Francisco Éboli
Das Teorias
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5 min readApr 18, 2016

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A Teoria Crítica: dilemas e contribuições em relação à mídia e à comunicação

ĶHANKE, Michael

Por Guilherme Maschke e Francisco Eboli

A denominada escola de Frankfurt envolve autores e ideias com relação institucional ou envolvimento editorial com Instituto de Pesquisa Social de Frankfurt. Autores como Theodor Adorno, Max Horkheimer, Erich Fromm, Herbert Marcuse, Walter Benjamin e Jürgen Habermas, constam como membros. Conhecidos no contexto da comunicação como expoentes de uma teoria crítica em relação meios de comunicação de massa como TV, rádio e cinema. São conhecidos principalmente pela obra A dialética do esclarecimento de Theodor Adorno e Max Horkeheimer, obra na qual problematizam a concepção de esclarecimento (aufklärung), apontando seu uso — tanto nas ciências exatas como nas ciências sociais — a propósito de ideologias fascistas e para o desenvolvimento da sociedade de consumo capitalista. Trata-se de uma crítica radical da modernidade, botando em questão um de seus pilares, qual seja, a concepção de esclarecimento que ronda o homem desde ao menos os princípios da renascença. A nossa relação com a natureza, com os outros, com a sociedade perpassa pelos princípios do homem esclarecido. Os autores citam Francis Bacon para elucidar a relação homem-natureza. Para o filósofo inglês cabe ao homem dominar e controlar a natureza — e até tortura-la se necessários — para tirar desta o necessário a nós. De mesma forma, a filosofia do esclarecimento de Kant é aproximada da figura controversa de Sade. O sujeito esclarecido autônomo, com capacidades plenas de agir através unicamente de sua razão individual, “sem a direção de outrem” nos leva ao sujeito proposto por Sade em suas peças libertinas. Onde o prazer individual está acima de tudo, do outro, do social e da natureza.

Neste livro é desenvolvido o conceito de indústria cultural, através da junção dos termos Kultur e Industrie. Atualmente é comum falarmos de indústria sonora, indústria cinematográfica e indústria da cultura. Todavia, na época a utilização destes termos em relação gerou um estranhamento. A cultura era entendida como o mundo da arte elevada, da apreciação individual, concentrada e atenta de livros, quadros e músicas. Já a indústria, como algo bruto, sistemático, degradante social e fisicamente. A crítica dos autores reside na constituição — através das técnicas de reprodução da arte em geral — de uma indústria da cultura, onde arte, música, grandes livros e pensadores, seriam nada mais do que produtos.

Em aula foi debatido a defesa dos autores desta cultura erudita europeia (por assim dizer…) em relação a “outras” culturas, da música popular, do cinema, do rádio, etc. As problemáticas trazidas pelos autores dizem, a grosso modo, que as mídias idiotizam a população manipulando-a para ouvir e fazer o que elas querem. Muitas críticas foram feitas aos autores devido sua falta de metodologia empírica em suas análises, ao elitismo cultural e as diferenças entre a posição de Adorno com relação a Walter Benjamin. Este último, parecendo estar mais preocupado em entender os novos meios e suas potencialidades, do que em fazer uma crítica radical.

Problematizou-se o que Adorno diria sobre estilos recentes de música, tendo em vista seu texto de crítica ao jazz americano. Questionou-se até que ponto a mídia produz de fato uma imposição de determinados bens culturais e como (se é que ocorre) este fenômeno está sendo abalado através do uso da internet, onde temos acesso ao que queremos. A autonomia, por assim dizer, do receptor é problematizada. Poderíamos pensar atualmente em uma recepção passiva das mídias?

É justamente na confrontação a esta ideia de passividade do receptor que reside a crítica da segunda geração da Escola de Frankfurt, especialmente de Habermas, aos autores da primeira geração. Estes tinham em comum o conceito de razão instrumental, um estado em que os processos racionais são plenamente operacionalizados. Habermas amplia este conceito para uma ideia de racionalidade comunicativa, que surge dos processos de interpretação dos próprios indivíduos, o que faz mais jus à imagem de receptor ativo da mídia.

Também é preciso lembrar que a diferença entre as gerações envolve uma questão paradigmática, pois enquanto Adorno e seus colegas focavam na ação teleológica (resultado final), Habermas estava mais preocupado com a ação comunicativa (processo em si). A segunda geração não propõe eliminar a razão instrumental e a ação teleológica, mas relativizar esta última através de um modelo de interlocução. Ou seja, ela reconhece a crítica da primeira geração em relação ao poder da Indústria Cultural, mas ao invés da ideia de um receptor objeto, prefere trabalhar seu papel ativo, baseado nas suas atividades interpretativas.

As pesquisas desenvolvidas por Habermas indicavam uma ambivalência do potencial autoritário e do potencial emancipador dos espaços públicos midiáticos, que hierarquizam e abrem ao mesmo tempo o horizonte dos possíveis processos comunicativos. Vale a pena destacar as divergências constatadas nesses estudos em relação aos pressupostos da primeira geração:

- as operadoras de programas enfrentam interesses concorrentes, não podendo integrar, sem rupturas, aspectos econômicos, políticos ou ideológicos, profissionais e estéticos.

- a mídia de massa normalmente não pode se subtrair às obrigações que surgem do seu dever jornalístico sem incorrer em conflitos.

- os programas, de maneira alguma, correspondem sempre ou mesmo predominantemente aos padrões da cultura de massa, podendo até apresentar mensagens críticas apesar de adotarem as formas triviais de divertimento popular.

- as mensagens ideológicas não alcançam seus destinatários porque o significado intencionado é invertido sob as condições de recepção de um determinado pano de fundo subcultural.

- as idiossincrasias da práxis comunicativa do dia-a-dia resistem a uma intervenção manipuladora imediata.

- a evolução técnica da mídia eletrônica não é necessariamente direcionada a uma centralização das redes, mesmo se o pluralismo do vídeo e a “democracia televisiva” não passam, por enquanto, de visões “anarquistas”.

Outro ponto importante em relação às pesquisas de Habermas se refere às discussões em torno da ideia de esfera pública como espaço de debate e formação da opinião pública, da busca pelo consenso. Após seu desaparecimento durante a Idade Média, Habermas vê o nascimento de uma esfera pública burguesa diretamente ligado ao surgimento da imprensa de massa no século 18. Ela representaria o fim do monopólio do conhecimento por instâncias religiosas e universitárias e uma alteração nas relações de poder ao possibilitar, por exemplo, que uma decisão política, publicada em uma folha, pudesse deixar o ambiente fechado das decisões políticas e ganhar a paisagem das ruas.

Para o autor, esse momento do jornal como meio político começou a ver seu fim ainda no início do século 19, quando os jornais deixaram progressivamente de ser instrumentos políticos e se articularam como empresas de comunicação. O controle político perde espaço para o controle econômico. Hoje existe todo uma discussão em torno da ideia da internet como um ambiente de debates, numa espécie de Esfera Pública Virtual.

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