ANIMAIS

Gatos-cafés e a busca por afeto

Mais do que ambientes temáticos, os cafés que contam com espaços para gatos intermediam processos de adoção

Maria Laura Suñe
Cotidiano Incomum

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O olhar de quem espera por um café, ou seria um lar? Foto: Flickr/Corey Seeman

Quem tem gato sabe que o bichano é um amigo para todas as horas, assim como o café é uma boa companhia para diversos momentos do dia, então, que tal juntar essas duas paixões? Há mais de 20 anos que o conceito de gato-café foi criado, tendo o Cat Flower Garden, em Taiwan, como o pioneiro. A concepção de gato-café tornou-se uma tendência mundial na última década, e claro, no Brasil não seria diferente. O Café com Gato foi a primeira cafeteria desta temática a ser inaugurada em território brasileiro, em 2014, na cidade de Sorocaba, no interior de São Paulo. Desde então, o país conta com cerca de 20 gatos-cafés, e cada vez eles ficam mais populares, tal como a adoção crescente de felinos. Uma pesquisa realizada pelo Censo Pet, em parceria com o Instituto Pet Brasil (IPB) entre 2020 e 2021, identificou um aumento de 6% na adoção de gatos no Brasil durante a pandemia, isso significa em torno de 27 milhões de felinos adotados no período de um ano.

Mas, afinal, como funciona um gato-café? Basicamente, como qualquer outro café, porém com um adicional de fofura: os gatos! No Brasil, a vigilância sanitária não autoriza quaisquer animais em recintos onde haja comida, por isso existe nesses cafés a catland, ambiente separado do local onde ficam as mesas. É ali que os gatinhos ficam alojados e recebem visitas dos humanos. Além de poder brincar e fazer carinho no felino, o visitante também pode adotá-lo, pois na maioria dos gatos-cafés brasileiros existe parceria com ONGs responsáveis por ofertarem os animais para o estabelecimento em troca de possibilitarem que eles ganhem novos tutores. Sair para tomar um café e encontrar um amor peludo, parece interessante, não?

Para os moradores de Porto Alegre, isso também é possível. O Affogato Cat Café é o primeiro gato-café da cidade. “A ideia existe há muitos anos, é um sonho antigo. A vontade de empreender e a possibilidade de juntar o empreendedorismo com gatos foi maravilhoso”, conta Rafaela Mendes, sócia-fundadora do Affogato. Localizado no bairro Moinhos de Vento, ele está em funcionamento desde o mês de junho deste ano e mediou 27 adoções nos dois primeiros meses, em colaboração com a Resgatto, ONG parceira. Parceria essa que surgiu através de uma busca determinada por ONGs de resgate a gatos pelas proprietárias da cafeteria, Bianca Mickaelsen é a sócia de Rafaela.

A importância dos gatos-cafés

De acordo com a médica veterinária especialista em gatos Rochana Rodrigues Fett, os gatos-cafés surgem com o intuito de promover a adoção e também a desmistificação de que o gato é um animal que não gosta das pessoas. Dessa forma, possibilitam o afeto humano para animais que nunca o tiveram, aqueles resgatados das ruas, marginalizados e normalmente invisíveis aos olhos da sociedade. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), em 2022, somente no Brasil, cerca de 30 milhões de animais estão abandonados, entre esses, aproximadamente 10 milhões são gatos. É como se fosse quase toda a população da capital paulista, mas em quatro patas.

Muitos desses gatos, são adultos, os considerados preteridos para adoção. Conforme Rochana, um animal que não é mais filhote demanda muito mais atenção na hora da adaptação. “O período de socialização do gato novo é muito curto, justamente por ele ser mais curioso fica mais fácil, já o adulto possui uma adaptação mais lenta”, especialmente em um ambiente onde conviverá com outros gatos, como no caso da catland. Pensando nisso, o Affogato Cat Café introduziu primeiramente gatos mais novos na catland, disponíveis para adoção, mas futuramente a empresa pretende abrigar gatos mais velhos, possibilitando que eles tenham um lar. Segundo Bianca, todos os gatos que estão no café já convivem entre si no espaço da ONG Resgatto, logo, são tranquilos para ficarem no mesmo ambiente. Com paciência, comprometimento e cuidado é sim possível promover a todos os gatinhos um ambiente seguro e afetuoso.

Para que essa idealização aconteça, são imprescindíveis determinadas prevenções. No Affogato, há tanto regras para a catland quanto para a adoção. Primeiramente, tem um tempo limite para as visitas na área, afinal, os gatinhos precisam descansar. Apesar da cafeteria ficar aberta até as 18h30, o espaço funciona até às 17h. Existem normas para a entrada do cliente no local, afora deixar todos os pertences do lado externo, incluindo os sapatos. Também é proibido tirar fotos dos animais com flash, assim como acordá-los ou pegá-los no colo.

