Aprendizagem Criativa no diálogo com a Cidadania Digital

A cidadania digital é imprescindível para o nosso tempo e a educação é a “chave” de acesso, por meio da aprendizagem criativa em suas iniciativas.

1. Educação e tecnologia: realidade ampliada

O mundo online está mudando a forma de compreensão da realidade principalmente ao “apagar” as fronteiras existentes no ambiente físico e proporcionar um acesso ampliado e preciso de informações das diferentes dimensões do real. Esse contexto faz refletir sobre como assimilar essa nova realidade nos espaços formativos que possuem indivíduos que trazem suas experiências da dinâmica entre vida real e digital. E ainda são muitos os desafios da inclusão na tecnologia, apesar do cenário pandêmico ter acelerado oportunidades de acesso, segundo o IBGE (2021):

Fonte:https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/34954-internet-ja-e-acessivel-em-90-0-dos-domicilios-do-pais-em-2021

Este infográfico sinaliza resultados positivos de acesso as tecnologias, porém, não garante que é inclusivo no sentido de ter melhor uso pelos diversos usuários. Sabe-se que um dos maiores desafios deste tempo é a alfabetização midiática e informacional (AMI) não é resumida ao entendimento dos usos de aparelhos eletrônicos e nem de programas e aplicativos diversos. Possui uma compreensão para além do conhecimento técnico e inclui a capacidade de análise crítica do que é produzido e compartilhado nas redes. O que envolve os valores humanos, conhecimentos sobre fontes de informação, direitos digitais e a capacidade de participação consciente no ambiente digital. Tendo como exemplo a UNESCO (2016), Organização das Nações Unidas, para a Educação, a Ciência e a Cultura, que enfatiza a importância de considerar a necessidade de melhorar as abordagens pedagógicas voltadas para os estudos de mídia, reconhecendo a necessidade urgente de adotar uma atitude mais crítica e participativa em relação às tecnologias e formas de comunicação digital.

Neste sentido a educação tem um papel muito importante que é preparar os indivíduos para uma melhor contribuição social na rede através de propostas hibridas que articulam a vida real com a digital. Esse trabalho de inclusão pode ampliar a realidade de muitos indivíduos que tem o acesso as tecnologias, mas, não tem a dimensão da importância desse uso para novas criações da humanidade em prol do bem comum e uma consequente realidade ampliada pela fusão entre humanos e tecnologias.

A AMI é a base para a liberdade de expressão, para o acesso à informação e para a educação de qualidade para todos. Sem as competências da AMI, os cidadãos não podem ser bem informados porque não têm acesso à informação e não são capacitados para processá-la e usá-la. Isso torna difícil para os cidadãos, incluindo os jovens, participar ativamente em suas comunidades e sociedades, bem como inviabiliza uma governança boa e eficaz (MENDEL, 2008, p.164).

Assim, a educação midiática tem uma ampla dimensão para toda a sociedade, tendo uma responsabilidade crítica do que vem sendo publicado, compartilhado e analisado nas redes sociais através das mídias tecnológica.

2. Cidadania Digital: premissa para o presente do futuro

Imaginar o futuro depende de contribuir no presente com ações e atitudes orientadas para o cenário desejado. Essa perspectiva exige o preparo do individuo para participar ativamente em construções, decisões e realizações em âmbito coletivo em prol do bem comum.

Neste sentido o exercício da cidadania digital pode contribuir para envolver de forma consciente o individuo nas atividades de criar, consumir, compartilhar, investigar, comunicar, aprender, trabalhar e até se divertir em comunidades online e offline em âmbito local, nacional e global. Para tal acontecimento é preciso saber como existir, sentir e ter responsabilidades nas ações do ambiente online. Isso passa por questões relacionadas com o acesso e inclusão; aprendizagem e criatividade; alfabetização midiática e informacional; ética e empatia; saúde e bem-estar; presença eletrônica e comunicações; participação ativa; direitos e responsabilidades e ainda a conscientização para o consumo.

Ainda sobre essa perspectiva, as autoras Richardson e Milovidov (2017), traz que para ser alfabetizado em mídia e informação é algo que precisa ser desenvolvido por meio da educação e de um intercâmbio constante com o ambiente que nos rodeia. Nesse mesmo sentido, as escolas têm o importante papel de desenvolver e trabalhar a educação midiática, mas precisam de toda sociedade juntamente com os órgãos públicos, para a compreensão e ampliação da cidadania digital.

Acredita-se que o acesso não é o suficiente sem a inclusão que envolve ter as competências necessárias para participar no espaço digital com todo tipo de minorias e diversas perspectivas da realidade. Para tal, é necessário o foco em aprendizagem e criatividade ao longo da vida de modo a desenvolver competências pessoais e profissionais conforme desafios que a sociedade enfrenta com inovações da tecnologia. Essas competências dependem de muitas competências cognitivas e práticas diferentes, e o seu desenvolvimento começa em casa e continua em casa e na escola desde uma idade precoce (Richardson e Milovidov, 2017). Neste sentido, a literacia mediática e informacional, é importante no desenvolvimento do pensamento crítico e no preparo do indivíduo para a interpretação, compreensão e expressão de criatividade de modo a gerar participação significativa e eficaz na comunidade e no meio digital.

