Crônicas

João, o que vamos fazer no teu aniversário?

João Pedro
Cultura da Mesa
Published in
3 min readAug 29, 2023

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O dia do meu aniversário de sete anos | Foto: arquivo pessoal

Todo começo de junho é a mesma pergunta. Afinal de contas, é necessário ter um tempinho para organizar o que for preciso. A resposta pode variar ao longo dos anos, mas a única certeza que se tem é que será celebrado em volta da mesa.

Eu não sei você, caro leitor, mas quando eu penso em “festa de aniversário”, a primeira coisa que passa pela minha cabeça é a comida: o bolo, os brigadeiros, as coxinhas, os cachorros-quentes, o refri geladinho. Não precisa nem ter grandes decorações e música alta; se tiver o que comer está ótimo.

É engraçado pensar que a nossa relação com as festas de aniversário vai evoluindo conforme a gente vai crescendo. Veja bem: até os dez ou onze anos as festas são sempre cheias de docinhos e salgadinhos naqueles pratos descartáveis que parecem surgir só nessa época do ano. Na adolescência, queremos parecer adultos e trocamos os pratos de plástico pelos de louça dos restaurantes. Já na maioridade, ainda que gostemos dos mesmos restaurantes de sempre, às vezes bate a nostalgia das celebrações da infância e tudo o que queremos é uma mesa de docinhos com um bolo no meio.

Quando eu olho para trás e penso nas festas que eu já tive ao longo dos anos, percebo que comigo o ciclo foi exatamente esse. Meus primeiros aniversários foram em salões, cheios de família e gente que eu nunca mais vi na vida. Dos salões, as festas passaram para a sala e o pátio de casa. Depois veio a fase de levar as mesmas pessoas que estariam lá em casa para os restaurantes que eu mais gostava em Viamão (geralmente uma hamburgueria ou um rodízio de pizza).

Foram poucas as festas com a gurizada da minha idade. Aos sete, a festa foi num mega salão perto da oficina mecânica do meu vô, com toda a minha turma da primeira série. Aos nove, teve uma celebração pequena no recreio, também com a presença dos colegas. A festa de 16 foi mais deprimente, com cinco pessoas (incluindo eu e duas primas) em uma mesa para doze num rodízio barato.

Chegando perto dos 18, os aniversários voltaram para a sala de casa, mas as tardes viraram noites, os salgadinhos viraram massas e o bolo… bom, esse só mudou para um sabor que agradasse mais a mim que aos convidados. Considerando que o meu círculo social sempre foi pequeno e eu quase nunca chamava ninguém de fora da família, acho que esse é o modelo ao qual eu mais me adaptei.

Depois de dois anos usando essa fórmula da macarronada no sábado antes ou depois do meu aniversário, quando parecia que esse modelo já estava consolidado, veio a pandemia. Com o distanciamento, um dos poucos dias que eu gosto de receber o calor humano virou só mais um dia. Para piorar, todos os anos ocorria algum incidente no dia: aos 19 foi o caminhão que bateu no poste e deixou a casa sem luz o dia todo; aos 20, a espumante que eu derramei na minha roupa; aos 21, a covid que minha mãe pegou na véspera.

Escrevo este texto às vésperas do meu 22º aniversário. A vida voltou ao normal, trazendo com ela a empolgação pela chegada do 29 de junho que se encontrava adormecida. O jantar de um único sábado que se realizava antes da pandemia será dividido em quatro dias quase consecutivos para atender melhor aos cronogramas apertados daqueles que eu quero por perto.

E se alguém ainda me perguntar: “João, o que vamos fazer no teu aniversário?”, poderei não ter a resposta na ponta da língua, mas terei a certeza de que a mesa será convidada de honra.

NOTA DO AUTOR: eu escrevi esse texto faltando dois dias para meu aniversário. Depois que eu mencionei qual seria o plano para celebrar este ano, fiquei doente e tudo deu errado. Moral da história: não criem expectativas.

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