O que as Divinas Divas me ensinaram sobre financiamento coletivo
“Divinas Divas” estreou nos cinemas do país na última semana. Uma notícia relevante para o cinema nacional e um marco importante na história do financiamento coletivo por aqui.
O filme dirigido por Leandra Leal foi financiado na Benfeitoria com o apoio de 232 pessoas em 2013, levantando R$ 155.445, a maior arrecadação da história da plataforma na época. Um espetáculo foi realizado no Teatro Rival em 2014 e o documentário foi finalizado em 2016, vencendo prêmios importantes no Festival do Rio, no Fest Aruanda e no SXSW Film Festival.
Como apoiador da campanha, fico emocionado com o caminho percorrido até aqui. Como irmão da roteirista e produtora, sinto um orgulho sem tamanho, pois sei das dificuldades encontradas na jornada. Como estudioso do financiamento coletivo, guardo sempre comigo o aprendizado que tive com a campanha, que ainda uso como caso de estudo nos cursos, workshops e consultorias.
Comece pelo porquê
A narrativa é uma das partes mais importantes da campanha. Comunicar uma ideia de forma clara, concreta, crível e emocionante é fundamental para engajar o público. Muitos projetos erram logo na primeira parte, definindo mal qual é a mensagem principal.
O pesquisador inglês Simon Sinek escreveu um livro e fez sua primeira palestra no TED (realizada em 2009 e assistida mais de 32 milhões de vezes até hoje) explorando uma ideia muito simples: o círculo dourado.
Não há mistério. Segundo ele, a maioria das iniciativas se comunica de fora para dentro do círculo: todas sabem o que fazem, muitas entendem razoavelmente como fazem e poucas exploram porque fazem se não forem perguntadas.
Mas as grandes mudanças, as empresas excepcionais, as ideias que marcam e os movimentos que realmente mudam o curso da história se comunicam de dentro para fora.
Assim, Sinek aconselha: comece pelo porquê. “As pessoas não compram o que você faz, mas porque você faz”, repete insistentemente.
Muito além de um filme
Eu já conhecia o trabalho de Simon Sinek quando conheci as Divas. Mas foi essa campanha que me fez entender sobre o que ele estava falando de verdade.
A ideia era financiar um espetáculo e posteriormente um documentário sobre a primeira geração de travestis do Brasil, um grupo de artistas completando 50 anos de carreira.
Eu só entendi de verdade a campanha quando entendi que era sobre muito mais do que financiar um filme. “Divinas Divas” é uma declaração sobre os direitos individuais. É um relato sobre o direito de existir, de ser quem se é. Mais do que um filme, é um manifesto.
Como diz a diretora Leandra Leal no vídeo da campanha: “Um artista completar cinco décadas em atividade é admirável. Para um artista travesti, alcançar essa marca é simplesmente extraordinário.”
Não é sobre “o que”, mas sobre o “porquê”.
Em 2013, financiar a realização do filme não era apenas contribuir com uma opção de entretenimento e cultura, mas marcar uma posição importante. Se os departamentos de marketing das empresas têm dificuldade de destinar recursos para temas desse tipo, somos nós, as pessoas, que daremos vida a esses projetos.
Hoje, ir ao cinema e assistir “Divinas Divas” é a forma de demonstrar esse apoio. E não faltam razões para isso.