Fui cercado

Guilherme M. Bonfim
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3 min readJul 26, 2020

A gente nunca sabe o que vai acontecer conosco no decorrer de um dia qualquer. A imprevisibilidade da vida é sim um dos motivos que nos fazem refletir sobre os rumos que estamos tomando. Afinal, como deixar para amanhã algo que você pode fazer hoje, se não há nenhuma garantia de que haverá um amanhã?

Coisas ruins acontecem com qualquer um. Não é questão de mérito, elas simplesmente acontecem quando a gente menos espera.

Aconteceu comigo.

Vivi uma situação aterrorizante. Daquelas que não se deseja nem para o pior inimigo, para quem tem inimigos.

Saí para a minha habitual corrida matinal. Fazia um lindo dia de sol, a temperatura era amena e o bosque onde costumo correr parecia reservado só para mim. Os únicos sons que eu ouvia eram os que vinham dos meus próprios passos, o canto de alguns passarinhos que eu não sou capaz de lhe dizer qual eram as espécies e o farfalhar das árvores que me ofereciam as gélidas sombras típicas de uma manhã de inverno.

Foi de repente. Estava totalmente envolto em meus pensamentos quando eles surgiram. Sem que eu pudesse me preparar, quatro pares de olhos me olhavam fixamente. Eles pareciam surpresos com a minha presença ali, tinham ares de que não estavam fazendo algo lícito e logo percebi que se irritaram comigo.

Parei. E este foi o meu erro.

Ao me verem hesitante e claramente amedrontado, todos eles, como se fosse um movimento ensaiado, deram dois passos na minha direção. Eles estavam claramente furiosos. O maior deles tomava a frente e foi o que mais se aproximou. Ele me chamou a atenção pela sua beleza, mas me apavorava com o seu tom ameaçador. Dois deles ficavam na retaguarda, como se aguardassem uma ordem para o ataque, e o menor, um pretinho que certamente era o mais novo, parecia estar sob efeito de algum entorpecente. Estava eufórico.

Notei que a partir dali a minha chance de fuga era nula. Eu não sabia o que aconteceria, não tinha nada a oferecer e o dia que amanheceu lindo se transformou em algo sombrio, assustador e sem perspectiva de mais nada.

Tentei de alguma forma me livrar da situação. Disse um entrecortado “bom dia”, com a voz trêmula de quem sabe que está sob ameaça, e comecei a caminhar na direção oposta a eles. A ideia era mostrar que havia encerrado a minha atividade e que eu não faria nada de mal a eles.

Mas eles se exaltaram ainda mais. O pretinho correu na minha direção e pulou em cima de mim. Suas patinhas sujas de barro marcaram minha canela e ele passou a me lamber enquanto abanava o seu rabinho.

Fiquei surpreso. A atitude do filhotinho da turma desmoralizou toda a banca criada por eles. O grandão também se aproximou aceitando o meu carinho, ainda que um pouco desconfiado, e os outros dois, legítimos vira-latas caramelos, se afastaram com certa indiferença.

Fiquei amigo daquela turminha e agora, sempre que corro pelo bosque, levo alguns petiscos no bolso para oferecer a eles caso a gente se reencontre!

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