Ideologia de género — do que estamos a falar? (1/3)

Joel Oliveira
Crist’óCentro
Published in
16 min readMay 8, 2019

I. DO QUE ESTAMOS A FALAR?

Em primeiro lugar, esclareçamos os termos. O vocabulário associado à ideologia de género é complexo e pode introduzir níveis muito elevados de ruído, pelo que é importantíssimo sabermos do que estamos a falar quando proferimos cada uma das palavras que usamos ao falar sobre este tema.

a) Esclarecendo os termos

Sexo

No dicionário de psicologia da APA, a Associação de Psicologia Americana, lemos que sexo significa o conjunto de traços fisiológicos que distinguem machos e fêmeas.

No entanto, nas diretrizes da APA para a prática clínica com pessoas transgénero, lemos algo diferente: o sexo é normalmente atribuído no nascimento (ou antes ou durante a ecografia), baseado na aparência da genitália externa.

Parece haver aqui um cuidado em não mencionar a componente biológica ao abordar a população transgénero, e essa impressão fica reforçada na definição seguinte, a de género.

Género

Segundo um artigo da OMS já de 2001, género, no seu sentido mais restrito, significa sexo socialmente construído, seja feminino ou masculino. Foi na década de 1970 que as feministas americanas e inglesas começaram a usar os termos “género” e “relações de género“. Nos anos 90, com a chancela das conferências da ONU, como a Conferência do Cairo (1994) ou a Conferência Mundial sobre as Mulheres, em Pequim (1995), este termo veio definitivamente substituir a utilização da palavra sexo.

Como a autora desse artigo patrocinado pela OMS, Jeanne Bisilliat, Antropóloga, também indica:

O conceito de género implica uma rejeição da distinção biológica subjacente à palavra “sexo” e à expressão “desigualdade sexual”, que aparece como “álibi ideológico para manter a dominação, o álibi da natureza.

Vemos que aqui não há apenas uma visão do sexo como tendo uma dimensão socialmente construída, mas que se rejeita liminarmente a dimensão biológica do sexo e se equipara o seu uso à opressão de um sexo pelo outro.

É importante dizer que nem todas as definições de género são tão radicais como esta, que “implica uma rejeição das distinções biológicas subjacentes à palavra sexo” (a APA, por exemplo, não rejeita abertamente a dimensão biológica, embora a omita convenientemente em ocasiões como a que vimos).

Identidade de género

Socorrendo-nos ainda das diretrizes da APA para a prática clínica com pessoas transgénero, encontramos a seguinte definição de identidade de género:

“O sentimento íntimo de ser homem, mulher, ou um género alternativo (por exemplo, genderqueer, género não-conforme, género neutro [classificações de género que pretendem constituir alternativas ao masculino e feminino]) que podem ou pode não corresponder ao sexo de uma pessoa, atribuído ao nascimento ou primária da pessoa ou características sexuais secundárias.“

Lemos também o seguinte:

“Dado que a identidade de género é interna, a identidade de género de uma pessoa não é necessariamente visível para os outros.”

Fica então patente nesta definição a aparente independência do sentimento íntimo do que se é em termos identitários, relativamente aos traços biológicos. As duas coisas simplesmente não aparecem como estando relacionadas.

Identidade sexual

A identidade sexual é definida pela APA como “auto-perceção em termos de atração sexual/orientação sexual”.

Vemos que o conceito de identidade sexual, foi reduzido à orientação sexual, sendo que a identidade de género substituiu este termo. Mais uma vez, não aparece nesta conceptualização nenhuma ligação da identidade sexual aos traços biológicos, o que está em linha com a ideia atual de que não há um “ideal biológico” de identidade sexual.

É que se o ser humano possuir uma identidade sexual ligada aos traços biológicos, isso implica que uma identidade sexual que contrarie os traços biológicos será um desvio patológico.

A identidade de género é então vista como um sentimento puramente subjetivo.

