A essência do nada ou de ninguém

Rodrigo Prata Orge
CRÔNICAS
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2 min readSep 29, 2017

Acordei às 7:30 da manhã após ter saído pra beber às 17h com uns amigos ontem à noite. Acho que já eram 23h quando cheguei em casa. Estava tremendamente desnorteado e havia me divertido à beça. Não havia notado o tempo passar. Cheguei em casa grogue, leve, e acho que a única coisa que fiz foi me deitar e dormir logo em seguida.

Ontem à noite, no bar, comentei com amigos que eu raramente lembro dos meus sonhos. Hoje de manhã lembrava de algo deles; sonhei com panos de prato fantasmas, reuniões de família e baratas voadoras. Sonhei com a casa que eu morava 7 anos atrás. Tudo tão intrinsecamente estúpido e desconexo que fez eu me perguntar se eu não esquecia meus sonhos justamente por eles serem bobagem.

Ontem à tarde, ao sair para o almoço, eu te vi. Pesava o meu prato na balança quando virei o pescoço e percebi sua presença ali, de algum modo. Vi que seu cabelo estava grande e que você estava mastigando sua comida. Ao te ver, só consegui soltar um grunhido indefinido e rolar meus olhos enquanto voltava à minha posição original. Não o fiz de propósito. Foi espontâneo, acho.

Hoje você já sabe melhor do que tentar falar comigo. Tanto é que você e sua amiga saíram imediatamente após eu ter passado. Eu acho que é melhor assim. Eu não vejo o que teríamos pra falar. E eu não acho que você queira falar, também. Então é bom.

Hoje, ao acordar, eu me lembrei do quão facilmente eu vi o amor voar no momento que ele não mais me fazia parte, e não vi qualquer sentido em tentar me ater aquela memória. Vi que minha memória é diferente do que o meu corpo diz. Vi que os sentimentos são passageiros e eu não consigo ficar preso tempo demais no mesmo lugar.

Hoje, ao acordar, eu me pergunto se algum dia eu já amei ou se já fui amado. Porque tudo parece tão esganiçado. A voz trêmula e memórias nebulosas de passado não parecem pertencer a ninguém. Eu nem falo mais de você ao escrever isso, na real. Eu não falo de ninguém. Eu literalmente não falo de ninguém.

Ontem à noite, talvez umas duas da manhã, eu acordei ainda angustiado só pra tomar o remédio. E hoje, ao acordar, eu me pergunto se é ele que está me deixando nebuloso ou se realmente sou só eu.

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Rodrigo Prata Orge
CRÔNICAS

Baiano, humano e psicólogo. Eu escrevo para viver.