O aborto e o infanticídio

Joel Oliveira
Crist’óCentro
5 min readFeb 27, 2019

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Nos EUA já há muito tempo que se abortam crianças, e em vários estados, até 3 meses antes do nascimento. O normal é permitir-se o aborto até entre 5 e 6 meses, ou até ao ponto de viabilidade fora do útero — ver aqui como é uma criança aos 6 meses de gestação, período em que a atividade cerebral é praticamente igual a um recém nascido, com o mesmo nível de pensamento consciente.

No entanto, e apesar da lei oficial, em 12 estados, na prática, por causa das exceções por “perigo para a saúde da mãe” — e sendo “saúde” um termo que pode facilmente ser esticado para significar saúde psicológica — já se abortam crianças até ao nascimento.

Recentemente, em Nova Iorque, chegou-se ao ponto de permitir abertamente, e sem quaisquer restrições, o aborto de crianças até ao momento do nascimento. Outros estados já manifestaram vontade de seguir o exemplo.

Surge assim um problema: o que fazer com as crianças que, resistindo aos métodos para lhes terminar a vida (que incluem esmagamento, envenenamento e indução de ataque cardíaco), insistem em sobreviver e em cometer o “erro” de nascer vivas? Deveria ser simples de decidir sobre uma criança que está separada da mãe e que está viva <VIVA>

Mas não é simples, porque quando se atravessam certas linhas, não há retorno, e tudo se torna turvo e nebuloso. E quando se atravessa a linha de se permitir matar legalmente um ser humano, não há retorno possível. Este facto foi verificado repetidamente durante a história, desde o regime nazi até às ditaduras comunistas: institucionalizar o homicídio de alguns é tornar permissível o genocídio de todos.

E nos EUA já se contam mais de 50 milhões de seres humanos assassinados no ventre das mães (há nove países com taxas ainda superiores). Segue-se o próximo passo lógico, o infanticídio fora do ventre, promovido e patrocinado pelo governo.

Claro que para muitos não se tratam de homicídios reais. As táticas de desumanização das vítimas, usadas também repetidamente durante a história, funcionam também aqui. A propaganda mais uma vez conseguiu com sucesso fazer as massas acreditarem que um bebé com 6 meses de gestação não é um humano.

Bebé prematuro de 6 meses/24 semanas (fonte: Daily Mail)

Bebés com 6 meses de gestação são humanos. Mas foi por estes dias nos EUA, submetida a votação, uma lei que visava proteger os seres humanos nascidos vivos <VIVOS> fruto de abortos falhados. A lei não passou.

Não importa o número reduzido de vezes que isto acontece. Se acontecer uma vez, é um ser humano vivo que nasceu vivo <VIVO> (ver aqui um testemunho profundamente tocante de alguém que sobreviveu a este horror). É de dar voltas ao estômago que isto tenha sequer de ser discutido, mas está para além das palavras qualificar o facto de que tal lei tenha chumbado. Haverá razões para isto ter acontecido, mas nunca será compreensível.

A história mostra-nos atrocidades terríveis, mas nunca uma atrocidade desta natureza, contra a humanidade, foi cometida nesta escala. Estamos a falar do assassínio clínico de milhões de bebés humanos. Batemos no fundo enquanto civilização. Tudo o que puder vir depois disto será menos chocante.

Para muitos de nós, incluindo cristãos, é já algo corriqueiro. Incompreensível é também este facto. Estamos moralmente cegos quando convivemos bem com o infanticídio, e esta cegueira é também um fenómeno que diz muito do estado moral da igreja.

Falando por mim, oro ao meu Deus para que isto sempre me faça revolver as entranhas. Não consigo imaginar a dor que sentem aqueles que, tendo consciência do que está a acontecer, vivem naquele país. Como compreendo tantos norte americanos que votaram Trump. Vou dizer isto com toda a clareza: eu próprio votaria Trump, se a escolha fosse obrigatoriamente entre este homem, e alguém que defende o assassínio de crianças dentro do ventre — e fora do ventre, quando nascem vivas <VIVAS>.

Isto porque nenhum valor, nenhuma causa, nenhuma agenda, se pode sobrepor a esta atrocidade. É como ter de escolher entre Hitler e qualquer adversário que não tivesse a agenda de exterminar milhões de judeus na Alemanha nazi — mesmo se esse adversário fosse o maior idiota do mundo, o maior inepto do mundo, o político mais incapaz do mundo. Como se diz nos EUA, é um no brainer, algo que nem sequer se hesita para decidir.

Incompreensível também é comparar o aborto de bebés humanos com qualquer outro mal social, como a pobreza. É como comparar o holocausto nazi com a pobreza na Alemanha nazi. Ambos eram males sociais, apenas que um era infinitamente menor do que o outro.

Como são incompreensíveis outras estratégias retóricas, como apontar a incoerência de alguém que defende a pena de morte para pessoas condenadas de crimes excepcionalmente violentos e que simultaneamente se insurge contra o aborto de crianças que ainda não tiveram sequer a oportunidade de viver fora do útero das suas mães. Uma comparação no mínimo infeliz.

Poderia listar aqui vários outros argumentos a favor da legalização do aborto que são simplesmente desonestos, como os casos muitas vezes apontados para justificar tornar o aborto legal, como gravidez fruto de violação ou incesto, e malformação do bebé. Este argumento é desonesto porque estes casos representam uma ínfima percentagem de abortos, e se fosse essa a única preocupação, tornar-se-iam legais apenas esses casos.

Mas não é essa a real preocupação; esse argumento é apenas um passo retórico na agenda para a liberalização total, como vemos a acontecer nos EUA. E como diz Peter Kreeft, não há um único argumento a favor do aborto que não justifique também o infanticídio. Exceção feita a situações em que se coloca uma escolha entre a vida da mãe e a vida do bebé — mais uma situação raríssima em que uma das vidas terá necessariamente que terminar.

Haveria muito mais a dizer, mas este artigo é muito mais uma lamentação do que um dissecar de estatísticas e argumentos. No fundo, toda a gente sabe o que está a acontecer, a começar pelos próprios médicos que fazem abortos. Todos sabemos, só não nos importamos o suficiente com isso.

Os cristãos dos primeiros séculos, vendo e vivendo na pele as atrocidades de Roma, ecoavam uma oração simples em aramaico: Maranata , isto é, “ora vem, Jesus Cristo”. Hoje eu oro o mesmo. Para que Jesus venha novamente, como temos prometido na Bíblia, e acabe depressa com isto, e faça alguma coisa nova. Sem dor <de recém nascidos VIVOS>, sem lágrimas <de recém nascidos VIVOS>, sem sofrimento <de recém nascidos VIVOS>. Nunca esquecendo a dor, lágrimas, e sofrimento silenciosos de bebés cujas vidas são ceifadas ainda no ventre das suas mães.

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