Igualdade de Género

Segundo um artigo da UNICEF,

Igualdade de género significa que homens e mulheres e meninas e meninos, desfrutam dos mesmos direitos, recursos, oportunidades e proteções. Não exige que meninas e meninos, ou mulheres e homens, sejam iguais, ou que eles sejam tratados de forma exatamente igual.

Apesar deste aviso da UNICEF de que igualdade de género é essencialmente igualdade de recursos, oportunidades e proteções e não implica atribuir tratamento ou natureza igual aos diferentes sexos, não parece ser isso que resulta da evolução que observamos no pensamento sobre as questões de género.

b) Construindo o sexo

Usar o sexo do termo para descrever as diferenças biológicas, e género para descrever as diferenças socialmente construídas — ignora o facto de que distinções biológicas são construções sociais, pelo menos em parte. Que a biologia moderna, por exemplo, interpreta o pénis como um órgão distinto da vagina, é uma construção social, mais uma consequência da mudança culturais metáforas do que de novas provas científicas (Laqueur).

As ideias são do autor e professor de história Thomas Laquer e retiradas de um livro escrito em 1992; a citação é retirada da Enciclopédia de Bioética da publicadora McMillan Reference USA.

Existe então um pensamento ideológico que avança este tipo de ideias de que até os próprios órgãos sexuais são (no mínimo em parte) socialmente construídos, e que tem claramente encontrado eco em várias esferas da sociedade.

Estas ideias começam na academia, e depois são transportadas pelos media para o mainstream cultural. Indya Moore, uma “mulher” transgénero que é na realidade biologicamente um homem (ator na série Pose do canal SyFy), tweetou o seguinte:

Se uma mulher tem um pénis, o seu pénis é biologicamente feminino

Uma página LGBT+ pegou nesse tweet e clarificou o raciocínio:

Mulheres transgénero (homens) são mulheres

Então mulheres transgéneros têm corpos de mulher

Então os pénis de mulheres transgéneros são pénis de mulher

Este tipo de ideias e outras relacionadas, configuram aquilo a que chamamos “ideologia de género”, e são essas ideias que vamos explorar neste texto.

Mas o que é afinal a ideologia de género?

c) Ideologia do género — uma definição

Segundo a Dra Michelle Cretella, presidente do American College of Pediatricians (ACP) — em português, Colégio Americano de Pediatras,

A ideologia de género é um sistema de crenças que afirma que o sexo é uma construção social. A ideologia de género ensina que cada pessoa tem algo chamado “identidade de género” no cérebro, que pode ou não ser o mesmo que o seu sexo biológico. O seu princípio base é que essa “identidade de género” é mais real do que a realidade biológica material do sexo de uma pessoa. — Michelle Cretella, MD, (presidente do American College of Pediatricians — ACP*)

Na definição de género mencionámos a questão da dimensão de construção social do sexo. Mas a ideologia de género diz-nos que os sexos masculino e feminino são uma pura construção social, e que não há diferenças objetivas entre os sexos.

Agora, daquilo que é claramente o outro lado da barricada, publicações progressistas como o The Guardian posicionam-se em frontalmente contra a própria ideia da existência da ideologia de género:

[a ideologia de género] É uma teoria de ativistas religiosos de extrema direita, que a apresentam como um movimento liderado por gays e feministas para derrubar a família tradicional e a ordem natural da sociedade. É uma expressão fabricada para vender uma narrativa falsa e justificar a discriminação contra mulheres e pessoas LGBT.

Será que na realidade a própria existência da ideologia de género é uma teoria da conspiração?

II. A IDEOLOGIA DE GÉNERO EXISTE?

Um vídeo produzido pelo Family Policy Institute of Washington dá-nos um insight surpreendente sobre como universitários nos EUA não conseguem dizer a um homem branco que ele não é uma mulher chinesa, mostrando um total desprezo pela biologia e uma espécie de tolerância bizarra por quaisquer devaneios que alguém possa construir sobre si próprio.

Neste vídeo vemos claramente que há um conjunto de pressupostos filosóficos na mente dos universitários entrevistados relativamente não apenas ao género, mas à forma como a realidade é concebida — neste caso, uma conceção da realidade como construída por cada pessoa, sem que outros tenham o direito de colocar essa construção em questão.

