Ser mulher, negra e analista de dados nas eleições de 2020

Como discutir política com dados? Essa foi minha pergunta ao me deparar com os arquivos do TSE sobre as eleições de 2020.

Samantha Reis
data_labe
3 min readDec 22, 2020

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Como sempre, o pensamento científico que obtive enquanto Física me fez desbravar os dados e me deliciar nas descobertas desse grande experimento. Em alguns outros momentos nessa minha construção como cientista de dados estive em contato com dados eleitorais, mas nada tão profundo, sempre em experimentos pequenos ou em workshops e oficinas. Para colaborar no especial de eleições do data_labe em parceria com o Alma Preta, o trabalho com dados exigia apuro narrativo. O desafio era revelar histórias invisíveis que talvez só os dados pudessem contar. É aqui que começo a refletir mais profundamente sobre o meu papel como mulher negra no cenário político que temos no Brasil.

Leia no site do data_labe as três reportagens do especial eleições 2020 em parceria com o Alma Preta

Quando falamos de política aqui em casa alguém sempre solta o bordão: ‘política não se discute’. Pois bem: as mais de 100 mil candidaturas das regiões Sudeste e Nordeste de 2016 demonstram o quanto essa política não discutida é racista, misógina, homofóbica. Navegando em muitas linhas de códigos e debates com minha equipe de dados maravilhosa (oi, polinho & Estephanny ❤) descobrimos, por exemplo, que Água Fria, na Bahia, teve 100% dos eleitos negros e que representatividade só faz diferença quando a discussão vai para além da academia e do twitter. Descobrimos também que, apesar das mulheres negras serem 30 % da população do Rio de Janeiro, nem 10% estão na Câmara Municipal, e que mesmo na primeira eleição após o assassinato de Marielle Franco, o número de mulheres negras e periféricas eleitas no município ainda é extremamente baixa.

Foi nesses turbilhão de informações, que já vem sendo explanado pelo povo preto, que eu, uma mulher preta, entendi a minha importância nesta análise - não só na análise dos dados, mas, principalmente, no meu posicionamento político, afinal analisar esses dados para mim foi um ato político.

A parte boa de experimentar é que podemos colocar em prática os nossos saberes, enfrentar desafios e dificuldades sem medo. Tive que aprender a pensar, discutir e visualizar a melhor forma de demonstrar como os dados estavam se comportando naquelas centenas de linhas de códigos recheadas de matemática para aqueles que não estão familiarizado com esse mundo. E foi com essa dificuldade que comecei a pesquisar, estudar, aprender a comunicar melhor as descobertas nas análises e que ficou como exercício contínuo da caminhada como cientista de dados.

Nesse misto de alegria, ansiedade, reflexão e aprendizado afirmo que esse trabalho foi um dos meus melhores. Acreditem, é uma loucura deliciosa misturar programação, matemática e pensamento científico. Ainda mais com a equipe maravilhosa de dados do data_labe da qual tenho o prazer de compor e em parceria com o bonde sinistro de jornalismo, formado por duas mulheres negra que me enchem de orgulho.

Quer saber mais como foi todo esse processo de análise? Os códigos? Você encontra tudo aqui no meu GitHub. ;)

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Samantha Reis
data_labe

Acadêmica em Física Médica e apaixonada por programação. Andando pelos caminhos da Ciência de Dados.