Crônica e literatura jornalística

Catarina Bortolotto
Criative-se
Published in
9 min readApr 19, 2020

Esta é uma publicação coletiva desenvolvida na disciplina de Criatividade e Inovação dos cursos de Design, Jornalismo e Publicidade e Propaganda (Faculdade Satc) com base nos estudos sobre Indústria Criativa. Esse texto abordará a área da crônica e literatura jornalística, seus impactos na cadeia da economia criativa, curiosidades e cases. A equipe editorial que compões este material é composta por Catarina Bortolotto, Caroline Valnier Sartori Pavan, Eduardo Indalêncio Valcanaia, Gabriel da Silva Sampaio, Paula Borges e Rafaela Marangoni Costa.

Uma ótima leitura!

Este artigo abordará:

  • Descrição sobre a área específica;
  • Relação desta área com a Indústria Criativa;
  • Curiosidades e contexto da área no Brasil;
  • Cases e exemplos de empresas e projetos desenvolvidos.

As crônicas relatam fatos do nosso cotidiano, logo um desabafo no Twitter sobre como foi difícil voltar para a rotina de trabalho após passar várias semanas maratonando séries na Netflix, se feito com as principais características das crônicas poderia lhe dar um resultado surpreendente e quem sabe um possível cronista nasceria.

Com a intenção de transformar a visão do leitor e fazendo uso da mistura entre sarcasmo e humor as crônicas ganharam espaço no jornalismo, contribuindo na maneira de como as pessoas visualizam de uma forma mais lúdica o que outrora fora uma notícia. Estas por sua vez possuem frases curtas e linguagem simples, que mostram temas com grande impacto atual de modo leve, sensibilizando-nos no contato com a realidade.

A crônica jornalística tem grande proximidade com o jornalismo literário, que produz reportagens detalhadas, amplas e profundas, fugindo das notícias superficiais porém, sem perder a ética. Sendo produto da combinação entre jornalismo, literatura e história, revelando um universo que geralmente fica escondido nas entrelinhas das matérias tradicionais, apresentando um ponto de vista pessoal sobre a realidade.

Machado de Assis

Estima-se que as crônicas tenham surgido na era cristã de uma forma mais primitiva e ingressado no jornalismo e posteriormente na literatura em meados do século XVI. Adentraram-se no Brasil por escritores que atualmente são bastante renomeados na literatura, tais como Machado de Assis e José de Alencar, ao decorrer do século XIX. Entretanto eles não foram os únicos que contribuíram para que esse gênero fosse cada vez mais disseminado no território brasileiro, dado que existem inúmeros outros escritores que até hoje são elogiados por suas obras, servindo de inspiração para outros cronistas.

Pelé na capa da edição n. 01 da Revista Realidade

Já o jornalismo literário, também conhecido como novo jornalismo, teve início somente quatro séculos mais tarde. Apesar disso, no Brasil, seus primeiros textos foram publicados na Revista Realidade e no Jornal da Tarde no ano de 1966, pelos escritores José Hamilton Ribeiro, Roberto Freire e José Carlos Marão. Entretanto, alguns pesquisadores acreditam que este gênero teve início com a publicação em 1902 do livro “Os Sertões” escrito por Euclides da Cunha.

O que caracteriza-os na Indústria Criativa?

A indústria criativa, ou economia criativa, reúne as diversas profissões que atuam com o uso da criação de conteúdo das mais diversas áreas. Campo que está em grande ascensão no momento, e contribuindo muito para economia do país.

Desta forma podemos destacar que a literatura jornalística e as crônicas representam a área criativa ao trazer de forma coesa e harmônica, uma combinação de factualidade e ficção. Este tipo de abordagem, geralmente vem carregada de adjetivos, personagens e histórias criativas, muito além da notícia. Isso mostra a necessidade de um processo criativo na construção do texto, para dar um olhar mais pessoal e tratar de assuntos complexos, com leveza e identidade. Além da incrível habilidade observadora presente nos cronistas, principalmente do seu ambiente social, que trazem visões e ideias particulares, que até então não foram apontadas por mais ninguém. Isso nos mostra a importância de ser criativo.