Podemos concluir então que não apenas está instalada esta ideia de que o sexo é socialmente construído, mas que toda a biologia humana é socialmente construída e a sociedade deve organizar-se de forma coerente com essa filosofia.

Estamos perante ideias que não se limitam à realidade dos Estados Unidos, mas que se encontram disseminadas no mundo ocidental. Nomeadamente em Portugal, esta ideologia tem vindo também a encontrar eco na academia.

a) Ideologia de género em Portugal

Estamos prontos para abraçar a ideia de que o género de cada um depende da identidade de género e não de características do corpo, como a genitália? Somos mesmo capazes de reconhecer uma transexual que mantém os genitais masculinos como uma mulher verdadeira? E de reconhecer um transexual grávido como um homem?

Estas perguntas foram colocadas pelo investigador e presidente da ILGA Nuno Pinto, numa entrevista ao Público depois da aprovação da sua tese de doutoramento no ISCTE sobre a experiência e representação de transexualidade.

Este é então o objetivo assumido dos ativistas da ideologia de género: que os genitais e a biologia signifiquem zero na perceção que temos daquilo que é um homem e uma mulher.

E em termos legais, estamos muito bem encaminhados para que de facto seja assim. Aliás, um dos estudos da tese de doutoramento de Nuno Pinto era sobre as representações sociais que vieram à tona durante o debate público da lei da identidade de género, aprovada em 2011.

No dito estudo, o autor avalia o que saiu da comunicação social no período da discussão da lei e conclui que tinha havido “mais ênfase ao corpo (à genitália) do que à identidade de género”, o que segundo o autor “pode ajudar a perpetuar a ideia de que um transexual não é mesmo um homem e uma transexual não é mesmo uma mulher.”

Vemos aqui claramente a biologia a ser retratada como inimiga desta ideologia.

Mas qual é então a lei em Portugal relativamente à chamada auto-determinação de género?

b) Ideologia de género em Portugal: a dimensão legal

Em 2011, o estado passou a reconhecer o direito à chamada auto-determinação de género, dispensando a esterilização forçada, a “mudança de sexo”, qualquer tratamento hormonal ou prova de que as pessoas vivem segundo as convenções sociais — como acontece noutros países.

Em Portugal apenas é exigido um requerimento e um relatório médico assinado por dois profissionais para que a pessoa possa mudar de género nos seus documentos de identificação.

Em 2018, passa outra lei em que uma das mudanças anunciadas foi a diminuição de 18 para 16 anos como idade a partir da qual será possível mudar de género nos documentos de identificação, desde que com autorização dos pais — algo que o Bloco de Esquerda tentou que não fosse impedimento.

Outro dos pontos negativos desta lei, segundo a agenda progressista dos ativistas de género, é que, ignorando um parecer prévio do Conselho Nacional de Ética e Ciências da Vida, (CNECV) não cria um género neutro.

Sim, um conselho de ética e ciências da vida emitiu um parecer para que fosse criado um género neutro nos documentos de identificação (como aliás Nova Zelândia, a Austrália e a Índia já prevêem).

Esta “diversificação de géneros” é aliás uma das novidades que a ideologia de género nos traz. Porque o género é uma construção social pura, podem haver não um, não dois, mas os géneros que se quiser construir. O limite é a imaginação.

Imagem: gender graphics

E apoiados pelas leis que validam esta ideologia, os ativistas da ideologia de género estão livres e motivados para promover estas ideias na sociedade, a começar pelas escolas.

c) Ideologia de género: numa escola perto de si

A pretexto da igualdade de género, empurra-se também esta ideologia que vê o sexo como construção social e, por inerência, o género como algo que se pode escolher livremente.