Assim, um dos comportamentos mais importante para este contexto é a prática da ética na interação com as pessoas, ou seja, agir com empatia em prol de saúde e bem-estar na diversidade de relações. Isso torna-se potente desenvolvendo qualidades pessoais e interpessoais que geram positividade, coerência e consistência para a manutenção de uma identidade online.

Ainda é preciso preocupar com a privacidade e a segurança e informar de direitos e deveres para evitar golpes e constrangimentos com divulgações não autorizadas e até vazamento de dados. Saber usar o espaço é primordial, pois, uma publicação no ambiente digital pode ser um rastro de longo tempo sobre os seus comportamentos e passos de vida. De acordo com a UNESCO (2016, p.18) as responsabilidades éticas e a cidadania global implicam a participação de todos os cidadãos na sociedade para fins mais elevados, que respeitem e promovam os direitos dos demais. Não menos importante o acesso as facilidades de compras podem incentivar a falta de limites para possuir coisas. Essa conduta pode gerar dividas, insatisfação e ainda não contribuir em nada para o desenvolvimento do local aonde você reside. É preciso ter criticidade nas tomadas de decisões no ambiente da vida real e digital.

Portanto, a importância para preparar cidadãos digitais competentes e capazes de resolver novos desafios no âmbito das aprendizagens, do trabalho, da profissão, da diversão e ainda da inclusão e participação significativa na sociedade atento aos direitos humanos e as oportunidades nas diferenças culturais. Em consonância com a UNESCO (2016), a alfabetização midiática e informacional precisa que as pessoas compartilhem suas histórias por meio de discussões e esforços criativos, para que possam desenvolver habilidades para se protegerem da cultura dominante e criarem seus próprios contrafeitos, promovendo assim a diversidade cultural, porque podemos proteger o gênero, o multilinguismo e o pluralismo.

3. Aprendizagem Criativa: sinergia do real com o virtual

As mudanças na vida em sociedade estão fazendo repensar nossos processos de aprendizagem e atentar para a importância do desenvolvimento de um protagonismo nos aprendizes. Através do incentivo da participação ativa na resolução de problemas, ou seja, aplicando a metodologia ativa na jornada de ensino. A aprendizagem criativa foi criada por Mitchel Resnick do MIT Media Lab baseada no construcionismo de Seymour Papert, também do MIT, este que se inspirou em Piaget, Paulo Freire, Montessori e outros pensadores. A aprendizagem criativa tem por base quatro pilares (4Ps): projetos, paixão, pares e pensar brincando. De modo que resulte em um aprendizado por meio de um processo exploratório que estimula o senso crítico, criatividade, autonomia e interação conforme pode ser observado a seguir:

Fonte: https://aprendizagemcriativa.org/sobre-aprendizagem-criativa

Ela deve ser uma teoria em constante ajustes através das experiências e reflexões dos envolvidos. Nesta perspectiva a Rede Brasileira de Aprendizagem Criativa[1] (RBAC) apresenta-se como um movimento social constituída por um manifesto que se destaca alguns trechos:

“A curiosidade nos alimenta, nos inspira, desde a criação de um simples pião até a peça de um avião; somos movidos pela aprendizagem significativa. Idealizamos, inspiramos, transformamos e persistimos perante obstáculos no caminho; como alquimistas, misturamos elementos da natureza de maneira intuitiva e sistemática. Seja no laboratório do curso de engenharia, ou no tanquinho de areia da escola; caminhamos lado a lado. Formando nós, co-criamos e compartilhamos ideias e realizações em rede; convivemos com uma multiplicidade de ideias, projetos, experiências e sotaques; a vida é nossa escola, repleta de possibilidades de expressão e experimentação. Lugar de trocas entre personagens, professores e estudantes, regando o jardim de infância para a vida toda; potencializando a expressão humana, nos ajudam a ampliar as possibilidades de inovação; aprendemos fazendo, errando e refletindo. Mergulhamos de corpo e alma em construções que dão forma para nossas ideias; somos educadores, artistas, cientistas, fazedores, pesquisadores, empreendedores, gestores, ativistas…Somos famílias; somos professores e também estudantes. Nós somos a Rede Brasileira de Aprendizagem Criativa!”