E então, qual a importância pra Indústria Criativa?

Além de ajudar a enriquecer o mercado cultural, fazem com que as pessoas se interessem mais por assuntos, que talvez não chamariam tanto a atenção como uma simples notícia sobre o caso. Com isso trazem uma maior movimentação para o setor jornalístico e lhe dá novas possibilidades de expansão.

Onde se encontram as crônicas e literaturas jornalísticas?

Podem ser encontrados nos jornais, blogs, revistas, livros, e músicas. Dentro destes meios surgem vários nomes reconhecidos, tais como Machado de Assis, Luis Fernando Veríssimo, Ruben Braga, Lima Barreto, João do Rio, Euclides da Cunha dentre tantos outros… E o mais interessante é que muitos deles nem sabiam que estavam produzindo esse tipo de conteúdo, tendo em vista que a crônica e o jornalismo literário surgiram anos mais tarde comparado à escrita de Machado de Assis e Euclides da Cunha.

Hoje, encontramos grandes cronistas contemporâneos como Lourenço Diaferia (1933–2008) e Antônio Prata — grandes jornalistas e cronistas da Folha de São Paulo, tendo centenas de obras sobre diversos temas publicadas no mesmo; Eliane Brum — colunista do jornal El País e da Revista Época, desenvolvendo incríveis notícias do tipo literário que posteriormente foram compiladas em um livro. Além de o gênero também poder ser encontrado em diversas músicas como as de Chico Buarque.

A fim de elucidar o conteúdo abordado separamos alguns exemplos de crônicas e literaturas jornalísticas.

1.Chico Buarque possui várias músicas que são clássicos do MPB, mas o que muitos não sabem é que a letra de algumas delas são crônicas, fazendo com que suas composições se tornem ainda mais impressionantes.

Chico Buarque

Com uma pegada mais leve e reflexiva, ele encontra uma maneira de inovar suas canções e dar um toque literário especial que encanta muitas pessoas. Preparamos uma lista destas músicas para você conhecer e se apaixonar!

  • Curiosidade: a música “A Banda” foi lançada em 1966, vencedora do II Festival de Música Popular Brasileira no ano de seu lançamento, é uma das canções que fez mais sucesso durante sua época, e que mantém o mesmo até os dias de hoje. Criada na época da ditadura, A banda buscava trazer o amor, a leveza e a alegria ao povo para que como cita na própria música “A minha gente sofrida/Despediu-se da dor”, aliviassem o medo e a pressão a que eram submetidos. Fazendo a junção do lirismo e leveza da letra a marchinha e o cantarolado da música, após 53 anos ainda fazem grande sucesso pelo país.

2. Antonio Prata, em uma crônica a Folha de S. Paulo do dia 09 de setembro de 2018, relatou sobre a tristeza e insatisfação da grande tragédia do incêndio do Museu Nacional que aconteceu em 02 de setembro do mesmo ano.

Antonio Prata

No texto “Brasil se esfumando”, comenta como o país encontrava-se em ascensão, através de diversos elementos como política, futebol, economia, chamado o “país do futuro” e como o mesmo foi se deteriorando em pouquíssimos anos. Parafraseando a revista inglesa The Economist, que em 2009 publicou a capa com “O Brasil decola” e apenas quatro anos depois “O Brasil estragou tudo?” . Finalizando com o desgosto de 200 anos de história — nossa história — queimados no incêndio, e sem expectativas de melhora.

[…]Agora era só fechar a zaga e administrar a vitória, pensamos; demos uma piscada e ao acordarmos estava 7 x 1 […].

[…]Por aquela época, ressurgiu nas redes sociais uma frase do Millôr Fernandes. “O Brasil tem um enorme passado pela frente”. Aí pega fogo no museu, 200 anos de trabalho e boa parte dos 20 milhões de itens viram fumaça, literalmente — e parece que nem o passado, mais, nós temos. Ao ver o museu queimando minha temperatura foi subindo e fui entrando numa espécie de delírio febril. Aquele futuro do Stefan Zweig não existe mais. O presente é um cadafalso que se abre sob nossos pés todos os dias — só para descobrirmos que embaixo tem uma guilhotina e diante há um pelotão de fuzilamento. E então o passado arde em chamas.

