Conto eróptico

Cris Reis
cris reis

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Em algum lugar do tempo, é possível reconhecer quando um macho encontra a sua fêmea. A vida dele escorre na pele dela e a transcende, acende o seu ventre, reacende nela um fôlego mais longo. É esse o viço que a levará mais forte para a sua aldeia. Uma mulher selvagem, orgástica, uma bruxa sob o efeito da união do sagrado feminino com o sagrado masculino.

Aldo viu a face da sua mulher iluminada. Comovido, não parava de olhar e exclamar a beleza que agora podia ver. Ele estava perplexo com a música que ouvia no olhar dela. Carla ainda nua, no sofá da sala, sorria com cada centímetro do seu corpo. Ela sabia exatamente o que estava acontecendo ali naquela cena. Sabia que se tratava de um encontro. Não estou falando de um coito qualquer. A gente sabe quando a entrega ao outro nos amplia. Esse é o encontro da Arte com a vida.

Uma existência afetada pela Arte jamais permanece do mesmo tamanho. A cada encontro vai ganhando outras proporções e parindo ainda mais vida polinizada pelo fazer poético. Aldo fecundou o ser de Carla, ela estava a seus pés. Abrindo os caminhos dele. Seu amor era uma oferenda. Lambeu — lhe as mãos mostrando os poemas que dali nasciam, lambeu — lhe os joelhos oferecendo mais flexibilidade na vida, lambeu — lhe a virilha para lembrá-lo do caminho da devoção. Eis um homem tocado pela força do feminino.

Nesse instante, Carla tinha olhos de verão. Se viu fêmea. O caminho aberto por entre as suas coxas era o próprio infinito. Nunca mais seria a mesma depois daquele arranjo musical. Seu repertório, seu ócio, seu cio cantam agora numa oitava acima. A poesia dele a elevou. Ela conheceu novas escalas, reconheceu a harmonia nos seus acordes, chegou mais perto do próprio eixo.

O tempo lembrou que Aldo precisava seguir sozinho. Eles percorreram juntos uma parte da estrada, mas agora a despedida os abraçava. Carla amou tanto aquele homem que decidiu soltá-lo. Se entregou e libertou o caminho dele. O encontro aconteceu. A metamorfose era irreversível. Aldo e Carla ganharam espaço interno, ampliaram pontos de vista, modificaram seu fazer poético, fizeram uma intervenção social. Não tinha volta. A vida depois desse encontro tinha trilha sonora, poemas, orgasmos e tinha a cultura do cuidado como ação política.

Depois de um encontro assim, a gratidão se torna a única exigência. A única opção é celebrar a fertilidade da vida. Aldo se permitiu ir. Amar assim é deixar que a água do riacho vire oceano. Só se pode amar em liberdade. A gente ama quando o encontro com o outro nos aproxima de quem nós realmente somos. Dá para reconhecer quando se está amando, quando esse amor impede que você se abandone. Carla não se abandonou.

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Cris Reis
cris reis

Ativadora de fluxos, educadora sistêmica, fluxonomista, programadora neurolinguística, life coach, massoterapeuta e aprendiz profissional.