Pague por segurança, viva inseguro

Danilo Sanches
Cultura de Transição
2 min readMar 27, 2018

Por que a ideia de segurança seria uma fantasia ou um gatilho mental para manipular o comportamento coletivo? Virtualmente vivemos em grupos ou bolhas de informação cujo fluxo é orientado pelos algorítmos das redes sociais

A sociedade das bolhas está em processo de mitose. Pequenas bolhas se consolidam, divididas e relativamente impenetráveis, separando pessoas em nichos de mercado, segmentos de opinião, públicos de cursos, fiéis de templos cada vez mais sagrados, cada vez mais específicos. Relativamente impenetráveis, porque a realidade é permeável e porque os seres humanos que eu conheço são aprendedores irremediáveis. Então, aprendem e permeiam-se.

Desde criança.

E crianças que são expostas a violência podem crescer jovens assustados. Assustados, são suscetíveis a preferir a fantasia em vez da realidade. A fantasia é um recurso. A realidade também. Ambas são, contudo, muito objetivas: realidade não é fantasia e vice-versa.

Desde sempre.

pxhere.com

Mas as bolhas: ocorre que na sociedade da fantasia das bolhas, porque estas são irreais de fato que são, o inimigo parece estar sempre à espreita. O inimigo é fiel. A ideia de que haja um inimigo é soberana e onipresente. Ameaça tudo.

Este inimigo imaginado coloca em xeque as esperanças mais profundas dos jovens assustados. E estes recorrem a fantasias, onde combatem o inimigo com armas potentes, infalíveis, catárticas e… sagradas. O cidadão de bem parece não ter sossego. Já não dorme e trabalha de dia e de noite. E vai à igreja e guarda o sábado. Já a sexta-feira proletária tem o gosto da morte anunciada.

Enquanto isso a segurança é, das fantasias, a mais perversa. Em primeiro lugar, porque dá a impressão de que existe algo a ser feito para que estejamos finalmente seguros.

Nunca estaremos.

Elenca-se os inimigos entre os que estão de fora da bolha e fantasia-se assustadamente a derrocada dos infiéis em favor do triunfo final da VERDADE, que depõe o mal e institui o bem. Então temos o segundo motivo pelo qual a segurança é um bem perverso. Ela é um motivo pelo qual grandes quantidades de humanos se movimentam e alguns se sustentam em posições de privilégio por deterem meios pelos quais persuadir jovens assustados a pagar por ela (nem sempre em dinheiro).

Estejam seguros! Comprem seguros! Mudem-se das cidades para o campo! Saiam do Facebook! Votem no militar! Votem no proletário!

Porém estar de fora e contemplar a lógica também não é seguro.

E talvez este seja o terceiro motivo pelo qual a lógica da segurança seja perversa: não estamos seguros, há quem lucre com isso e quem apontar a falha será eliminado.

Mas de fato se houvesse uma sociedade de bolhas impermeáveis, cada uma teria sua própria teoria da conspiração. E não haveria verdade.

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