O que é queerbaiting e por que precisamos falar sobre isso?

Lidi
Cultura LGBTQ+ Wiki
4 min readFeb 19, 2023

Texto publicado originalmente em 02/06/2021 no meu LinkedIn

O mês do Orgulho LGBTQ+ chegou e quero compartilhar durante esse mês alguns assuntos da nossa comunidade! Para o meu primeiro artigo no LinkedIn (emoção rs) escolhi falar sobre queerbaiting.

Considero muito importante discutirmos o tema nesse momento em que tanto se fala de representatividade. Eu gravei um vídeo sobre o assunto (que vou deixar aqui), mas se você é de textos, vou colocar nesse artigo os principais pontos que abordei.

Vamos do começo: o que é esse termo?

Queerbaiting é a junção dos termos:

-Queer: termo guarda-chuva usado para se referir a orientações sexuais e identidades de gênero que fogem da cisheteronormatividade (basicamente todas as letras do LGBTQIAP+)
-Bait: isca

É a mesma ideia do clickbait, onde um portal usa um título sensacionalista para ganhar cliques, criando uma isca de cliques.

No caso do queerbaiting, os filmes, livros, séries etc. colocam um personagem ou uma subtrama LGBTQ+ para atrair esse público, mas sem desenvolver ou aprofundar.

Existem alguns tipos de queerbaiting que são mais comuns de encontrarmos.

Tipo 1: obras que querem atrair o público LGBTQ+ sem perder o público conservador

Esse é o tipo mais comum. Aqui estão aquelas séries que insinuam uma tensão romântica entre dois personagens, mas nunca acontece nada de efetivo.

Já vimos isso em séries como Sherlock, Killing Eve e Doctor Who.

Vilanelle e Eve na série Killing Eve

O público LGBTQ+, que costuma ser bem fiel às séries, acompanha cinco temporadas torcendo para acontecer um beijo que nunca vem. Enquanto o público conservador não abandona a série por não ter o beijo efetivamente entre os personagens.

Também temos casos como Riverdale, onde existe um casal lésbico, mas que tem infinitamente menos cenas de casal do que os casais heterossexuais da série.

Tipo 2: personagens que são LGBTQ+ fora das telas

Nesse tipo, estão aquelas obras onde é dito existir um personagem LGBTQ+, mas essa parte nunca é retratada na tela ou no livro.

Exemplo clássico? A autora de Harry Potter diz que o personagem Dumbledore é gay e teve um relacionamento com o personagem Grindelwald. Mas saiu um filme sobre o Grindelwald e o romance entre os dois ficou apenas subentendido.

Dumbledore em Harry Potter

PS: não podemos esquecer que além disso a J.K. Rowling, autora de Harry Potter, tem posicionamentos extremamente transfóbicos.

Tipo 3: relacionamentos intensos demais, mas que não são relacionamentos românticos

Sabe aquela amizade ou aquele ódio tão intenso entre dois personagens que te fazem pensar “isso é apenas amizade/ódio?”. Isso é o que define esse tipo de queerbaiting.

Um exemplo clássico, para mim, é Naruto e Sasuke. O Naruto passa 500 episódios do anime pensando no Sasuke, procurando ele, falando dele, chorando por ele.

Agora eu pergunto: se o Sasuke fosse uma mulher, eles seriam um casal? Na minha opinião: com certeza!

Essa pergunta é muito importante para entendermos se dois personagens só não se tornam um casal por serem do mesmo gênero e, consequentemente, um casal LGBTQ+.

Outro caso clássico é Xena. Lembro de crescer assistindo essa série na TV e pensando “nossa, a Xena e a Gabrielle têm uma amizade forte, né?”. Eu sentia que tinha alguma coisa a mais ali, mas só entendi depois de adulta.

Xena e Gabrielle são um casal em todos os sentidos, menos quando chega na parte de se assumirem como. Inclusive, tem um episódio onde colocam a alma da Xena no corpo de um personagem masculino, Autolycus, para acontecer o tão esperado beijo entre as duas!

O início de um sonho / Deu tudo errado

Tipo 4: relacionamentos mal desenvolvidos

Nesse tipo, vemos casais LGBTQ+ que são ditos como casais, mas que mal se abraçam e têm zero desenvolvimento do relacionamento. E isso fica gritante quando comparamos com outros casais heterossexuais da mesma série/filme.

Exemplo: o casal gay da novela Amor à Vida. Foram mil episódios para darem apenas um beijo. Enquanto o casal principal hetero se beijava todos os episódios e tinha até cenas mais ousadas.

Clara e Marina na novela Em Família

Mesma coisa na novela Em Família, onde as duas personagens chegam a se casar e na lua de mel ficam girando de mãos dadas. Compara com a lua de mel de casais heterossexuais em novelas.

Tipo 5: Personagens mal desenvolvidos

Bem parecido com o tipo anterior, aqui temos personagens LGBTQ+ que existem na obra apenas para cumprir uma cota de representatividade.

Em geral, esses personagens não têm uma trama própria, amigos, família etc. Eles existem apenas para ser o confidente da protagonista. O caso clássico é o cabeleireiro ou o melhor amigo gay.

Como contraponto, eu sempre penso no Titus de Unbreakable Kimmy Schmidt. Ele ajuda a protagonista em vários momentos, mas ele tem um arco só dele. A gente acompanha os relacionamentos do Titus, sua busca pelo estrelato e, mais importante, seu amadurecimento. É um personagem tridimensional e não apenas o melhor amigo da Kimmy.

Um dos meus momentos favoritos de Titus na série

E por que precisamos falar sobre isso?

Cada vez mais séries, livros, filmes etc. trazem personagens/tramas LGBTQ+ para atrair esse público. Mas apenas jogar o personagem/trama não resolve.

Queremos uma representatividade real. Personagens que são pessoas com seus empregos, seus relacionamentos, seus amigos e seu amadurecimento.

Também queremos uma representatividade que não reforce estereótipos e que realmente contribua para uma melhor representação das pessoas LGBTQ+

Por isso, temos que apontar sim o queerbaiting e dar visibilidade para obras que não fazem esse tipo de prática.

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