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Sou índia, levo a minha vida como primata, mas a minha cultura é decisiva para a sua evolução!

Osvaldo Alves dos Santos Junior
CRÔNICAS
Published in
2 min readApr 27, 2017

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Lembro-me como se fosse hoje, enquanto meus pais estavam atravessando o rio Amazonas em nossa canoa, meu pai olhava para mim e dizia:

— Minha querida, tudo aqui é nosso, somos independentes, somos taiguaras (livres) e essa independência ninguém pode tirar de nós!

Certo dia, eu estava sentada com as meninas da aldeia, olhávamos a beleza das florestas, quando alguém gritou:

— Invasão! homem branco! invasão!

Não adiantava resistir, eles tinham armas mais fortes que as nossas, e para não morrermos, trocamos as nossas terras por presentes baratos.

Os Jesuítas tentavam nos ensinar a civilização, mas não podíamos entender a civilização do homem branco. Porque para nós, ser civilizado era saber amar o seu povo e a sua terra. O nosso armamento era o somente o necessário para nos defendermos, mas o armamento do homem branco era para destruição em massa, tinham bombas nucleares, tinham tanques de guerra e metralhadoras; enquanto nós usávamos o arco e a flecha.

Eles roubaram a nossa terra, mas uma coisa eu sabia, eles nunca poderiam roubar a nossa cultura.

Rejeitamos a escravidão, éramos taiguaras desde o ventre, antes mesmo de Dom Pedro I gritar ‘independência ou morte’ próximo ao riacho do Ipiranga, nós já havíamos gritado essas palavras há muito tempo. Poderiam nos matar, mas jamais iriam tirar de nós a nossa independência.

Hoje andamos nuas pelas ruas, mas nunca fomos estupradas; usamos penas, colares, usamos tinta e pintamos os nossos rostos, dançamos livremente em volta do atagûasu (fogueira), nos dias de areté (dias festivos); porque a nossa cultura é liberdade.

Não precisamos fazer um muro em volta de nossas aldeias, para separar nosso povo, como Donald Trump quer fazer entre EUA e o México, simplesmente porque somos separados pela nossa cultura, pela origem e pelo respeito a nossa raça dentro da diversidade humana. Nosso idioma sempre foi o Tupi Guarani, e mesmo com a colonização, a nossa língua continua a mesma.

Somos tão determinados e exigentes com nossa existência, que deixamos a nossa marca no calendário do homem branco, no dia dezenove de abril todo cara pálida quer ser índio.

Sou índia, sou humana, sou primata, sou eu mesma. Nas aldeias e nas ocas eu ainda grito, ecoando minha voz pelos ares dizendo: “podem roubar a nossa terra, mas não podem roubar a nossa cultura.”

Osvaldo Vieira

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Osvaldo Alves dos Santos Junior
CRÔNICAS

"A vida é uma carta para ser lida no futuro.... sem pressa, como uma lição sem remorso"