Apesar de não apresentar a ideologia de género na sua forma mais radical, o Guião de educação Género e Cidadania Pré-escolar de 2015, que dá diretrizes para o ensino pré-escolar relativamente às questões de género, reflete claramente também esta filosofia. Neste manual lemos o seguinte:

O silêncio em torno das “novas” identidades sexuais e de género constitui-se numa forma de representá-las, na medida em que as marginaliza e as deslegitima. O silêncio e o segredo significam uma tomada de posição ao lado de quem já detém a autoridade e a legitimidade.(…) a omissão sempre favorece a dominante. — Guacira Louro, 2000, cit. in Guião de educação Género e Cidadania Pré-escolar (pp.52,53)

Reparemos na ideia de “novas” identidades sexuais e de género e também na ideia de que não as apresentar é marginalizá-las e favorecer a opressão das minorias.

A ideia que vemos a ser transmitida sub-repticiamente é que é perfeitamente normal não querer encarnar o género que foi “atribuído” no nascimento; o problema, segundo a ideologia de género, é a sociedade querer impor um género à criança só porque esta nasceu com os genitais normalmente associados a esse género.

d) Uma revolução de género

Estas ideias estão em plena circulação no mainstream cultural, como deixa bem evidente o destaque que a revista National Geographic (NM) dá a Avery Jackson, um menino que vive como se fosse uma menina.

Capa NGM edição especial Janeiro 2017

A editora chefe da revista, Susan Goldberg, diz o seguinte no artigo que escreveu para explicar aos leitores porque é que a NM decidiu colocar Avery na capa da sua edição especial:

Hoje, não apenas falamos sobre papéis de género para meninos e meninas — estamos a falar da evolução do nosso entendimento das pessoas no espectro do género.

Por outras palavras, o género não reflete um sexo feminino ou masculino; o género é um espectro que vai até onde a construção social quiser. É exatamente essa ideologia que está a ser promovida em Portugal, embora não ainda com os mesmos efeitos práticos visíveis.

O mais alarmante é que nos EUA e no Reino Unido, parece estar a haver um efeito de contágio entre adolescentes: em alguns casos, grupos de adolescentes que nunca tinham manifestado qualquer desconforto com o seu corpo, estão a “assumir-se” como transgéneros praticamente em bloco, tendo sido cunhada pela investigadora que denunciou esta situação, Lisa Littman, uma nova expressão para designar este fenómeno: “disforia de género de início rápido”.

Este fenómeno fica bem ilustrado por este dado, que está a ser investigado pelo governo do Reino Unido: o número de raparigas adolescentes a procurar tratamento para mudança de género aumentou 4500%!

Importante é também dar atenção àqueles que se arrependem da mudança, como as pessoas que dão a cara neste documentário, as quais, tendo feito todos os procedimentos possíveis para mudar de aparência para o sexo oposto, relatam o sofrimento que nunca deixaram de sentir.

Walt Heyer, ex transgénero e agora ativista contra a ideologia de género, que ajuda pessoas que se arrependem das mudanças de género, diz o seguinte:

Inicialmente eu estava entusiasmado com o novo começo. Mas as hormonas e as cirurgias genitais de mudança de sexo não conseguiram resolver os problemas que estavam na raíz da minha disforia de género.

Este é um quadro comum a muitas pessoas que enveredam pela cirurgia de reatribuição de sexo: um estudo levado a cabo na Suécia que acompanhou durante 30 anos 324 pessoas transgénero em processo de transição, revela que as taxas de suicídio se mantinham num nível 20 vezes superior ao da população geral.

Nesta área da saúde transgénero, e como consequência da ideologia de género, alteram-se as formas de abordar clinicamente o fenómeno de pessoas ditas transgénero.

e) Ideologia de género: diagnóstico

Outrora, o rótulo diagnóstico do conjunto de sintomas das pessoas transgénero, seria a chamada Perturbação da Identidade de Género. Contudo, desde 2013 que esta condição deixou de ser classificada como uma doença mental pela Associação de Psiquiatria Americana, que muda a classificação no DSM 5, o seu Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais.

A perturbação passou a ser denominada “disforia de género”, expressão que retira o problema da condição de confusão inerente à patologia ao nível da identidade, e coloca o problema apenas na forma como a pessoa gere essa condição (a disforia), deixando a condição de ter carga psicopatológica intrínseca.

