O Deus submisso: Olhando para O Eterno de uma perspectiva subjetiva

Bruno Mendes
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10 min readApr 24, 2021

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// Um Deus submisso aos nossos desejos…

Ao cair da tarde, o jovem Daniel se despediu de seus pais e saiu para encontrar e se divertir com alguns amigos. Mas no percurso, por causa da falta de iluminação do seu bairro, no meio do caminho ele tropeçou em uma pedra e caiu em um buraco que a chuva da noite retrasada havia feito. Ainda que durante a queda ele tenha ralado um pouco os seus braços e pernas, não quebrou nada. Ainda assim, estava tudo bem — Em certa medida.

A princípio, pode parecer que a situação em que Daniel se encontra não é das melhores, para muitos, está longe disso, mas se mostra um momento perfeito para lamentação, murmuração, reclamação, indagação, enfim, uma sequência incansável de “ação”. No entanto, há quem perceba essa situação com bons olhos.

Por isso, a partir de agora, podemos começar a traçar um perfil existencial de dois opostos: Onde o primeiro, tem um olhar subjetivo e limitado, onde se vê apenas de uma perspectiva.

O segundo, faz um caminho oposto, ele à vista a situação com um olhar de que todas as coisas de alguma forma — que ele ainda pode não entender no momento — está contribuindo para o seu bem.

Sendo assim, é nesse momento que um primeiro questionamento é posto diante de nós.

O que acontece quando olhamos para Deus da nossa perspectiva subjetiva, e não, de uma perspectiva bíblica?

Perspectiva ou ponto de vista, se trata da forma que observamos ou analisamos determinado objeto, é a maneira em que olhamos para uma situação. Por exemplo: Um garoto que vê um ônibus de frente tem um ponto de visão completamente diferente de outro garoto que vê esse mesmo ônibus, porém, da parte de trás dele. Ou seja, quando situações são colocadas diante de nós, a forma em que as olharemos dirá muito sobre quem somos.

Perceber a situação em que o nosso psêudo-protagonista se encontra, nos leva a segunda indagação, de qual ponto de vista você observa essa situação? Alegre por ter apenas ralado algumas partes do corpo? Feliz, por estar vivo? Contente porque entende que a situação poderia ser pior? Reclamar? Se revoltar? Por Deus na famosa “parede”?

Antropologismo no olhar: Percebendo as coisas ao redor com o ponto de vista para si

Quando permanecemos na trilha de um olhar antropocêntrico, indagamos com muita certeza que isso não deveria ter acontecido — Nós merecemos apenas todas as sortes de bem! — Ou apenas lançamos o questionamento de qual seria o motivo de isso estar acontecendo, as indagações são muitas! Dessa maneira, pode-se dizer que certos acontecidos são nebulosos e não percebemos nada além do nosso nariz, no entanto, quando permanecemos nesse caminho onde acreditamos que Deus deve cumprir com todas as nossas vontades, estamos bem enganados.

Cremos erroneamente que Ele precisa respeitar aquilo que nós queremos ou não. Ele precisa entender e respeitar o nosso tempo de fazer algumas coisas, abandonar outras, ir para lugares, voltar deles, enfim, é ser compreensivo conosco e não apenas pensar nele mesmo — Isso significa que Ele precisa imediatamente, entender que isso são ingredientes que nos fazem ser pessoas mimadas.

Somos mimados? Sim. E imediatistas também.

Não é à toa, que a geração atual está na categoria da mais ansiosa e frustrada de todos os tempos, e qual seria o motivo disso? Qual a raiz desse mal? Bem, toda essa ansiedade e imediatismo, é claro! Pessoas que não conseguem esperar o tempo necessário para que os frutos cresçam, mas desejam plantar há dois dias e que em três o que foi plantado esteja dando frutos e mais frutos em abundância e não sabe lidar com o ”Não” como resposta, caso contrário fecha a cara, faz birra, fica triste. Uma geração amargurada, afobada e muitas vezes sem perspectiva, apenas por querer confiar na força de seu próprio braço — que é falho, fraco e sem força.

Mas agora, vamos para um exercício!

Olhe para as escrituras e veja o Rei Davi, por exemplo (Contextualizando e parafraseando):

Que por ser rei de Israel e participar de muitas guerras, seria natural que começasse a ter diversos inimigos no percurso de sua vida, e mesmo quando eles se ajuntavam e tramavam a morte do Rei, e se dedicara em ir em busca dele para mata-lo, O rei Davi percebia que seus adversários continuavam a se multiplicar demasiadamente dia após outro — Eis o grande ponto chave! — Ainda assim, mesmo diante de todo essa narrativa que o desfavorecia, consegui ele deitar-se em paz.

