Crítica: “O Preço do Amanhã” é ação boa com carisma ruim

Filme do neozelandês Andrew Niccol é ambientado em universo distópico

Felipe Faleiro
Cultura Hoje
4 min readSep 19, 2017

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Pôster oficial do filme (Foto: Reprodução/Fat Movie Guy)

Fantasioso, mas com um pé na crítica à sociedade moderna e a falta de tempo para tudo, “O Preço do Amanhã” (In Time, EUA, 2011) poderia ser melhor, não fosse o pêndulo constante entre as boas cenas de ação e a falta de carisma dos protagonistas, Justin Timberlake (que interpreta Will Salas) e Amanda Seyfried (Sylvia Weis).

Se você acha que verá carros voadores ou armas a laser apenas por ser ficção científica, vai se decepcionar. Tudo bem, sou fã do gênero como um todo, mas há que se apontar falhas, ainda mais quando se fala do diretor Andrew Niccol. O neozelandês já havia feito filmes bons com temáticas distópicas antes (Gattaca, 1997), outros medianos (A Hospedeira, 2013) e mais alguns ainda em universos distintos, do gênero “faço você rir, depois chorar, depois pensar”, como a produção de O Show de Truman (1998), pelo qual foi indicado ao Oscar e o roteiro inicial no qual se baseou O Terminal (2004).

Antes, um adendo: distopia é o gênero da ficção científica que projeta futuros sombrios, geralmente governados por entidades supremas e habitantes eternamente renegados. Mas vamos adiante.

Will Salas (Timberlake) e Sylvia Weis (Amanda): protagonistas sem química (Foto: Reprodução/Rotten Tomatoes)

O Preço do Amanhã é uma mistura dos dois estilos. Na história, a humanidade para de envelhecer aos 25 anos e, por meio de um relógio digital LED embutido no braço, passa a ter dias, semanas, meses ou anos de vida, contados regressivamente. Acabou o tempo, você morre. Por isso, ele é a nova moeda de troca. Quem tem mais dinheiro e pode pagar, vive mais e pode ser até imortal, ainda que relativamente. O filme explora bem esta temática, e o tempo passa a ser tão protagonista quanto o casal. A história gira em torno da tentativa dos personagens de Timberlake e Seyfried de libertarem a humanidade deste sistema comandado pelo pai de Sylvia, Philipe Weis (Vincent Kartheiser), que tem 102 anos e aparência de 25.

Um ponto digno de aprovação é justamente o não-envelhecimento, o que proporciona momentos ótimos, mas que dependem muito mais da imaginação do espectador, como o fato de a mãe de Salas no filme, Rachel (Olivia Wilde) ter quase o dobro da idade do filho e a mesma juventude, quando na vida real Olivia é três anos mais nova que Timberlake. Outro momento é a conversa de Salas com o personagem Henry Hamilton (Matt Bomer), típico burguês que estava no local errado na hora certa, e depois de ser salvo por Salas, passa a não ver mais sentido na vida, e dá todo seu tempo de presente para Timberlake.

Há este contraste, vastamente explorado no gênero como um todo, entre o gueto, mostrado com cores quentes, e a cidade moderna, onde habitam os ricos, dominada por tons azulados. Os cenários são realistas, e quase vintage em alguns momentos, principalmente na New Greenwich moderna (referência ao fuso horário zero da atualidade, estabelecido no Observatório Real de Greenwich, na Inglaterra). Assim como a trilha sonora, que é densa, e a atmosfera geral, que dá a impressão constante de vigilância.

Murphy como o Agente do Tempo Raymond Leo: personagem ao qual mais me afeiçoei (Foto: Reprodução/YouTube)

Mas há furos. Achei totalmente artificial a cena do acidente no qual o casal sofre após ser perseguido pelos Agentes do Tempo, por volta da metade do filme. O carro poderia sair flutuando se quisesse, em uma clara falha de finalização.

Tanto Timberlake quando Seyfried também não mostram atuações convincentes. O casal simplesmente não combina.

De qualquer forma, o personagem ao qual mais se afeiçoei foi o agente Raymond Leo (Cillian Murphy). Ele é um perfeito clichê de vilão, alternando entre o cinismo em algumas cenas e a ternura em outros, especialmente em dois momentos: quando recusa um suborno e no final, onde ele percebe que, assim como os outros habitantes deste mundo, não pode contar com o tempo que tem.

Em dado momento, seus asseclas perguntam como encontrar o casal, e ele responde, fantasticamente: “Follow the time” (Siga o tempo), em uma claríssima referência ao clássico Todos os Homens do Presidente (1976) e seu “Follow the money” (Siga o dinheiro). Por mais que, em determinado momento da película, Salas e Weis se tornem foragidos procurados por toda parte, há sempre uma perseguição quase solitária por parte do Agente do Tempo. Ponto positivo para a licença poética.

Coincidentemente, no próximo dia 28 de setembro, completo 25 anos. Uma data como todas as outras, exceto pelo fato de que já começo a me preocupar com meu envelhecimento. Olho para trás e também projeto minha vida daqui para a frente. Não tenho um relógio impresso no pulso. Não fui modificado geneticamente para viver para sempre. Ainda no início do filme, Hamilton deixa uma mensagem para Salas: “Use bem o meu tempo”. Mas ela é para nós, deste universo. Estamos vivendo bem, ou só um dia de cada vez?

Nota: ★ ★ ★ ☆ ☆ (médio)

Roteiro, trilha sonora e fotografia salvam, mas falhas no roteiro e falta de química dos protagonistas reduzem a experiência geral

Confira o trailer legendado do filme

Outras críticas

Omelete, Retalho Club, The New York Times, Rotten Tomatoes, The Guardian, IMDB

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