Saúde mental: números mostram aumento de ansiedade e depressão nos brasileiros durante a pandemia

A instabilidade do momento e a nova rotina implantada são respostas para o agravamento dos transtornos na população

Gabriela Araujo
Dados e Jornalismo
Published in
5 min readApr 13, 2021

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No Brasil, em que 80% da população brasileira se tornou mais ansiosa na pandemia, a nova realidade com distanciamento social, uso de máscara, videoconferências e o home office, foram claros fatores estimulantes para esses dados. Além do constante medo por conta do Coronavírus.

Nathalia Matola, médica e especialista em medicina de família e comunidade, trabalha em uma clínica da família do SUS em Petrópolis, e resolveu sair da casa dos sogros com o marido logo nos primeiros momentos da pandemia: “Eu não me sentiria confortável em ser a causadora em transmitir isso para eles”. Os cinco meses que viriam em um apartamento alugado seriam desafiadores, fazendo com que a médica voltasse ao acompanhamento psicológico para ansiedade.

Drª Nathalia Matola em sua rotina de trabalho em uma clínica do SUS de Petrópolis

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), em julho de 2020, o Brasil se tornou o país com maior taxa de pessoas ansiosas no mundo, afetando quase 10% da população nacional, Nathalia foi uma delas. Além de ter que reaprender a viver com os novos costumes, lidou diretamente com pacientes infectados e suas dúvidas.

Graças ao teleatendimento implantado em Petrópolis, Drª Matola pôde voltar à casa dos sogros com maior segurança, ajudando no seu próprio bem-estar. Com o acesso virtual, não só em casos de covid, o fluxo de pessoas na clínica diminuiu, assim como o risco de contágio. Mesmo assim, a médica faz o uso de máscara até dentro de casa e segue pensando no próximo: “Os médicos de família são os que mais sofrem psicologicamente, pois a gente tem um vínculo enorme com a família. Então, além do olhar físico, a gente entende o contexto sentimental. Devido ao Covid-19, isso só aumentou. Muitos pacientes tiveram picos de estresse, e passaram a se sentir mal. Uma pressão alta, um batimento diferente, mas que quando conversamos com eles, entendemos que foi por uma perda próxima.”

Para a psicóloga e psicanalista, Carol Saint-Martin, o mundo não estava preparado para desacelerar, e o brasileiro menos ainda: “O brasileiro sente um pouco mais que os outros países porque somos pessoas de contato, de toque, de estar com outras pessoas o tempo todo. Todos nós sentimos isso na pele, afetando um pouquinho cada um.”

A psicóloga Carol também precisou se adequar ao online

Carol, formada há 12 anos, teve sua rotina de trabalho totalmente alterada, passando a atender seus pacientes de forma online. Percebeu neles uma sensação de tristeza muito grande, onde alguns chegaram a desenvolver uma possível depressão. Segundo a Universidade de São Paulo (USP), o país também foi líder no ranking mundial de casos de depressão. “Eu recebo muitos pacientes já prescritos que não estão vendo resultado. Nem sempre eles têm o sintoma da doença, mas já possuem essa receita. Mais uma vez, a tristeza não é sinônimo de depressão. Ainda mais atualmente, que a morte passou a conviver com o ser humano, a tristeza é uma consequência.”

Observa-se que a população mais jovem se cobra constantemente atrás de resultados imediatos e felicidade momentânea. Com a chegada do Coronavírus, assim citado pela Carol, o ser humano passou a conviver com a morte de perto, e, inevitavelmente, ficou mais triste. Muitas das vezes, até aumentando o consumo de remédios para se sentir melhor. “O brasileiro especificamente já faz o uso abusivo de farmacológico. E acredito que tem a ver até com o jeito que lidamos com tudo, por essa grande vontade de sentir as coisas”, comenta a psicóloga.

Se para a médica de família, Drª Nathalia, os riscos aumentaram com a pandemia, “somos a primeira porta de entrada do SUS, portanto, nosso trabalho está sendo muito afetado”, outros profissionais também se sentem sem saída. Uma pesquisa do Linkedin ouviu mais de 2 mil empregados e concluiu que o trabalho remoto deixou 62% dessas pessoas mais ansiosas e estressadas.

Ao mesmo tempo que o home office possibilitou a continuação do trabalho de muitos brasileiros, deixou de ser um sonho para se tornar pesadelo. Além do aumento da demanda, as tarefas domésticas passaram a ser rotineiras para aqueles que eram acostumados a ficar na rua, escritório ou empresa. Para a psicóloga Carol, as mulheres são as maiores afetadas: “A mulher agora, além de ser dona de casa e mãe, passou a trabalhar em casa e ser professora dos filhos que estão com aula online. Esse esgotamento da mulher foi muito maior.”. Carol está certa, já que segundo o IBOPE, foi comprovado que a figura feminina foi a mais atingida durante a pandemia.

É fato que a ansiedade atingiu a todos, pelo menos em um breve momento. O assunto se tornou mais comum até na TV aberta, com comerciais sobre ansiedade e depressão no momento pandêmico. É possível baixar aplicativos de auxílio psicológico, ligar para números do Governo de prevenção ao suicídio e até mesmo usar os bons gatilhos das redes sociais para ajuda mental. Com previsão para lançamento ainda esse ano, o Ministério da Saúde está criando um canal para atendimento direto de pessoas com transtornos mentais, o Disque 196.

A Drª Saint-Martin deixa um recado: “Minha dica é uma só: O mundo precisa desacelerar. A gente está vivendo tudo com muita urgência, e às vezes o corpo não aguenta. Precisamos deixar de viver tudo correndo.”. E ainda ressalta: “Tenham atenção às doenças emocionais, porque elas matam, e originam outras doenças, que matam mais ainda. Tenham calma. Vamos salvar a nossa saúde mental porque ela está cada vez mais perdida.”

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