Contradições Visuais | Mac Adams

carlos tomaz
SEMIÓTICA - Turma 2018.1
5 min readSep 12, 2018
FOTO DA EXPOSIÇÃO SOMBRAS E MISTÉRIOS | MAC ADAMS NA CAIXA CULTURAL

Luz, sombras e elementos significantes compõem o cenário articulado e modular do artista Mac Adams em sua exposição contemporânea de codinome Sombras e Mistérios exposta na Caixa Cultural. Muito mais que a construção de uma cena, o autor faz um convite inusitado a co-participação dos fatos e traz à tona a necessidade da co-autoria na articulação de um nível mais profundo de entendimento. Esta obra hospeda na contradição visual e no uso de colisões híbridas, um tipo de realidade oculta que fica patente apenas através da re-significação arbitrária dos elementos e da apropriação da linguagem dos signos.

Mais que um relato normativo dos fatos, o autor constrói uma narrativa histórica e retrata uma série de tragédias, decodificando aspectos sociais através da experiência artística, perfazendo a matriz dos anos 80 e da condição Pós-moderna, fonte entre o objeto e o observador. Talvez seja esse o ponto em que o artista chama de Vazio Narrativo, um espaço ou lacuna entre o objeto em sí e a sua projeção simbólica.

Os primeiros passos em busca do abrigo da luz.

No abrigo da luz reside a atmosfera de um cenário cotidiano aparentemente sem profundidade de significado, porém por entre as articulações das esculturas, desmaterializam-se combinações de sombras e silhuetas projetadas no espaço que refletem conflitos de uma condição transitória emergente. Tendo como ponto de vista o olhar passivo de análise, farei uma breve descrição sobre o quadro selecionado e em segundo plano da-se-á o entendimento como intermediador de uma realidade reconstruída de significados.

Inicialmente o olhar percorre a cena em busca de uma sinergia quase que peculiar, aos poucos a atmosfera de uma luz suave e pontual abriga o convite para que o observador se aproxime e contemple o espaço. Por fim e em poucos passos estava diante sí, uma parede negra, silenciosa e completamente misteriosa que servia de pano de fundo para eclodir a sinestesia entre as formas, luzes, sombras, signos, valores, e o interpretante. Em foco encontra-se o significante e significado no quadro de Mac Adams e o "eu" observador. Neste momento existe apenas um diálogo entre a retina refletida e o espelho reluzente transparente, não há interferências ou juízo de valores, apenas a contemplação de uma obra que constrói a visualidade do aprisionamento das sombras. De fato ali iniciava-se o que há de mais puro e consistente no âmago das relações semióticas.

De imediato nada aconteceu ao interpretante, apenas o olhar contemplativo mirava profundamente um quadro de dimensões aproximadas em torno de 35 x 23cm, pendurado na altura dos ombros. O diálogo encontra-se apenas na caixa preta do olhar do observador, que mantém total foco na obra. A luz irradia cada ponto da tela que emoldurada por uma faixa preta, perfazendo-se por entre a base branca no seu centro que conduz para a imagem em si.

Após rastrear minimamente cada detalhe da cena, é possível distinguir que há diferenças nos materiais usados para compor o cenário no terço superior. No ponto mais alto, encontra-se uma pedra de tamanho mediano, com textura polida e tonalidade âmbar sobre uma roda de metal fosca, um artefato gasto e sem nenhum polimento aparente. Esta roda está sustentada por outras pedras com texturas mais rústicas servido de calço em ambos os lados, como se dali fosse sair girando por sobre a gaiola de metal. No interior da gaiola está uma serragem de madeira que serve como background para abrigar a silhueta do animal projetado pelas sombras. Não obstante a porta encontra-se um pouco aberta indicando uma semi liberdade.

FOTO EM DETALHE DO CATÁLOGO DA OBRA

É possível perceber que cada elemento foi devidamente articulado em seu posicionamento e isto transmite ao observador um fenômeno indutivo por ser exposto a tal proposição. A reunião destes objetos em tais articulações é suficiente para provocar a curiosidade e o questionamento, porque alguém articularia tais elementos em total combinação de arquétipos? O fato é que isto provoca a busca da leitura da cultura visual do observador, neste ponto entra em cena o abrigo de relações e das trocas de experiências, um escambo no mutualismo entre a obra e o observador.

A este tempo de imersão já ocorrem as leituras complementares dos arranjos hierárquicos, já é possível compreender o arcabouço da combinação entre as formas irregulares, linhas, textura, círculo e retângulos sem nenhuma congruência de relação. Uma vez que há o domínio deste framework é possível subjugar as raízes mais profundas das sombras espectrais. Aos poucos algumas vozes silenciosas do pensamento, gritam em sinergia com a luz preponderante quebrando o estatus quo. Estes são os primeiro sinais de que há uma nova relação de significado, a colaboração entra em cena para esculpir novas tonalidades de entendimento, já não há esforço pois o diagnóstico semântico proporciona uma relação ambígua entre a realidade e o abstracionismo da obra.

O autor transmite uma espécie de liberdade atemporal, uma equação bivalente pela transmissão de uma narrativa literal dos sentidos. O visceral é de fato o condutor tátil entre o aprisionamento do animal que lá não existe e a projeção simbólica na mente do observador. Esta reflexão clareia a impressão dos sentidos e de uma realidade social. A cena não retrata uma realidade, ainda que o seja na intenção projectual. Será mito? ou um artefato linguístico? Talvez seja apenas uma metáfora visual ou a possibilidade para uma reflexão mais aprofundada das relações e inquietações humanas. A exposição destina-se a uma jornada histórica que tem passagens pela elaboração imagética de um metacódigo visual ampliado pela interpretação do observador. Esta obra possibilita a abertura de um vasto campo para a necessidade de re significação do mundo prisional. Em última análise o autor deseja provocar inquietações através da representação dos significados simbólicos. Enxergar o que não se vê torna-se óbvio, como o oculto que se retrata no campo visível pois a luz sempre traz a tona aos olhos do entendimento o secreto e o escondido.

CENÁRIO VIVO

--

--