A Saga do uso de óculos.

Rafael Costa
O Costaverso
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4 min readMar 6, 2018

Duas duas últimas vezes que eu visitei o oftalmologista, ele veio com esse papinho de lentes. “O que tu acha de usar lentes de contato?”. Ele vem propor isso, logo pra mim, um quase rei de Wakanda que vira uma merda sem óculos.

Eu uso óculos desde os meus 7 anos de idade. Meu pai descobriu a minha miopia enquanto a gente andava ali pelo bairro Santana e ele pediu pra eu ler um letreiro do outro lado da avenida. “O que tá escrito lá?”, “Lá onde?”, “Lá, naquele cartaz vermelho”, “Onde que eu não to vendo?” (voz alterada) “Lá, porra!”, “Ah, lá. Não consigo ler tá embaçado”, respondi. Mas se eu tivesse um QI mais alto, responderia “Pai, eu sou míope, não daltônico”.

No outro dia, eu já tava sentado na cadeira do oftalmologista, lendo aquelas as letras na parede. F, G, I, O… A segunda linha agora, P, R, A, Z, a última linha agora. Que última linha? E se tem uma coisa que é prazerosa, é aquele aparelho do oftalmologista que fica trocando as lentes.

Nem parece que tu está num consultório médico, mas sim numa casa de massagens “Aí. Assim tá melhor, não assim não, assim. Isso. Não a outra. Assim. Ahhh essa. Bem melhor”. E orgasmo vem quando tu consegue ler que embaixo da maldita terceira linha está escrito Instituto de Oftalmologia de Porto Alegre — Telefone 51 3338 8080, olhos de águia.

A visita na ótica é como um provador da Renner. Tu experimenta mil modelos e se olha na frente do espelho, mais preocupado do que vão pensar de ti quando te verem do que seus olhos. E, não adianta, usar óculos sempre vai te deixar com a cara daquele parente que já foi dessa pra melhor e que as vezes tu nem chegou a conhecer. “Ai, parece o tio Jairo”, “Meu deus, parece a tia Jazira”. O nome com J era uma preferencia do pai deles, José, que teve os filhos sempre com o nome iniciando com essa letra. Jacinto, Joana, Janete, João, Jeíson. Pelo menos a mãe escolheu o nome da caçula fugindo da tradição: Geni.
Voltando a ótica, depois de escolhida a armação, hora de tomar a facada com as variadas lentes. Tem as escurecem no sol, as anti reflexo, as multifocais, as que protegem também dos raios ultravioleta… A ótica é um mercado caro e deve movimentar uma grana violenta. E mesmo com todo esse dinheiro, teve que o Google intervir e criar um óculos inteligente e com vários recursos de internet e o escambau — o que não certo (ao contrário da sonoridade do nome da tia Geni para com os irmãos)

Usar óculos pela primeira vez é como ir na concessionária pegar um carro novo. As astes do óculos sem nenhum risquinho. Aquele cheiro viciante de acrílico novo, com metal torcido bem novinho. A lente, de acordo com os dados registrados lá na casa de mass…Quer dizer, no oftalmo. Tu coloca e pronto, parece que tu tá de binóculo. Tua visão tá tão aguçada que tu se acha capaz de calcular mais ou menos quantos centímetros aquela telha da casa do outro lado do morro tá acima das outras telhas. Se prepare mundo, você tem um novo herói.

Mas pra toda a ação, tem uma reação. O uso de óculos exige da gente esforço tremendo. Todo o óculos que vem ao mundo deve ser assinar um contrato antes, dizendo que ele está ciente que pode ser amassado, quebrado, esmagado, jogado, esquecido, pisoteado, largado e alguns outros verbos já conjugados.

Junto a todos esses riscos, o óculos se incorpora a pessoa e aquela preocupação de como as pessoas passarão a nos ver passa a ser uma realidade. Acham que somos mais inteligentes, superiores e sociáveis. Não mudou nada gente, continuo me perdendo na hora de fazer contas com vírgulas, ainda assisto Cartoon Network e não sou convidado pra nenhum churrasco nos finais de semana. E também tem aquele grupo de pessoas acostumadas a te ver lentes e uma armação posionados no rosto se apavoram quando tu tira eles. É que nem o Clark Kent e o Superman. São a mesma pessoa, mas ninguém desconfiou do disfarce mais engenhoso de todos: o óculos.

E eu nem vou mencionar como um míope assite um filme 3D no cinema.

Então, depois de passar por todas essas aventuras e desventuras oculares, ainda acho a ideia da lente de contato apavorante. Desde que eu me conheço por gente, qualquer coisa que caía no olho era desesperador. Um cisco, uma sujeirinha, cruz-credo! Meu deus, vou ficar cego! Ou imagina estar andando na rua, tropeçar e “meu deus, minhas lentes! Não pisem nas minhas lentes!”, eu vejo filmes e sei que isso acontece — antes de conhecer o amor da vida. Agora se me deem licença, vou encerrar o texto por aqui, e ajudar meu colega a encontrar a lente dele que foi parar em algum lugar do cérebro. (…) Calma, é brincadeira.

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Rafael Costa
O Costaverso

Acadêmico de Jornalismo da Unipampa, redator do Blogando, comunicador, fotógrafo, leitor e criador de memes.