A senhora que vendia turbantes

Victor Hugo Liporage
CRÔNICAS
Published in
3 min readMar 6, 2017
Foto: Cartiê Bressão

— Que lindo!

Anita visitava a Feira de Antiguidades do Lavradio pela primeira vez e ficou apaixonada pelos turbantes.

— Quanto tá cada um?

— É 20.

— Nossa.

Anita foi revirando, à procura da estampa perfeita e, por onde suas mãos passavam, a da senhora ia atrás. A mão de uma revirava; a de outra, arrumava.

— Esse é lindo demais…

— Esse sai muito mesmo, filha.

— Muita gente vem de fora comprar com a senhora?

— De fora nada, quem compra é a Aparecida da roda de Jongo que tem às vezes ali na esquina.

— Jongo?

— É uma dancinha que tem ali, não entendo muito bem, é uma dança, jongo… Eles colocam umas roupas diferentes, botam meus turbantes… Fica lindo.

— Acho que conheço. Estudei num período da faculdade.

Anita conversava e procurava o turbante adequado a ela, mas era díficil achar.

A senhora do turbante puxou assunto.

—Você também dança, filha?

— Só nas festas.

— Não! Jongo.

— Ah! Jongo, não. Tenho medo de me machucar… Olha que estampa linda!

— Essa aí é viscose… Mais cara — e depois completou — mas oxe! Não machuca, não. Só roda pra lá e pra cá.

Anita deu uma pausa na procura e olhou pra senhora.

—Mas não é luta?

— Ih, filha! Fez confusão. Deve tá falando é da capoeira!

— Sim, capoeira. Quando eu ia pra casa da minha vó ela tava vendo essa novela. Aquela das seis, a senhora lembra?

— Linda…

— É, com o Lázaro Ramos. Ele dançava, lutava…

— Não, mas capoeira é diferente.

Anita voltou a sua procura.

— Aqui, filha — a senhora separou um turbante, sorridente — minha neta usa muito desse aqui na escola. Fica lindo também.

— Nossa, ela tem bom gosto.

Anita pegou o turbante, olhou de cabo a rabo e decidiu vestir.

— Difícil, né?

— Deixa eu ajudar você, filha.

Anita não sabia vestir turbante. Enquanto a senhora a arrumava, conversavam…

— Você me lembra muito a minha neta…

— É?

— Quando ela veio aqui na barraca também ficou toda deslumbrada.

— E por que ela não vem ajudar a senhora a vender?

—Ela não precisa me ajudar nada, não.

A senhora a ofereceu um espelho.

— Ficou lindo! Nossa — Anita gostou.

A senhora viu alguma coisa errada.

— Calma aí, filha, deixa eu ver atrás.

A senhora olhou, olhou, olhou e parecia não achar o problema.

— Num sei… Será que prendi erra-Ah! Sabe o que é? É que seu cabelo é lisinho!

— Quê?

— Pois é. Na minha neta fica direito porque ela tem aqueles cabelo grandão, sabe? Todo enroladinho. Aí o tecido vai lá pro alto, parecendo uma coroa, sabe?

— Ah, tá… Mas eu gostei.

— Se você gostou, tá bom.

— Vou levar esse, senhora.

— Que bom. Não quer levar pra dar de presente pras suas amigas também, filha?

— Não… Elas são muito sem graça. Não gostam de nada exótico.

A senhora entendeu.

— É 20.

— A senhora não aceita cartão, né…

— Que nada! Tem aquela maquininha nova aqui.

— Ah, ótimo.

Anita pagou.

— Esse manequim é lindo, né? Olha esses cílios.

— Pois é. Minha filha é gerente daquelas loja chique lá de Copacabana, sabe? Aí tava faltando uns manequim pra expôr os turbante e a patroa dela liberou me dar uns antigos.

— Ué, mas não vende manequim baratinho no mercadão também, não?

— Mas é que eu adorei os cílios também. Resolvi deixar.

--

--