Ó Senhor, tenho tantos inimigos; tanta gente é contra mim!
São muitos os que dizem: “Deus nunca o livrará!”. Interlúdio
Mas tu, Senhor, és um escudo ao meu redor; és minha glória e manténs minha cabeça erguida.
Clamei ao Senhor, e ele me respondeu de seu santo monte. Interlúdio
Deitei-me e dormi; acordei em segurança, pois o Senhor me guardava.
Não tenho medo de dez mil inimigos que me cercam de todos os lados.
Levanta-te, Senhor! Salva-me, Deus meu! Acerta meus inimigos no queixo e quebra os dentes dos perversos.
De ti, Senhor, vem o livramento; abençoa o teu povo! Interlúdio

(
Salmos 3:1–8)

O Grande Rei Davi, parecia estar em apuros, diante de uma situação que perturbaria o sono de muitos outros reis, de muitas outras pessoas, uma problemática como essa, roubaria a sua paz? A sua noite de sono seria perturbadora? Cheia de preocupação? Com muitos “e se”?

Intensas reclamações por causa da rota de acontecimentos que não nos agrada nenhum pouco, pode nos conduzir em ótimas reflexões, e auxilio ao vislumbrarmos as atitudes de grandes personagens da bíblia que tiveram uma atitude muito diferente desse que talvez você esteja tendo, das que temos cultivado durante um bom tempo. Davi sabia muito bem quem era aquele que o guardava. Aquele que conduz todas as coisas e tem todo o domínio sobre tudo.

O Rei confia no poder de Deus. Ele tem plena compreensão acerca daquele em quem ele tem crido, por meio da sua atitude em descansar em Deus. Nesse sentido, ele demostra uma crença bem diferente da atual geração que confia em qualquer coisa, menos no Criador, e por isso, não encontram paz, descanso, alegria e não conseguem dormir em paz a exemplo do Rei. As aflições roubam o sono, esperança, paz, alegria, perspectiva de melhora, e tudo isso leva a uma pergunta essencial: Em quem temos crido? Você consegue replicar a frase do Apóstolo Paulo? “Eu sei em quem tenho crido” E por isso, você pode descansar? Tem paz? Alegria? Confiança? Porque a sua esperança está naquele que tudo governa?

“(…) Deus, o Senhor, criou os céus e os estendeu; criou a terra e tudo que nela há. Dá fôlego a cada um e vida a todos que caminham sobre a terra” (Isaías 42:5)

Dessa forma, esse percurso significa que estamos em uma trilha que as muitas névoas não permitem que vejamos nada além do nosso próprio nariz, e são essas mesmas névoas que nos manterá cegos até a chegada do precipício. Ao menos que percebendo a constante e decadente situação em que se encontra, você se arrependa de seus caminhos, e então, a luz que lança para longe tudo que impede a clara visão, a luz que espanta as trevas, a luz dos homens, Cristo Jesus, ilumine as vossas mentes, compreensão, o seu coração, e assim, você não tenha um trágico fim.

O Deus submisso que construímos em nossas mentes para suprir nossos anseios

Quando vemos Deus a luz da nossa própria perspectiva e não da perspectiva bíblica, construímos um Deus imperfeito, inconsistente, fraco e que deve ser questionando constantemente. Ou seja, quando isso acontece, questionamos todas as sequências de fatos que ocorre ao nosso redor, ficamos nos perguntando por que isso aconteceu, quando deveria ter acontecido outra coisa que seria bem melhor para nós.

Questionamos por que as coisas demoram, afinal, queremos agora e não para depois. Somos imediatistas e por isso não podemos esperar tanto. Questionamos por que as vezes sofremos, pois, se somos todos filhos de Deus, devemos levar uma vida de reis e rainhas aqui nessa terra.

Questionamos isso, aquilo e aquilo outro, e assim, devido ao fato de ver a Deus da nossa perspectiva subjetiva, intensificamos dia após outro, indagações infundadas ao Deus do céu. Questionamos e ainda pensamos estar certos agindo dessa maneira, e quem nunca agiu dessa forma em algum momento da vida? — Contudo, existe uma classe que insiste em permanecer nesse caminho, e de forma persistente, acaba levando muitas outras pessoas a pensarem assim também.

Questionamos e pensamos que nós somos os criadores e Deus, um mero fantoche nosso, ainda sendo Ele, infinitamente maior que você e eu, infinitamente poderoso, infinitamente grande, santo, e detentor de atributos que fariam essa lista se estender durante horas e horas. Ainda assim, temos o atrevimento de agir sem reverência, colocar em estado de submissão, em condição de servo, o Grande e temível, Deus. Ele deve cumprir com os anseios alheios e tudo mais quanto desejarmos.

