de surpresa que o coração da moça deu uma única batida mais acelerada, fazendo-a soltar a pipoca e puxar o ar rapidamente pela boca, e apenas uma vez. Um giro de endorfina percorreu seu corpo e, a partir dali, já não tinha mais volta…

Fechou os olhos. E a ponta da língua gentilmente lhe tocou a parte mais alta da orelha, como um carrinho de montanha-russa que sobe lentamente o primeiro aclive do percurso para, em seguida, contrair o diafragma de quem dele participa.

O primeiro passeio daquela ponta de língua suave e insinuante foi pelo lóbulo da orelha direita… O som de uma respiração leve se juntou ao roçar de um lábio por ali, produzindo um ruído rouco e quase inaudível.

Naquele momento ela suspirou um “Ai…” cheio de intenções de “Vai…” — e a língua foi.

Desceu pelo lado do pescoço, com sorriso indecente e com a respiração resvalando a nuca. Um arrepio disparou e percorreu pela coluna, fazendo-a corrigir a postura inteira e, após limpar a garganta com um pigarro, a alça da blusa de seda escorreu pelo ombro.

E a primeira peça de roupa se foi.

A língua pegou o outro caminho da bifurcação, e desceu pela frente. Escondeu-se atrás dos lábios, que beijavam a clavícula dela. Aproveitou o cheiro da pele que entrou quando o nariz farejou a região até o queixo; voltou a se pronunciar quando ela manteve o queixo para cima, como quem indica um caminho só de ida.

E ao alcançar o início do contorno do primeiro seio, a língua já podia escutar os batimentos acelerados. Os pequenos poros, antes fechados, já começavam a se abrir, deixando escapar gotas quentes de suor que pareciam ser orvalho, condensado no amanhecer dos sentidos dela.

Fez questão de subir o primeiro morro lentamente, aproveitando a vista do cume, eriçado em braile. Olhou para cima e pôde vislumbrar uma boca entreaberta lá longe, no início do caminho. Votou a olhar o cume.

Enquanto a língua, acompanhada pelos lábios, comemorava a sua chegada ao topo do primeiro seio, orgulhou-se dos pêlos eriçados que deixou pelo caminho e, rapidamente, quis repetir a dose com o segundo. E assim fez.

Àquela altura, a dona do corpo já não se comportava mais como uma humana e mais parecia uma deusa: seus cabelos molhados de suor, com alguns fios grudados ao corpo; seus olhos semicerrados e semi-revirados; os movimentos de arfar que o seu peito denunciava — tudo era indício de que algo mágico, ali, começava a acontecer.

E a segunda e última peça de roupa se foi.

Foi surpreendido pelas mãos dela que, acompanhadas de um olhar e um sorriso, empurravam sua cabeça de volta ao vale entre os seios. E a língua novamente se pronunciou…

Foi colhendo o sabor orvalhado da sua pele, passando pela barriga e pelo lado da cintura; voltou em direção ao umbigo e, seguindo a trilha, admirou a paisagem do monte perfumado e de vegetação rasteira, com uma pequena nascente em sua base…

Como era lindo, aquele monte. Como eram lindas as terras onde estava aquele monte. Como era linda a dona daquelas terras. Como era linda a sua felicidade.

“Vai…”

Era um beijo diferente. Os lábios encontravam lábios, mas o que a língua encontrava não era outra língua; parecia um pequeno doce que, ao ser tocado, provocava abalos sísmicos em todo aquele país. Ela tremia aos poucos e, com as suas mãos — que o acariciavam —, dava as informações que, juntas, conduziram a apenas três momentos:

ritmo — e tudo se movimentava em sincroniza;

pulsação — e o sangue percorria as veias com tanta velocidade, e irrigava a região com tanta ferocidade, que a temperatura em todo o corpo prenunciava uma explosão;

e poesia.

Cada célula do corpo dela parecia se desagregar, e toda a realidade em volta dela deixou de existir. Aquele lugar, onde ela passaria os próximos 5 segundos, era um outro lugar, outra dimensão. Respiração interrompida; batimentos cardíacos parecendo frenéticos e paralisados ao mesmo tempo… Poderia sentir um toque a quilômetros de distância.

Ao retornar, “Obrigada” foi a única coisa que pôde dizer. Ele apenas sorriu de volta.

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Zezé Transcendental
Contos em Português

Profissional de Comunicação; Artista da Música. 🌵✨💜