Quem eram aqueles?

marcellacom2l
CRÔNICAS
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3 min readFeb 2, 2018

Nunca chegamos nem perto de repetir o que aconteceu naquela noite. Ok, talvez um pouco na parte do seu atraso, mas aquele primeiro encontro, definitivamente, não foi a gente.

Não estava com vontade de ir me encontrar com você, é verdade. Você me parecia alguém sem graça e sem muito papo. Era uma mensagem seguida de um hahaha sempre. Qual a necessidade disso? Eu sou do tipo que ri com kkkkkkkk com os íntimos, HAHAHAHA quando é realmente engraçado, ou um tapa no teclado quando não consigo escrever direito de tanto rir e nunca um hahaha certinho. Uma série acompanhada de pizza naquela sexta-feira à noite me parecia um plano melhor, mas deixei a preguiça de lado e resolvi não desmarcar.

Te esperei na catraca por alguns minutos. Você, como sempre, preso no trabalho e eu pontual. O mesmo se repete toda sexta-feira e eu ainda quero te matar por ficar esperando. Até que você chegou e eu pensei "ainda bem que não desisti", depois de ter pensado "eita, ele já tem cabelo branco".

Fomos pra um bar. A gente sai religiosamente toda semana pra comer hambúrguer, raramente vamos pra um litrão, mas o nosso primeiro encontro foi vivido por outras duas pessoas e elas frequentam bares. Lá começamos a beber uma, duas, três e sabe-se lá quantas cervejas tomamos aquela noite. Você não parava de falar e eu disputava espaço na conversa. Dá pra acreditar? Você, tão quieto e tímido, e eu que sempre tomo a voz em qualquer lugar.

Falamos de todos os assuntos possíveis, eu sei disso, mas não lembro quais eram, nem lembro se menti pra parecer mais interessante pra você. Só não esqueço a nossa discussão sobre onde exatamente ficava a Eslovênia. Eu estava certa — o que também foi algo único, já que eu sou um fiasco com geografia, você sabe.

Lembro de subir as escadas do bar pra ir ao banheiro. Cheguei e fiquei rindo, me olhando no espelho. Era um sinal de que eu estava bêbada e que o encontro tava valendo a pena.

Voltei, bebemos mais e deixamos a porção de batata frita quase inteira porque nenhum dos dois consegue comer e beber algo ao mesmo tempo. Como todo mundo consegue misturar cerveja com comida menos a gente? Seguimos de volta para o metrô.

Lá, você fez algo pior do que não deixar a esquerda livre, o que já tira qualquer usuário do metrô do sério. Me beijou no meio da baldeação, atrapalhando a passagem. Daqueles beijos que você olha e pensa "cara, no metrô? pra que isso". É, nós somos aqueles que julgam as demonstrações de afeto dos outros em lugares públicos e já fomos aqueles que protagonizam.

Eu guardo o máximo de detalhes daquela noite. Da sua calça bege, jaqueta de couro e vans. Do meu vestido florido, meia calça e botinha baixa. Da sua mochila de academia no ombro. Daquele canto na estação Paraíso. Da sua mensagem perguntando se eu tinha chegado bem em casa.

Eu guardo o máximo de detalhes do que nós fomos aquela noite e do que somos hoje.

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marcellacom2l
CRÔNICAS

Um dia eu estava sentada no sofá comendo bolo. Olhei pro meu pé e vi um bicho. Tentei espantá-lo, mas ele não se mexia. Era bolo. Instagram: @aondevaimarcella