Problemas e soluções na “empresa 50/50”

Editora Contrarrazões
Contrarrazões
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3 min readAug 3, 2018

Por Ermiro Neto

Não existem estatísticas oficiais, mas a história empresarial brasileira registra, de modo bastante comum, um estranho animal na fauna dos modelos societários: a“empresa 50/50”.

A empresa 50/50 é formada por dois sócios apenas. Em sua maioria, se estrutura na forma de uma sociedade limitada. Não é uma regra, mas normalmente une parentes entre si — irmãos, cônjuges, pais e filhos, a formatação é ilimitada. Há apenas uma norma inafastável. Na empresa 50/50, o capital social é igual e rigorosamente dividido na razão de cinquenta por cento para cada um dos dois sócios, sendo ambos administradores.

Mas o que pode haver de errado em uma sociedade irmanamente dividida entre dois sócios? Enquanto há consenso, nada; mas basta que as divergências se iniciem para que esta estrutura seja o pior dos pesadelos para sócios e empregados.

A sociedade limitada cujo capital social é dividido entre dois sócios não tem controle definido. Nenhum dos sócios tem maioria, de modo que todas as deliberações dependem de consenso. Quando, como é comum, ambos são os administradores, virtualmente todas as decisões — contratar, demitir, pagar, rescindir, etc — dependerão, no mínimo, da ausência de oposição do outro sócio.

Uma estrutura deste tipo gera um desincentivo claro à estabilidade das relações entre os sócios. A divergência é natural entre duas pessoas. No entanto, a empresa 50/50 não acomoda as discordâncias. Antes, ao exigir unanimidade, praticamente impõe que os sócios se afastem caso não tenham a mesma opinião quanto a condução dos negócios.

Felizmente, há salvação para este tipo de sociedade empresária quase cristã. Uma empresa 50/50 exige a adoção de providências importantíssimas:

  • O controle deve corresponder às quotas integralizadas. Embora seja comum que um dos sócios faça investimentos maiores do que o outro, é raro que os contratos sociais especifiquem quanto cada um deles efetivamente integralizou para a sociedade. Na maioria das vezes, simplesmente partem da premissa de que todo o capital social fora igualmente integralizado, o que nem sempre corresponde com a verdade. Trata-se de um erro. Quem contribui mais deve ter mais poder, já que se expôs mais ao risco empresarial. Daí recomendar-se que as deliberações sejam tomadas de acordo com as quotas efetivamente integralizadas, conforme dispuser o contrato social, e não apenas na proporção das quotas.
  • Os sócios devem ter um acordo de quotistas. Por melhor que seja a relação entre os sócios, é fundamental que exista entre eles um acordo de quotistas. No acordo, pode-se regular com mais cuidado questões como a divisão de lucros e os meios para solucionar divergências (a decisão final poderá ser de um administrador profissional ou de um advisor escolhido em consenso pelos sócios). O desenho de um acordo de quotistas obriga os sócios a discutirem pontos importantes da sociedade e com isto anteverem problemas e soluções.
  • Os sócios devem discutir o que ocorre no caso de um litígio. Por fim, no contrato social e no acordo de quotistas, os sócios devem pensar o que ocorrerá caso um litígio entre eles torne-se concreto. Mais especificamente como será calculado o valor da participação do sócio que sai e como será feito o pagamento. Um litígio tem a capacidade de quebrar um negócio. Existindo disposições simples, que reduzam o grau de tensão e incerteza, como uma regra clara para calcular os haveres e a previsão de um prazo razoável para pagamento, menos a empresa sofrerá — o que parece racional e do interesse de todos os envolvidos, mas que nem sempre se torna algo tão facilmente visível em meio a ódios e acusações.

Não há como prevenir todos os problemas e dificuldades que poderão advir de uma relação societária, mas é possível minimizá-los. A assessoria jurídica na elaboração de um bom contrato social e para o desenho de um acordo de sócios ajustado às necessidades é um dos melhores investimentos que os sócios podem realizar.

Ermiro Neto é Advogado. Mestre em Direito (UFBA). Professor de Direito Civil e Direito Imobiliário da Faculdade Baiana de Direito (graduação e pós-graduação). Membro do Instituto Brasileiro de Direito Civil, Instituto de Direito Privado e Instituto Baiano de Direito Imobiliário.

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