Em 2017, e com o objetivo de retirar toda e qualquer associação desta condição a uma psicopatologia, a Dinamarca torna-se o primeiro país a eliminar esta condição de qualquer categoria diagnóstica, rejeitando a ideia de que há uma condição psicológica disfuncional associada a indivíduos transgéneros.

Caminhamos assim a passos largos para a visão de que não há de facto qualquer problema com pessoas que se sentem “aprisionadas” em corpos do sexo oposto ao que sentem que são, isto apesar destas pessoas registarem índices elevadíssimos de depressão (50% das pessoas transgénero, um número oito vezes superior à média da população geral), ansiedade (50% das pessoas transgénero, um número quatro vezes superior à média da população geral), suicídio (40% das pessoas transgénero, um número nove vezes superior à média da população geral), e várias outras patologias como o abuso de drogas (num estudo em adolescentes, verifica-se que o consumo de drogas entre pessoas transgénero é 2 a 3 vezes superior à média da população geral).

A explicação popularmente assumida para estes índices é uma só: discriminação e estigmatização social; nada que tenha a ver com o facto de, como estas pessoas referem, se sentirem aprisionadas num corpo que não é o delas — aparentemente isso não produz qualquer disfunção psicológica intrínseca. Se a sociedade aceitar, tudo estará bem.

Como resultado desta ideia de que não há qualquer problema com o transgenerismo a não ser a estigmatização social, há relatos de famílias a cujas crianças e adolescentes é vedado o investimento em psicoterapia, sendo ao invés dirigidas para serviços de terapias hormonais e cirurgia de “mudança de sexo”, o que pode ter consequências desastrosas para a saúde dos adolescentes e o seu futuro.

f) Ideologia de (trans)género: tratamento

No que toca ao processo clínico , e visto que a partir da pré adolescência começam os tratamentos para “reatribuição de género”, vemos um cenário bastante preocupante a desenrolar-se, principalmente devido à escassez de evidências sobre o impacto dos tratamentos.

Resumidamente, há três passos no tratamento da disforia de género, cada um envolvendo riscos e efeitos negativos, bem como podendo também contribuir para o alívio do sofrimento (pelo menos imediato) dos pacientes.

Bloqueadores de puberdade

O primeiro passo é o tratamento com os chamados bloqueadores de puberdade (Agonistas da hormona Libertadora de Gonadotropina — ALG), que adiam a puberdade, “dando tempo” ao (pré) adolescente e à sua família para perceber se o caminho é avançar para a “transição” (nesta fase normalmente há uma exploração prática de como é viver socialmente como membro do sexo que o adolescente supostamente sente que é o seu).

Neste ponto, havendo arrependimento, e segundo dizem os profissionais favoráveis a estes medicamentos, as mudanças podem ser reversíveis, e a puberdade retomará o curso normal se o tratamento for suspenso. No entanto, não há estudos de longo prazo que mostrem que isto é verdade, havendo, pelo contrário, várias evidências que apontam para uma forte possibilidade de poder haver áreas do desenvolvimento que ficam para sempre comprometidas.

Alguns exemplos são a densidade óssea que pode nunca recuperar, processos do desenvolvimento cognitivo que nunca são completados, e uma quase inevitável progressão para tratamentos hormonais com hormonas do sexo oposto, com consequências, essas sim, definitivamente irreversíveis.

Tratamentos hormonais

O segundo passo é o tratamento com hormonas do sexo pretendido, que leva inevitavelmente à infertilidade e a muitos outros problemas ao nível do desenvolvimento sexual e reprodutivo.

Os estrogénios que são administrados aos rapazes podem provocar problemas de saúde como trombose venosa profunda (TVP), embolia pulmonar ou alteração da função hepática. As raparigas, a quem é administrada testosterona, provoca hiper produção de glóbulos vermelhos, e aumenta o risco de AVC — tudo isto a acumular com os efeitos dos bloqueadores de puberdade.