O Deus submisso que faz todas as nossas vontades é fraco e frágil e claro, não existe, ou melhor — Eis um oximoro! — Existe, mas apenas na cabeça da pessoa mimada. Criar um Deus que agrade ao próprio paladar tem sido algo muito comum nos últimos tempos.

E isso é tão verídico, que basta olharmos ao redor e ver os mais diversos modelos de Jesus que existe, um Jesus sob medida, que é apenas um grande mestre moralista ou um mero líder religioso, isto é, as pessoas querem apenas um líder religioso, e não um Rei, que diga a elas o que fazer e deixar de fazer, por isso criam os mais diversos Jesus:

1-) O Jesus Pop star: Aquele famosinho entre a massa por causa de suas frases motivacionais (por causa dos pretextos que garimpam das escrituras). O “cara” que para agradar a todos, precisa abrir mão de suas ideias arcaicas, desatualizadas e incoerente.

2-) Outros gostam de seguir o Jesus político e ativista: Sempre aderindo as pautas progressistas, inovadoras, e de forma sucinta está sempre apoiando a justiça, mesmo com destruição de comércios, agressões, pautas ideológicas, enfim, o amor é tudo, o amor vence todas as coisas — Mas o grande problema é que esse amor do qual eles tanto discursam, não é o verdadeiro amor.

3-) Jesus paz e amor (Peace and Love) (Love wins): Esse é o Jesus que a galera mais ama. O amor é tudo, é o Jesus liberal que basta ter amor envolvido que está tudo bem. Se tem amor e você está feliz, “vai pra cima”! Não fica se importando tanto assim com o que as pessoas estão falando, pouco importa! O que é importante é a sua felicidade.

Ainda existe muitos outros tipos de Jesus que é moldado para caber dentro do nosso quadrado, de nossas vontades, das nossas perspectivas. Um Jesus que se interessa apenas por parte de nossas vidas. Mas a verdade, é que todos desejam que esse Deus, entenda os limites para executar coisas em nossas vidas, ou seja, não queremos um Rei, alguém que governe a nossa vida por completo, afinal, queremos sempre estar prestando dois tipos de serviços: Aqueles destinados as nossas próprias vontades, e o que sobrar, direcionamos para Deus.

“Temos a tendência de nos esquecer de que Deus está interessado pelos homens em sua totalidade e pelo conjunto da vida humana em todas as suas cores e toda a sua complexidade” (STOTT, 2014, P,50).

Essa célebre frase está em um dos livros mais incríveis que tive a oportunidade de ler, de um grande homem de Deus chamado, John Stott. É um belo tratado sobre “Os Cristãos e os desafios contemporâneos. ” Que aliás, amarra um pouco mais a reflexão que estamos tendo nesse ensaio acerca de como tem se tornado grande o número de pessoas que tem essa tendência de pensar que o Deus trino não está interessado na vida de todos os homens como um todo, além de ser um ser submisso e altamente moldável. Aliás, basta lembrarmos do que o apóstolo Paulo diz:

Portanto, irmãos, rogo-lhes pelas misericórdias de Deus que se ofereçam em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus; este é o culto racional de vocês. (Romanos 12:1)

Dessa maneira, se a nossa vida é um culto a Deus, não existe parte alguma que deve ficar de fora dessa liturgia. Portanto, em totalidade, o conjunto da vida humana e todas as suas cores e complexidade faz parte do governo de Deus também.

Sentar em um banco no fim de tarde e refletir acerca de questões tão importantes como essas devem ser constantes e tomar parte de nosso dia e vida. E dessa forma, dia após outro, conseguir compreender como deve ser em sua totalidade uma liturgia oferecida a Deus com reverência e temor, que só pode ser colocada em prática quando olhamos para Deus de uma perspectiva bíblica e não subjetiva.

Que fim deu, Daniel?

Daniel saiu de onde havia caído, no entanto, o grande ensinamento e reflexão, posto aqui, está em como ele, você, nós, percebemos esse ocorrido, se ainda tido essa queda e leves machucados, foi possível tirar um aprendizado de tudo isso.

E sabemos que Deus faz todas as coisas cooperarem para o bem daqueles que o amam e que são chamados de acordo com seu propósito. (Romanos 8:28)

Se você ama ao Deus da bíblia, o trecho acima será recebido com alegria em seu coração. Mas, se o deus que você ama, é um criado para atender as suas particularidades, bem, examine a si… Hoje ainda é dia de arrependimento.

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Bruno Mendes
Parábolas

Da comunicação teço narrativas que nos levam a pensar não apenas sobre o aqui, mas sobre a eternidade.