Essa metodologia fundamenta-se no pensamento de que se aprende mais quando se tem a oportunidade de construir algo que seja significativo para nós e o processo ganha amplitude quando é estabelecido trocas de ideias com outras pessoas, exploração de materiais e conceitos no contexto do projeto. O que fez a (RBAC) identificar o quinto “P”, o propósito que torna a iniciativa mais relevante quando extrapola o crescimento individual e explora o contexto social, cultural e ambiental da realidade. Essa proposta não se configura como um processo educacional linear e segue como uma espiral conforme pode ser vista a seguir:

Fonte: https://aprendizagemcriativa.org/sobre-aprendizagem-criativa

De modo que se imagina o que gostaria de criar; constrói algo, brinca com os materiais e ideias no processo, compartilha as criações e reflete sobre o aprendizado voltando a imaginar. Não seguindo necessariamente a ordem que consta no espiral e sim realizando conforme o avançar do projeto. De acordo com Sobreira, Viveiro E D’abreu (2018, p.75) na sociedade atual, saber utilizar as tecnologias tornou-se uma necessidade para lidar com as atividades práticas do dia a dia, porém isso já não é mais suficiente para que o indivíduo esteja integrado com as evoluções tecnológicas e utilizá-las em sua vida. Então, a premissa é que seja aprofundado temas, habilidades, capacidade de conceber, desenhar e realizar ideias significativas em âmbito individual e coletivo. Por exemplo, a prática da construção de uma campanha solidária no ambiente digital para modificar uma realidade no ambiente físico. Deste modo, a aprendizagem criativa torna-se um importante método para dialogar com os desafios entorno da alfabetização digital e o consequente exercício da cidadania digital para o significativo avanço na diversidade de interações entre o real e o digital.

4. Considerações finais

A mudança na sociedade, influenciada pelas tecnologias, facilita o acesso dos aprendizes em diferentes dimensões da educação relacionadas com “a ética e cultural; científica e tecnológica; econômica e social” (UNESCO, 2010). O que gera a necessidade de preparar os indivíduos adequadamente em cada fase da sua vida para usufruir deste mundo sem fronteiras. Para isso, é preciso que o sujeito alcance o suprimento de suas necessidades fisiológicas na direção de uma autorrealização que irá compreender na capacidade do aprendizado ao longo da vida definidos conforme a UNESCO (2010, p.31) destaca: “aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a conviver e aprender a ser. Assim, ter a inclusão em experiências diversas que poderão contribuir em uma jornada de descobertas sobre a realidade e tornar o uso da tecnologia mais consciente e coerente para a vida do indivíduo. Nesta perspectiva, a educação tem o grande desafio de proporcionar acesso e inclusão através de diferentes conhecimentos e da própria literacia midiática. E desenvolver uma aprendizagem criativa como aliada das práticas para a cidadania digital utilizando a narrativa do protagonismo individual e coletivo em prol do bem comum com o uso das tecnologias disponíveis para cada realidade.

Referências

Citizenship Education Handbook, ISBN 978–92–871–8779–6, Council of Europe, March 2022.

DELORS, Jacques. Educação: um tesouro a descobrir, relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI (destaques). ED.96/WS/9. Disponível em: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000109590_por. Acesso: 4 de Dezembro de 2023.

MENDEL, Toby. Freedom of Information: a comparative legal survey. 2.ed. Paris: UNESCO, 2008. Disponível em: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000158450. Acesso em 22 nov. 2023.

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO, A CIÊNCIA E A CULTURA (UNESCO). Representação da Unesco no Brasil. Alfabetização midiática e informacional: diretrizes para a formulação de políticas e estratégias /Alton Grizzle, Penny Moore, Michael Dezuanni e outros. — Brasília: UNESCO, Cetic.br, 2016. Disponível em: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000246421. Acesso em 03 nov. 2023.

RICHARDSON J., MILOVIDOV E. (2017), Digital citizenship education handbook, Council of Europe Publishing, Strasbourg. Disponível em: https://ec.europa.eu/newsroom/just/items/672450/en. Acesso em 11nov. 2023.

SOBREIRA, E. S. R; VIVEIRO, A. A; D’ABREU, J. V. V. Aprendizagem criativa na construção de jogos digitais: uma proposta educativa no ensino de ciências para crianças. Tecné, Episteme y Didaxis: TED, n. 44, 2018.Tipo de trabalho: Resumo simples

Texto desenvolvido por Maycon de Souza Silva Cunha Gregório¹, Wanessa Dose Bittar² e Weverton Freitas Nascimento³ para a disciplina Cultura Digital e Educação Midiática: Conceitos, Práticas e Processos Formativos, sob orientação das professoras Maria Alzira Pimenta, Gabriela Borges, Maria Ogécia Drigo, Laura Picazo Sanchez, Martha Prata Linhares e Letícia Torres.

Doutorando em Educação pelo PPGE-UFTM. Mestre em Educação, PPGE-UFTM. Especialista em Ensino de Matemática IFMA e graduado em Matemática e Pedagogia.

Aluna especial de doutorado no PPGCOM-UFJF; Mestra em Artes, Urbanidades e Sustentabilidade PIPAUS-UFSJ; Especialista em Engenharia de Produção UFJF e Graduada em Educação Artística UFJF.

Aluno do PPGE — UFTM no Mestrado em Educação, Especialista em Educação Física Escolar — UFU e Graduado em Educação Física — UFU.

--

--