[…]Todas as paredes. E também as árvores. E o coqueiro que dá coco. E as aves que aqui gorjeiam. E nossos rostos faceiros. E nossos corpos inzoneiros. E até o fim da tarde tudo terá virado pó. E o pó será levado pelo vento. E o Brasil nunca terá existido.

Crônica completa

3. Clarice Lispector foi uma Jornalista e escritora, morreu em 1977 aos 57 anos. Era de origem judia e foi reconhecida como uma das maiores escritoras do século XX.

Clarice Lispector

Ela não é conhecida como uma grande autora do gênero cronista, mas tem uma vasta produção do mesmo. Clarice sabia o que tinha vindo fazer ao mundo, prova disso é sua frase:

Nasci para amar os outros, nasci para escrever, e nasci para criar meus filhos. O ‘amar os outros’ é tão vasto que inclui até perdão para mim mesma, com o que sobra.

Dentre os seus livros, estão alguns títulos, como:

  • Para não esquecer

O livro reúne 108 crônicas que mais parecem um diário. Ora a autora conta uma pequena história, ora ela simplesmente parece pensar alto.Não há ligação entre as crônicas; são anotações para não serem esquecidas.

Os homens têm lábios vermelhos e se reproduzem. As mulheres se deformam amamentando.

  • Correspondências

O livro cobre quatro décadas da vida de Clarice Lispector, de 1940 até pouco antes de sua morte. Traz à tona os enfrentamentos cotidianos da autora, expostos em 129 cartas trocadas com outros escritores, artistas, intelectuais e familiares, sendo 70 cartas de autoria de Clarice e 59 recebidas por ela.

4. João Antônio nasceu em São Paulo no ano de 1937, e lançou seu primeiro livro em 1963, intitulado Malagueta, Perus e Bacanaço. O mesmo foi queimado no incêndio de sua casa em 1963, porém o autor reescreveu-o para que fosse publicado.

João Antonio

Narrando partes de sua vida, principalmente sobre sua infância, esta obra foi vencedora de vários prêmios. Podemos citar como mais importantes os dois prêmios Jabuti, o Prêmio Fábio Prado e o Prêmio Prefeitura Municipal de São Paulo.

Dezesseis anos. O ginásio acabado. A boa vida acabada. Precisava trabalhar. Gente pobre, é isto. Bom. Olhei a minha perspectiva e vi que minha vida iria se complicar. Que é que eu sabia fazer? Lutar judô, declinar latim com lerdeza, tipar redações, tentar fotografias em dias de sol? Isto e mais algumas coisas que não resolveriam nada.

5. Nascido em setembro, na cidade de Aracaju no ano de 1918, Joel Silveira destacou-se como jornalista e escritor a partir de 1937 quando se mudou para o Rio de Janeiro e cobriu vários acontecimentos históricos de grande relevância para o país, fato este que colaborou para que ele fosse o autor de mais de 40 obras. Infelizmente o escritor e jornalista faleceu em setembro de 2007, mas sempre será lembrado por defender a função de repórter.

Joel Silveira

Se houvesse justiça no mundo, os nomes dos repórteres deveriam vir sempre acima dos nomes dos donos do jornal.

Depois de ler tudo o que apresentamos até aqui, que tal aperfeiçoar aquele seu tweet?

Permita-se e deixe fluir sua imaginação. Faça uso da crônica e da literatura jornalística para se expressar, consumindo conteúdos da indústria criativa como apoio e incentivo para a elaboração de seus textos. Escreva sobre temas de seu interesse, sejam eles humorísticos, trágicos, poéticos… Descubra o seu estilo e nos faça se apaixonar por ele. Colabore com a indústria criativa, ajude a movimentar a economia do seu país, transforme seu hobby em sua profissão.

Escreva, apague tudo e reescreva. Quantas vezes forem necessárias. A prática leva à perfeição.

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