Ministério da Cultura vê distorções da Lei Rouanet como criminosas e quer incentivar crowdfunding

Felipe Caruso
Crowdfunding Brasil
3 min readApr 7, 2016
O secretário de Fomento e Incentivo à Cultura, Carlos Paiva, à esquerda e osoutros membros da mesa

O sistema de financiamento atual da cultura no Brasil não corresponde à sua complexidade, provoca uma concentração “criminosa” de recursos e não tem nenhuma participação popular. A análise não é minha, mas do secretário de Fomento e Incentivo à Cultura (Sefic) do Ministério da Cultura (MinC), Carlos Paiva.

No começo dessa semana, apresentei o cenário do crowdfunding no Brasil e no mundo no ciclo de debates sobre políticas culturais na Universidade Federal da Bahia (UFBA) a convite do Centro de Estudos Multidisciplinares em Cultura (Cult) e da Sefic. A cultura foi o primeiro setor a se apropriar do financiamento coletivo no país e representa a maior parte do modelo de recompensas nas plataformas nacionais e internacionais. Na ocasião, Paiva apresentou sua leitura do financiamento da cultura no Brasil e o que pretende fazer para melhorar a situação.

Lei Rouanet

O Programa Nacional de Apoio à Cultura (Pronac) foi implementado pela Lei Rouanet em 1991 e é totalmente baseado em editais e incentivos fiscais. Não demorou para que os departamentos de marketing se apropriassem do sistema e passassem a usar a verba para trazer retorno de imagem para as grandes empresas. Essa dinâmica concentrou capital nas regiões mais ricas do país e viciou o sistema em beneficiar os artistas que trouxessem retorno de marca. Em 2015, 80% dos R$ 1,17 bilhão captados via renúncia fiscal foram para projetos da região Sudeste.

Há pouco mais de um ano no cargo, a principal proposta do secretário é acelerar a tramitação do Procultura, projeto de lei que tramita no Congresso Nacional desde 2010 e pretende modernizar e aumentar a distribuição dos recursos de incentivo à cultura.

Para complexificar o sistema, uma das apostas do MinC é incentivar novos mecanismos de fomento, entre eles o financiamento coletivo. O crowdfunding tem potencial de mitigar algumas das distorções provocadas pela Lei Rouanet ao democratizar e pulverizar o acesso ao financiamento.

"Os programas recentes de maior impacto do Ministério da Cultura foram os que descentralizaram a sua execução, como os pontos de cultura", Carlos Paiva.

Além disso, o modelo incentiva a participação popular e transfere o poder decisório sobre a aplicação do dinheiro na cultura dos departamentos de marketing e do MinC para as pessoas interessadas nas iniciativas.

Nas outras vezes que conversei com Carlos Paiva, representando o Catarse então, coloquei que via quatro frentes para o Ministério da Cultura incentivar o crowdfunding no Brasil

Pesquisa

Desenvolver o estudo e a pesquisa sobre o financiamento coletivo no país. Do uso ao impacto, passando pelo diálogo com as plataformas. Defendi que esse era o primeiro passo.

Regulamentação

Dar segurança jurídica para a atuação das plataformas de crowdfunding, definindo sua atividade e esclarecendo zonas cinzas de atuação, como a natureza da relação apoiador-realizador e as questões tributárias

Formação

Levar a ferramenta para os produtores de cultura em todo o país e capacitá-los a utilizá-la em todo o seu potencial

Fomento

Apoiar projetos de financiamento coletivo, especialmente na forma de matchfunding, em que o Ministério da Cultura colaboraria com uma determinada quantia para cada real levantado por um projeto

Em 2016, o Ministério da Cultura deu o primeiro passo para incentivar o financiamento coletivo no Brasil ao abrir um edital para estudar como “dialogar com a cena atual do crowdfunding no Brasil sem estragá-la”, nas palavras do secretário.

O caminho é longo e são muitos os desafios, tanto para corrigir os defeitos da Lei Rouanet quanto para incentivar o financiamento coletivo no Brasil. Por enquanto, o MinC aponta positivamente para a construção coletiva de uma solução tão complexa quanto o problema.

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Felipe Caruso
Crowdfunding Brasil

Jornalista, consultor de crowdfunding e capacitor de fluxos. Foi coordenador de comunicação do Catarse e repórter na Folha de S. Paulo