Guerrilla Girls: Desmascarando o Sexismo na Arte com Arte

As Guerrilla Girls são um bom exemplo de como a arte pode ser utilizada como ferramenta de crítica social e política, pois através de ações performativas, cartazes e outros materiais, o grupo desafia as estruturas patriarcais e as desigualdades de género presentes na sociedade.

EvaSofiaM
Semiosis
6 min readMay 31, 2024

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Do Women Have To Be Naked To Get Into the Met. Museum? 1989 Guerrilla Girls

Em 1998, no livro das Guerrilla Girls, The Guerrilla Girls’ Bedside Companion to the History of Western Art, elas escreveram:

“Somos um grupo de mulheres artistas e profissionais da arte que lutam contra a discriminação. Somos a consciência do mundo da arte, contrapartes dos tradicionais predominantemente masculinos benfeitores anónimos como Robin Hood, Batman e o Cavaleiro Solitário (…) Usamos o humor para provar que feministas podem ser engraçadas… poderíamos ser qualquer um, nós estamos em todo o lado.”

As Guerrilla Girls são um grupo de artistas feministas anónimas que surgiram em Nova York em meados da década de 1980, num contexto marcado pelo ressurgimento do feminismo e pela crescente crítica à disparidade de género na sociedade. São conhecidas por utilizar a arte como uma forma de protesto e ativismo contra o sexismo e a misoginia na sociedade. Através de pósteres provocativos, performances públicas e outros meios artísticos, estas desafiam as normas patriarcais presentes no mundo da arte e na sociedade em geral, utilizando a arte como ferramenta de crítica social e política.

O grupo feminista, ao manter-se anónimo e utilizando pseudónimos de mulheres artistas famosas, fazem uso da ironia, do humor e da crítica afiada para expor as desigualdades de género no campo da arte. Nas suas intervenções artísticas, como pósteres, folhetos e performances, utilizam também estatísticas e uma abordagem visual impactante expondo a discriminação de género e a exclusão das mulheres e artistas não-brancos nas instituições culturais e nos discursos dominantes.

Guerrilla Girls — ‘You Have to Question What You See’ | Artist Interview | TateShots (youtube.com)

O impacto das Guerrilla Girls na sociedade e no campo da arte tem sido significativo, provocando discussões importantes sobre questões de género, poder e representatividade. Ao desafiar as estruturas patriarcais e evidenciar as formas de discriminação e exclusão enfrentadas pelas mulheres artistas, o grupo tem contribuído para a ampliação do debate sobre igualdade de género e para a conscientização sobre as injustiças presentes na nossa sociedade. Obras como “Dois terços dos artistas nas principais galerias de Nova York são homens?” e “Quantas mulheres estão no MoMA?” expõem as estatísticas alarmantes da desigualdade de género no mundo da arte.

O trabalho das Guerrilla Girls teve um impacto significativo na sociedade e no campo da arte, tendo contribuído para o aumento da visibilidade da questão da desigualdade de género e inspirando outras artistas e ativistas a questionarem as normas patriarcais. Também influenciaram mudanças nas políticas de museus e galerias de arte, levando a um maior reconhecimento e representatividade de artistas mulheres.

Através de performances irreverentes, as Guerrilla Girls amplificam ainda mais a sua mensagem. Numa ação memorável, o grupo invadiu a Bienal de Veneza em 1990, usando máscaras de gorila e distribuindo folhetos que criticavam a falta de mulheres na exposição.

O grupo também se apropria de símbolos da cultura popular e da história da arte para subverter os seus significados e questionar as narrativas tradicionais. Num póster, por exemplo, a Mona Lisa é retratada com a frase “5% das obras de arte do MoMA são de mulheres”, expondo a disparidade de género nas coleções dos museus.