São permitidas visitas de cinco pessoas a cada quinze minutos, e normalmente são feitas em torno de 30 visitas por dia, o que preocupa Rochana. A veterinária justifica que os animais estão propícios a cansar mais facilmente dessa maneira, com muita exposição, o que tornaria necessário um rodízio de felinos durante a semana. “Acredito que deveria ser obrigatória a presença de um veterinário comportamentalista assessorando esses locais”, diz a especialista. Um veterinário comportamentalista é o profissional especializado na prevenção, no diagnóstico e no tratamento dos problemas comportamentais em animais. Quanto às regras para adoção, há um formulário e uma entrevista com o candidato a tutor. É a Resgatto que se responsabiliza por essa função. Os requisitos são simples: o interessado deve ser maior de 21 anos, residir em apartamento telado ou casa telada sem acesso à rua e, por último, ter compromisso e muito amor para dar.

Vai mais um café?

"Fui atrás da felicidade e voltei com um gato", este é o lema do Gatinhos Café. Inaugurado no dia 8 de agosto, Dia Internacional do Gato, o Gatinhos Café é o segundo gato-café da capital gaúcha. Situado no bairro Rio Branco, o café conta com felinos para adoção concedidos pela ONG Vem Adotar, da protetora Deise Falci. Além dos bichanos disponíveis para adoção no café, a equipe do Gatinhos organiza periodicamente eventos intitulados Vitrine Pet, em parceria com Deise. A Vitrine Pet funciona da seguinte maneira: Deise leva mais felinos para adoção no dia combinado e são distribuídas senhas para os interessados na adoção. Nesse dia, o gatil funciona apenas para visitação de quem já possui o questionário preenchido e compareceu para adoção.

A iniciativa está fazendo muito sucesso, relata Josi Flores, proprietária do Gatinhos Café, assim como as adoções dos gatos residentes do café. Josi conta que em 19 dias de funcionamento, foram adotados 19 gatinhos, um para cada dia. Além da Vitrine Pet, o Gatinhos Café também realiza o projeto Segunda Solidária, onde repostam em seu perfil do Instagram gatos disponíveis para adoçāo de outras ONGs, dando oportunidade para outros felinos encontrarem uma família, através de seu alcance na rede social. "Apesar de todo o trabalho árduo, é extremamente gratificante ver os gatinhos recebendo um lar", finaliza Josi. É importante que as adoções façam tanto sucesso quanto a cafeteria, afinal, todo gato merece um lar, e todo lar merece um gato.

Uma combinação muito fofa e quentinha! Foto: Maria Laura Suñe

Uma troca amigável entre humano e animal

Gabriel Pellenz, de 22 anos, é o exemplo perfeito de público alvo dos gatos-cafés. Apaixonado por gatos desde criança, o estudante já visitou cinco cafeterias no Brasil, incluindo o Affogato. “O que me motivou a visitá-los foi meu apreço por gatos e o desejo de encontrar um ambiente acolhedor onde pudesse interagir com esses animais enquanto desfrutava de uma xícara de café. Minha experiência ao interagir com os gatos na cafeteria foi muito positiva, eles foram amigáveis e receptivos, permitindo que os visitantes os acariciassem e brincassem com eles. No geral, senti que os gatos estavam confortáveis e bem cuidados.”

Infelizmente, Gabriel não pode adotar os gatos, pois mora com os pais, que são alérgicos. “Futuramente pretendo suprir esse amor adotando um gato, quando morar sozinho. Acredito que a combinação de uma cafeteria com a temática de gatos e adoção é uma abordagem muito eficaz para incentivar a adoção responsável, ao permitir que os visitantes interajam com os gatos em um ambiente descontraído e acolhedor, o gato-café ajuda a criar conexões emocionais com os animais, despertando o interesse na adoção”, conta o jovem.

“O gato-café ajuda a criar conexões emocionais com os animais, despertando o interesse na adoção”, Gabriel Pellez, estudante.

Para aqueles que estão pensando em visitar um gato-café, o principal conselho é estar aberto a essa experiência única. É importante respeitar o espaço dos gatos e seguir as regras estabelecidas pela cafeteria para garantir o bem-estar dos animais. Além disso, preparem-se para se apaixonar por um gato e considerem seriamente a possibilidade de adotar um, sempre com muita responsabilidade e afeto.

Reportagem produzida para a disciplina de Fundamentos da Reportagem do curso de Jornalismo da FABICO/UFRGS

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