Convergente! Divergente! Insurgente!

Aproximações e reflexões com base nos escritos de Henry Jenkins

Fernanda Locatelli
Das Teorias
5 min readMar 31, 2016

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Por Christian Gonzatti, Fernanda Locatelli e Kélliana Braghini

Sad Affleck, Dilma Bolada, Beto é do Mal, Travolta confuso. O que esses, e muitos outros “memes” tem em comum é a produção popular em uma cultura participativa, na sociedade em vias de convergência midiática e com propagabilidade de conteúdo de uma maneira surpreendente.

Nessa discussão, Jenkins surge como o personagem amado ou odiado. Visto como um apaixonado por alguns e como um crítico com olhar otimista por outros. O fato é que é impossível pensar convergência sem lembrar de Jenkins e de seus apontamentos sobre o conceito, que ele define, em seu glossário, como “mudanças tecnológicas, industriais, culturais e sociais no modo como as mídias circulam em nossa cultura”.

Convergência ou divergência? O ponto é que o debate é constante e sem fim. O livro “Cultura da convergência” é de 2009, “Cultura da Conexão, de 2014. E olha que Jenkis chamou até dois amigos para ajudar na tarefa de explicar, mesmo que de forma não definitiva, os processos que estão acontecendo em nosso momento histórico-social. E não são só eles que buscam essas explicações. São inúmeros os artigos, TCs, dissertações e teses que também propõem este movimento. Sabe a frase “aceita que dói menos? Talvez ela seja uma boa metáfora para apontar a necessidade de aceitar que o debate é interminável, que as explicações são provisórias mesmo e que o cenário pode complicar cada vez mais. Ou complexificar?

A ruptura das barreiras entre produtor e consumidor é apontada como uma via de mão dupla. Por um lado, o consumidor ganha mais autonomia, mais liberdade para se expressar e construir. Por outro, o acesso, tanto às habilidades técnicas quanto sociais para essa construção é limitada. Se de alguma forma a indústria “perde o controle” sobre seus bens culturais, por outro ganha comunidades de fãs dispostos a “matar ou morrer” por seu seriado favorito.

Afinal, material propagado é material refeito. E aqui não se trata apenas da remixagem, do gif, da montagem, do vídeo, da manipulação do conteúdo. Mas trata-se de algo que vai além, está no refazer cotidiano próprio da ação humana, está na descontextualização, na (re)contextualização da conversa diária. Ou talvez mesmo na ação de pensar sobre o conteúdo, de imaginar novas formas? Mas é fato que esse refazer, esse movimento de apropriação comunica algo do próprio sujeito. Observe a linha do tempo do seu Facebook. O que você vê é um diálogo, a interação entre os indivíduos? Ou vê mais conversas pessoais projetas em um ambiente coletivo? O que você vê? O que você sente?

Não se pretende aqui dar qualquer resposta. Até porque isso seria bastante arriscado. Mas podemos questionar. E os impactos disso tudo? Bom, apenas se sabe que são muitos. Para o bem e para o mal. Afinal, o que é bem ou mal senão pontos de vista? Em seu quarto, um estudante cria uma montagem do terrorista Osama Bin Laden ao lado do personagem Beto, da Vila Sésamo. Do outro lado do mundo, um editor busca imagens do terrorista na internet. Qual é a relação? A questão é que o editor, em Bangladesh, encontrou a montagem de Bin Laden com Beto e, momentos depois, cartazes, camisetas e outros materiais divulgavam o personagem ao lado do terrorista. “Beto é do Mal” se propagou é um exemplo da apropriação popular e de como ela pode sair do controle, indo muito além do que o previsto por seu desenvolvedor. O fenômeno Susan Boyle é outro exemplo de como um vídeo, propagado na internet, pode fazer mais sucesso do que o próprio programa de onde foi recortado.

Exemplos para embasar as ideias de Jenkins (e amigos), são vários, mas talvez um dos pontos que mais aponta para uma visão otimista é o uso do conceito de cultura participativa (Pierre Lévy), que aponta para a construção coletiva. Comunidades de indivíduos produzindo, construindo e (re)construindo juntos. Associando os recursos e unindo as habilidades individuais em prol de um bem comum. E acontece! Em algum nível, de alguma forma, com suas (muitas) limitações. Afinal, a participação não é plena, embora exista e seja evidente. Os desejos da indústria e dos consumidores (mesmo com barreiras desfeitas), nunca se alinharão perfeitamente. Sempre existirão os movimentos de cooperação, competição e conflito (Recuero). Somos humanos, afinal.

Mas é preciso refletir sobre a convergência, sobre as transformações tecnológicas, culturais e sociais. A internet, sendo meio, meios, ambiente, realidade ou qual for conceito adotado, está promovendo mudanças, sim. Mudanças na forma de consumir um filme, série ou novela. Mudanças nas conversas, mediadas ou não. Mudanças no debate político. No ativismo, no entretenimento, no questionamento ou até mesmo na alienação ou isolamento. Aliás, daí surge questionamento como “As novas tecnologias podem potencializar a participação? Ou podem gerar isolamento? Ao que parece, se a pergunta é “pode”, a resposta é “pode”. Mas talvez seja necessário reformular esse questionamento para “Como a tecnologia e os espaços de interação virtuais podem gerar participação e/ou isolamento? ”.

As discussões são infinitas e complexas demais para que se possa buscar algo concreto, uma resposta ou um fechamento. Vamos refletindo/expandindo/refletindo! E aí vem à tona os mais diversos pontos para se pensar: Qual é papel da mídia tradicional? Como se formam os universos, como Pattermore? Quais são os interesses corporativos? E os individuais? Como ficam os desejos de alteridade e pertencimento? Como se dão as apropriações dos fãs (fanfics) e qual deve ser o limite (se há)? Como se dão apropriações das marcas, como no caso da Fabíola com a Avon? Podemos usar o conceito de marketing “viral”? Os velhos meios de comunicação vão morrer? Ou convergir com os novos? Quais são os aspectos sociais, psicológicos, culturais, políticos? E daí segue ao infinito e além. Ao menos é que nos parece, agora. Mas amanhã, quem sabe?

Ah,e os atores? Bom, eles e nós, todos atores sociais, buscamos seguir o fluxo da circulação, acompanhar ou entender, participar ou “ser participado” em um momento onde nada se perde, tudo se transforma. E se transborda. Para fora da caixa, da tela, da mente. Para fora, espera-se, da passividade. Para além, espera-se, do superficial. Para dentro, talvez, de algo mais ativo, vivo. Propagável, imensurável, inconstante, intrigante. Mas que gere valor simbólico, identificação, empatia, paz e amor. Porque o cenário é de instabilidade, incertezas. Mas a esperança, dizem, é a última que morre.

E o que fazer? Bom, talvez seguir o caminho, no fluxo! Dando mais valor para as perguntas do que para as respostas. Aprendendo a fazer as perguntas certas. Para quem? Talvez para si mesmo. Para que? Em busca de uma nova cultura, uma cultura da reflexão! Será? Ninguém está dizendo que é fácil ou que não seja utópico. Mas é uma possibilidade? Não se espera a construção de um muro. Mas sim a colocação de um tijolo, o mais perfeitamente possível. Cada um de nós, assumindo sua responsabilidade, dia após dia! E assim, quem sabe, um dia teremos um lindo muro. Juntos!

Contamos com a inteligência coletiva para que esse texto seja apenas um ponto de partida. Continue a (re)construção dele com a gente nos comentários!

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Fernanda Locatelli
Das Teorias

Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da Unisinos