Musicalizando uma relação

Eloíne Gomes
CRÔNICAS
Published in
3 min readJan 23, 2018

A gente começou nos primeiros versos de Wheels. A gente não, ela. Acompanhou o Dave Grohl enquanto fazia do volante seu melhor microfone e eu só peguei o ritmo naquela parte do well we all wanted something beautiful / I wish for something true; eu mal sabia que era só olhar pro lado. E nem tinha me tocado, antes disso ela veio como naquela do Rael, ela é prima de um amigo / que eu trombei num rolê.

Ela vai do pagode ao rock sem qualquer frescura. Perambula pelos versos de Cartola e, sem vergonha alguma, fala do fanatismo adolescente depois de viajar 1169 km e perder algumas aulas só pra ver o Bruno Mars ao vivo. É toda feita de paixões e talvez seja por isso que se tornou a minha. Transborda a existência e dá vida ao trecho que diz que ela é pra frente, e me põe pra cima / repõe minhas reservas de pura serotonina.

Ela me mostra um lado leve e divertido da vida, até nas horas de crise, I don’t know what she sees in me, mas a gente agradece ao Universo e o que mais preciso for pela sorte do encontro. Tem aquela que fala: um beijo e ela confirma o crime e o castigo / o mundo para e ela diz “vem pra casa comigo?”, conhece? Deveria.

E a última do Rashid, cê me inspira tanto, vou ter que botar seu nome nos créditos do som. Um livro, um filme, um disco, um desenho, uma personagem, e o que mais eu conseguir tirar das minhas peripécias criativas. O melhor dela só eu tenho, e que sorte a minha.

A gente compartilha o pesar por não ter ido naquele show de rock, com direito a roda punk e tudo, e eu sorrio em homenagem às semelhanças, mesmo que pra mim seja algo tão contraditório às vezes. Com ela volto a sonhar e desejar alçar voos altos.

Talvez o mais incrível dela seja conseguir ser esse furacão de adrenalina e, ainda assim, carregar uma leveza que só ela tem; possui a mesma calmaria que uma música da Norah Jones. Como se fosse um sol agradável em dias de verão e o vento necessário pra te manter na cama em um dia nublado.

Faz tudo isso com a maestria de quem toma cerveja de garrafa mesmo às segundas sem a menor culpa, só porque acha que merece. Só porque sabe que merece. O coque desleixado, os papéis espalhados pela mesa, o jaleco bem guardado com orgulho são, olhando daqui, a prova de que o Chorão fez pra nós aquela em que diz “eu só quero um fim de tarde / e um lugar só meu e ela pra curtir”.

E quando a noite cai a gente é só mera faísca, brincando de slow dance in a burning room. É, acho que acabaram os meus dias de pista.

PS: desculpa, Lenine, mas a minha sim é todas elas juntas num só ser.

PS²: nas minhas palavras eu encontro um jeito de dizer o que meu olhar diz sempre que o encontro acontece. São só variáveis de um mesmo sentimento.

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