Minha visão é psicodélica e afronta o que quer condicioná-la

Paula Amparo
Cura Crônica
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3 min readJul 6, 2019

Escolho pintar as unhas com um esmalte chamado azulcrination que comprei nas Lojas Americanas e peço para Vera, a manicure, incrementar com purpurina prata e verde. É sexta e estou sedenta por presepada. Vera é Lula Livre como eu e é mais mal humorada e sem paciência com um perfil específico de clientes, aqueles vocês sabem quais. Vera me ensina algo, enquanto expulsa uma você sabe quem de perto de nós, falando alto que estudo não tem nada a ver com saber falar ou não, ser ético ou não. Vera está indignada com os comentários moralistas que atravessam a nossa tarde: “pode jogar futebol, mas nada de correr atrás de menininha como o Neymar, com essa idade tem é que estudar”, uma senhora fala para o seu neto que está cortando o cabelo. Vera é genial, Vera é lúcida, Vera se posiciona o tempo inteiro: “Então ele deve é correr atrás de menininho”, Vera rebate.

“Menina, o problema é que as pessoas querem 8 ou 88”, ela me olha bem nos olhos, assim que você sabe quem saiu de perto de nós.

“8 ou 80, Vera?”, pergunto.

“Não, 8 ou 88. Elas querem uma coisa, pronto, deu errado, pronto, elas vão insistir e escolher 88 porque elas não querem dar o braço a torcer. Elas vão dizer que estão certas e continuar achando que estão certas, mesmo sabendo que o tempo inteiro só estão fazendo tudo igual. Elas querem no máximo ver a coisa dobrada”, ela responde.

Estou com a galáxia nos dedos das mãos e dos pés. Eu me divirto com as minhas roupas, meus sapatos e a minha nova bomber verde. Adolescente, o verde era a minha cor preferida. No meu ensino médio não precisávamos usar uniforme e eu geralmente usava verde. Eu nunca esqueci, um professor de química me chamando de clorofila para que eu acordasse. Eu estava encostada na janela, um estado de fotossíntese, mais interessante do que qualquer aula. Eu lembro de gostar de sentar perto da janela nos sábados de manhã para não precisar ficar olhando para o quadro negro por uma hora e meia, e às vezes, meu corpo adolescente, mil vezes mais indisciplinado que agora, me enchia de sono. Demorei para aceitar que eu precisava chegar no horário nos lugares, talvez o ritmo dos blocos de carnaval tenham me ajudado mais nesse sentido do que a urgência das instituições, mas eu aprendi. Agora passo despercebida. Me encho de café e encaro qualquer coisa — coragem, coragem. Eu sinto saudade dos meus 21 anos que foi o início de entender tudo isso. Eu ainda não tomava tanto café. A quantidade de café foi proporcional ao consumo de bebidas alcoólicas. Os 22 foram a melhor idade do mundo: lição feita e lição ignorada. Era 2014, o ano do 7x1. O verniz da cidade não se sustenta mais e eu sigo com a galáxia nos dedos das mãos e dos pés.

Fevereiro, 2014.

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