O Racionalista Romântico

Allenylson Ferreira
C. S. Lewis Brasil
Published in
3 min readMar 15, 2018

Este é um livro em que nos deleitamos a cada página, a cada ensaio. John Piper, Kevin Vanhoozer, Philip Ryken, Douglas Wilson e Rand Alcorn [com introdução de David Mathis] abordam temas específicos e escrevem magistralmente sobre a relação de Lewis com cada tema abordado. Piper, no último ensaio do livro, explica como o alimento é um ato de adorar a Deus e faz isso com a ajuda de Lewis. Ele diz que o comer não é um fim em si mesmo, mas muitos assim veem erroneamente. Os alimentos não são adoração, podem transformar-se em adoração. É o meio pelo qual adoramos e glorificamos a Deus, pois “eles nos ensinam a saborear a doçura de Deus na doçura do mel e a lhe dar graças”. Confesso que fiquei bastante emocionado ao ler este ensaio. E é Piper que escreve o ensaio que dá nome ao livro. Um primor! C. S. Lewis era romântico pois sentia o anseio por algo que não é desta terra, e racionalista porque usava a razão como lógica, pois ela não é condição humana criada de modo diferente de cultura para cultura. “Elas estão enraizadas em como Deus é”.

Já Vanhoozer escreve sobre a importância do discipulado e exemplifica, por meio de excertos das obras do Lewis, esta questão. Usando a imaginação, ele nos alerta do perigo de estar dormindo e não estarmos enxergando que vivemos em “sombras brilhantes”. Uma frase que me impactou bastante neste ensaio foi que “Andamos sonâmbulos pela vida — dormindo ao volante da existência — apenas em parte conscientes do que é eterno, das coisas realmente sólidas e que comportam o peso de glória”. Para fazermos teologia e praticar o discipulado, a imaginação é um fator determinante para a compreensão. Teologia desassociada da imaginação é algo preto no branco, quase sem vida. E Lewis, mesmo sendo um teólogo leigo, nos mostra como fazermos isto com boa imaginação e como ser influenciados e ter a imaginação “batizada” ao ler autores que criam histórias fictícias, mas que se aproximam do que é verdadeiro pela imaginação.

Ryken trata sobre a posição não ortodoxa de Lewis em relação à inerrância e inspiração das Escrituras. É o ensaio mais delicado, pois muitos dos críticos de C. S. Lewis poderiam usar uma parte isolada e atacá-lo, atitude que o autor não deixa transparecer e nem o faz. Mesmo aqueles que admiramos podem ser falhos em algum aspecto, mas nem por isso o deixamos de admirar menos. Só deixando claro que a sua posição, que o próprio Lewis dizia que não era a mais correta e estava aberto para aprender mais sobre este assunto, era de foro íntimo. Ele nunca fez dessa sua crença pessoal algo doutrinário e não escreveu sobre em suas obras. É bom deixar claro que Lewis defendia as Escrituras dos ataques liberais, mesmo não compreendendo como Jó ou Jonas poderia ser divinamente inspirado, sendo que nada sabemos sobre o contexto histórico de ambos. Repito: Lewis nunca foi um cristão liberal. Ryken diz: “Ainda que se possa criticá-lo de várias maneiras pela incapacidade de afirmar a doutrina plenamente bíblica da Escritura, é justo declarar que ele passou a maior parte do seu tempo na defesa da Bíblia que criticando-a — se é que ele fez”.

Wilson aborda sobre como Lewis pensava a respeito do dom da salvação. O nome do ensaio é bem sugestivo; “Deixando de ser dragão”. Aqui, Wilson defende que Lewis tinha simpatia à doutrina reformada da salvação. Ficou curioso? E Alcorn escreveu sobre novos céus e nova terra na perspectiva de Lewis. É outro ensaio que me encantou muitíssimo. Cheguei a sentir tanta alegria com a imagem de uma nova terra, e com os argumentos que Alcorn apresentou [com a ajuda das imagens que Lewis escreveu em A última batalha], que tive que compartilhar com meus amigos sobre esta escatológica e deliciosa leitura.

O apêndice um trata sobre o que Lewis pensava sobre a doutrina do inferno e no apêndice dois é a transcrição de um bate-papo delicioso entre os autores dos ensaios.

Se você ama C. S. Lewis, se algum livro o fez encarar este mundo com um novo encantamento, se Lewis exerce sobre você tamanha influência, então indico este livro sem pestanejar. É o melhor que já li sobre o nosso velho e amado Jack.

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