Racismo não se desculpa

Luana Batista
Cotidiano Sensível
3 min readJul 8, 2018

Numa pesquisa aqui nesta Internet selecionei alguns nomes que nosso amigo Google registrou nos últimos meses. São doze pessoas, algumas menos anônimas que outras, mas todas com algo em comum: racistas. Lucas Almeida; Delzuíte Ribeiro de Macêdo; Tatá Estaniecki; César Menotti; Gustavo Metropolo; Nabrisa; William Waack; Mallu Magalhães; José Guilherme de Almeida; Rudy Landucci; Lívia Cruz; Júlio Cocielo.

E veja só que curioso: a maioria dos racistas no Brasil nunca tem a intenção de ofender, tal qual Júlio Cocielo, que recentemente declarou que Mbappé — atleta de futebol da seleção francesa, “conseguiria fazer uns arrastão top na praia”. Em video, Cocielo disse que se referia apenas à velocidade do jogador. Segundo o raciocínio racista do youtuber, um negro que corre bem só pode ser comparado a um assaltante.

A esposa de Cocielo, Tatá Estaniecki, também não tinha a intenção de ofender quando protagonizou uma vergonha no baile da Vogue, no início deste ano. Tatá fez uma “homenagem” aos negros escravizados usando um acessório para compor seu look carnavalesco que lembrava a máscara de Flandres. Essa máscara, muito conhecida pelas reproduções de Anastácia, era instrumento de tortura usado contra meus ancestrais, mas Tatá não devia saber. E mesmo que soubesse, que mal tem não é mesmo? Ela só quis homenagear, ela não quis ofender.

Da mesma forma, sem qualquer intenção de magoar ou de reforçar estereótipos racistas, o humorista Rudy Landucci usou blackface para imitar personalidades do esporte num programa da FoxSports Brasil. E César Menotti? O músico declarou durante participação num programa de TV que samba é coisa de bandido. Rechaçado, ele se desculpou dizendo que a ingênua piada não representava sua opinião. Era só brincadeira.

Todos os negros conhecemos bem esse tipo de brincadeira em que só o racista se diverte. Essa típica jocosidade brasileira que vê no tom da minha pele o repertório perfeito para a piada que me menospreza, me criminaliza, hipersexualiza, segrega e humilha.

Mas o racismo é mesmo implacável. No caso de Fernandinho, atleta brasileiro que fez um gol contra na última partida da nossa seleção na Copa do Mundo, a torcida racista tem feito questão de ofender sim. Não porque Fernandinho errou, mas porque ele é negro.

A declaração do atleta da seleção da Bélgica, Romelu Lukaku, de que ele é apenas ovacionado enquanto belga ao render bons resultados (do contrário ele se transforma no belga descendente de congoleses) é um exemplo perfeito do que o racismo tem feito com Fernandinho. O atleta virou o preto desgraçado que merece morrer; macaco; negro lixo.

Fernandinho passou dos trinta anos de idade e dificilmente terá a oportunidade de jogar a Copa de 2022. Mas imaginemos que isso aconteça e Fernandinho arrebente no Qatar. Os racistas de hoje serão aqueles que o elogiarão no futuro. Talvez até role um pedido de desculpas, não é mesmo? Afinal, foi no calor do momento, na raiva pela eliminação, foi sem a intenção, foi só um comentário infeliz.

Porque o racismo é o único crime que se paga (e se apaga) com pedido de desculpas, com a falácia da desconstrução que acontece da noite para o dia, com um cínico “eu não tive a intenção”.

Só que hoje eu não estou aceitando desculpas. Eu hoje estou aceitando indenização e cadeia. Perda de patrocínio, demissão, linchamento virtual, ainda é pouco.

Eu quero que os racistas enfiem suas impensadas “frases infelizes” de volta nas suas goelas, a seco e com espinhos. Guarde suas desculpas, branco, e não me estenda sua mão, ainda suja com o sangue dos meus. Sua culpa é histórica. Aprenda: nós não seremos didáticos, nós não seremos passivos, nós não deixaremos passar. Nós não esqueceremos.

Luana Batista

Ativista de Direitos Humanos e estudante de Ciências Sociais da UFF

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