Banal

Movimentos de ruptura com o passado e conflitos geracionais são o cerne de Banal, curta-metragem de Bruna Pavesi

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Banal, filme de Bruna Pavesi

Durante as décadas de 1940 a 1960, especialmente após o término da Segunda Guerra Mundial, havia a necessidade de reconstruir o que sobrou do mundo, em termos patrimoniais e populacionais. Portanto, uma das características marcantes desse período foi o aumento significativo das taxas de natalidade, o “baby boom”. Para além disso, as coisas foram devidamente refeitas, dando a quem cresceu no período a sensação de que qualquer coisa seria possível através do trabalho.

Curiosamente, essa geração tão apegada à ideia de que basta se esforçar e você pode conseguir tudo, deu a luz aos hippies, que pregavam a liberdade, o desapego material e não estavam tão interessados assim em continuar o “baby boom”, mas antes desejavam aproveitar a vida, a (contra)cultura e as recentes conquistas da Revolução Sexual.

Logo, embora seja comum pensar que a História, seja em um plano coletivo ou não, se constrói com continuidade, na verdade, ela é marcada por movimentos de ruptura. Tentativas de rejeitar o passado e ser completamente diferente. Porém, de várias formas distintas, sendo obrigado a conviver com esse passado, a tentar entendê-lo. Esses movimentos, talvez, sejam o cerne de Banal, curta-metragem dirigido por Bruna Pavesi.

Narrado em primeira pessoa, construído através de vídeos domésticos e falando sobre a infância da diretora, o filme nos apresenta a três gerações de mulheres: a Oma, avó de Bruna, sua mãe e a própria diretora. Todas elas, independente de suas individualidades, frutos do seu próprio tempo. Assim, enquanto a Oma surge como uma figura zelosa, cuja vida foi dedicada à família; a mãe é apresentada enquanto alguém que não queria ter filhos por acreditar que isso limitaria a sua liberdade; e Bruna, por sua vez, é mostrada enquanto uma criança comum, que faz coisas comuns, exceto pela dificuldade de comunicação, demonstrada através de relatos como o “cabelo na garganta”.

Essa dificuldade de comunicação, aliás, é outro ponto em que Banal ultrapassa a esfera privada e fala sobre o todo. Sobre os cortes geracionais. Enquanto a geração de Oma cresceu acreditando no trabalho, mas não sendo tão verbal; a da mãe acreditava na liberdade, colocando-a no centro de suas questões de forma explícita; e a de Bruna acreditava nas possibilidades, nem sempre fáceis de colocar em palavras.

Embora esse choque entre as três gerações de mulheres seja gritante, ele nunca é expresso verbalmente em Banal, o que é um acerto da diretora. Cinema é, afinal, imagem e elas, por sua vez, são eficientes o bastante para revelar o que é necessário, deixando a quem assiste a tarefa de preencher os silêncios — outro tema bastante caro à diretora e o ponto de partida para a elaboração do roteiro do curta.

Então, embora alguns diálogos de Bruna Pavesi com a sua mãe sejam referenciados pela narração, eles funcionam mais como ponto de atrito com o que foi afirmado por outras pessoas, revelando essa dificuldade de comunicação e evidenciando os motivos pelos quais Banal nasceu do silêncio.

Afinal, quando as palavras parecem perder a sua função comunicativa, chocando-se contra barreiras temporais que não podem ser ultrapassadas por discursos dissonantes, resta como via alternativa calar. E, como diretora, Bruna faz isso muito bem, dando às imagens ainda mais peso e significados quase irônicos em algumas ocasiões.

Portanto, embora seja dito no último ato de Banal que, talvez, o filme não interesse para ninguém além da própria Bruna, à medida em que a sua infância serve para revelar tanto sobre conflitos geracionais e a dificuldade de ultrapassa-los, ele passa a interessar para todos que já tiveram a impressão de gritar no vácuo enquanto tentavam se comunicar com alguém.

Assim, o curta-metragem contraria o próprio título, tornando-se algo que não é mais (só) sobre a família de Bruna Pavesi, mas sim universal.

Banal
Direção: Bruna Pavesi
Ano: 2017

Assista ao filme aqui.

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