No entanto, no que diz respeito a estes dois tipos de tratamentos, é fundamental dizer e repetir: não há estudos de longo prazo do impacto destas drogas em crianças e adolescentes para se poder com segurança prescrever estes fármacos. Pelo contrário, há fortes indícios de que estes medicamentos têm inúmeros riscos e efeitos nocivos.

Cirurgia

As cirurgias são o último passo no “tratamento” da disforia de género, e consistem em eliminar os carateres sexuais do sexo biológico e tentar construir uma aparência dos carateres sexuais do sexo pretendido. Como vimos com o caso de Walt Heyer, mesmo quando completos todos os passos e consumada a cirurgia, muitos dos problemas mantêm-se.

Apesar disso, a investigadora encarregada de um estudo financiado pelo governo dos EUA sobre tratamento de adolescentes transgénero, Dra. Johanna Olson, advoga este tipo de cirurgias em adolescentes, com pouca ou nenhuma avaliação psicológica prévia.

E nesse mesmo estudo que está a conduzir, comunicou à autoridade financiadora que tinha sido baixada a idade mínima para os sujeitos poderem receber hormonas do sexo oposto de 13 para 8 anos de idade.

Nesse estudo, crianças de 8 anos de idade podem então começar a ser medicadas com este tipo de drogas cujos efeitos no seu desenvolvimento são quase totalmente desconhecidos (o primeiro estudo longitudinal que acompanha um número significativo de pessoas (2600) que estão em tratamento com hormonas do sexo oposto ao longo do processo, começou em 2010 na Europa, e ainda está a decorrer — e será necessário muito mais tempo para se perceberem os efeitos a longo prazo).

Desistir da transição

Já vimos que muitas pessoas que avançam para cirurgias se arrependem. Mas e quanto aos adolescentes que iniciam os tratamentos? Que percentagem deles desistem da “mudança de sexo”? Dois estudos analisados neste artigo da publicação The Cut, um levado a cabo na Holanda e outro no Canadá, mostram, respetivamente, que dois terços e 88% das pessoas (no caso do Candá o estudo foi feito só em rapazes), passaram a assumir o seu sexo biológico depois de alguns anos.

Uma percentagem muito alta, que deve inspirar muito cuidado nas decisões políticas, legais, e médicas que rodeiam estas questões.

Neste ponto impõe-se uma chamada de atenção importante: estes estudos, como praticamente todos os que estão a ser citados, são objeto de controvérsia, muitas vezes usados como bandeiras por um dos lados da guerra ideológica, e demonizados pelo outro lado, e vice versa — e muito raramente examinados com imparcialidade.

E quanto ao que pode estar na origem destes problemas? É possível saber o que provoca as perturbações na identidade de género e a disforia de género?

Causas

Não são conhecidas as causas concretas do que pode estar na origem do quadro psicopatológico da disforia de género. No entanto, e como em todas as psicopatologias, parecem estar envolvidos uma multiplicidade de fatores que muitas vezes se combinam.

Anomalias hormonais no ambiente intra-uterino causadas por várias possíveis condições médicas, história de abuso sexual na infância, ou vulnerabilidade resultante de dificuldades no desenvolvimento e/ou bullying na infância podem estar na origem de alterações ao nível da identidade de género.

Apesar destes referidos factores sociais e de abuso não serem populares enquanto explicação, há testemunhos sobre o impacto destes factores, e também investigação nesta área no âmbito da psiquiatria que encara com seriedade esta questão.

Quanto a possíveis causas genéticas, os estudos até à data não encontram qualquer fator genético na génese da disforia de género.

Até aqui esclarecemos os termos, pintámos o retrato da situação atual das questões de género, e estabelecemos sem sombra de dúvida que a ideologia de género existe.

Mas o que podemos dizer relativamente ao seu caráter científico?

Se os governos passam leis que refletem esta ideologia, se as associações de profissionais de saúde alteram as suas categorias, se os médicos dirigem pré-adolescentes para tratamentos hormonais que determinam o seu futuro, deve haver um apoio decisivo de evidências científicas indiscutíveis.

De facto seria isso o esperado. No entanto, a realidade simplesmente não é essa. Exploraremos as evidências científicas no próximo artigo desta série.

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