How many works by women artists were in the Andy Warhol and Tremaine auctions at Sotheby’s? 1989 Guerrilla Girls

Teorias feministas de bell hooks e as Guerrilla Girls

Nascida Gloria Jean Watkins em 1952, foi uma autora, feminista, teórica social e cultural, conhecida pelas suas contribuições significativas ao feminismo, à crítica de raça e à teoria educacional. Escolheu utilizar o pseudónimo em letras minúsculas “bell hooks” em homenagem à sua bisavó materna, e ao mesmo tempo enfatizar a substância do seu trabalho em vez da sua identidade pessoal. Esta decisão foi também tomada pelas Guerrilla Girls, que optaram por esconder as suas caras por detrás de máscaras de gorilas e usar nomes de mulheres artistas conhecidas.

bell hooks proporciona uma base teórica para melhor se entender a importância do trabalho das Guerrilla Girls. Esta enfatiza a interseccionalidade, abordando como a opressão de género é inseparável de outras formas de discriminação, como raça, classe e sexualidade.

hooks argumenta que o feminismo deve ser inclusivo e considerar as múltiplas identidades que compõem a experiência das mulheres. As Guerrilla Girls incorporam esta perspetiva ao destacarem não apenas a exclusão das mulheres, mas também dos artistas não-brancos e de outras minorias.

A autora critica a cultura dominante por perpetuar estereótipos e marginalizar vozes dissidentes. O grupo ativista ecoa esta crítica ao expor como as instituições de arte valorizam principalmente artistas homens brancos, ignorando contribuições diversificadas.

bell hooks vê a educação como uma ferramenta crucial para a transformação social, e as Guerrilla Girls procuram através do seu trabalho educar o público sobre as desigualdades existentes no mundo da arte e na sociedade em geral, estimulando uma consciência crítica, chegando mesmo a dizer “Temos que questionar o que vemos… e o que não vemos.”

A luta das Guerrilla Girls está intrinsecamente ligada às teorias feministas de bell hooks, que defende uma visão interseccional do feminismo, reconhecendo a opressão de género como algo entrelaçado com outras formas de opressão. Também desta forma, a crítica das Guerrilla Girls estende-se além do sexismo na arte, abordando temas como a violência contra a mulher, o tráfico de mulheres e a presença de estereótipos de género nos média.

Embora com abordagens e públicos distintos, bell hooks e as Guerrilla Girls, partilham o mesmo objetivo fundamental de desafiar o sexismo, empoderar as mulheres e promover a igualdade de género. Através dos seus trabalhos interligados, ambos os movimentos contribuem significativamente para a construção de uma sociedade mais justa e equitativa. Estas fazem uso das suas plataformas para amplificar vozes marginalizadas e desafiar as normas estabelecidas, contribuindo para uma maior consciência e inclusão nas suas respetivas áreas.

The Advantages Of Being A Woman Artist 1988 Guerrilla Girls

As Guerrilla Girls utilizam a arte como uma poderosa ferramenta de crítica social, tendo trabalhos posteriores de feministas como bell hooks e muitas outras onde se apoiarem e inspirarem. As suas ações e intervenções têm tido um impacto significativo, tanto na sociedade em geral como no campo da arte, desafiando e transformando as normas estabelecidas e promovendo uma maior inclusão e diversidade.

Resumindo, este grupo de mulheres ativistas tem demonstrado como a arte pode ser uma “arma” de crítica social e política, capaz de questionar o considerado “normal”, desafiar as opressões de género e promover a transformação social. O seu trabalho incisivo e provocador continua a inspirar e a mobilizar indivíduos e comunidades a se juntarem à luta por igualdade e justiça.

É, no entanto, importante ressaltar que a obra das Guerrilla Girls não se encontra isenta de críticas. Algumas feministas argumentam que a sua abordagem pode ser considerada essencialista, reforçando estereótipos de género ao utilizarem imagens de gorilas como representação das mulheres. Outras críticas apontam para a falta de diversidade dentro do próprio grupo das Guerrilla Girls, quem em sua maioria é constituído por mulheres brancas de classe média.

Apesar das críticas, o grupo continua a ser um importante coletivo artístico e feminista. A arte provocativa continua a questionar as desigualdades de género na sociedade contemporânea, inspirando reflexões e ações por um mundo mais justo e igualitário.

You’re Seeing Less Than Half The Picture, 1989 Guerrilla Girls

Referências:

hooks, b. (2018). O feminismo é para todo o mundo. (1ª edição) Rosa dos tempos.

Guerrilla Girls original website: Guerrilla Girls

Arte Versa. (2017, Dezembro 14). GUERRILLA GIRLS: a igualdade de género no universo da arte. GUERRILLA GIRLS: a igualdade de gênero no universo da arte — ArteVersa (ufrgs.br)

Tate. Who are the Guerrilla Girls? Who are the Guerrilla Girls? | Tate

Lendo a História da Arte. Guerrilla Girls. Guerrilla Girls — Lendo a História da Arte (lendoahistoriadaarte.com)

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