Realidade como foco da narrativa
Na primeira reunião do data_labe, em uma roda de conversa entre facilitadores e novos bolsistas, cada um dos selecionados escolheu uma palavra que definisse o projeto que irão desenvolver no decorrer dos próximos meses. A minha palavra foi: Realidade.
Realidade, porque pensar a partir de dados de fontes públicas é pensar na construção de narrativas sobre alguns contextos reais e a maneira pelas quais eles são representados.
Eu, como morador da Baixada Fluminense e estudante da Maré, a partir do uso de dados, posso, por exemplo, desconstruir paradigmas fundados em preconceitos históricos e atribuir autoridade a uma narrativa que já vivencio. Dados auxiliam e determinam políticas públicas — quer ferramenta melhor para traduzir uma realidade que a gente vive e conhece para o poder público?
Não apenas na esfera pública, mas também na mídia tradicional, a questão sobre realidade e representatividade entra em foco. É preciso construir uma nova narrativa para as periferias.
Numa pesquisa rápida no Google, na sessão de notícias, quando pesquiso o termo “Baixada Fluminense”, das primeiras dez notícias encontradas, oito estão relacionadas a tópicos como pobreza e violência.
Sabe-se que a Baixada Fluminense possui uma das maiores taxas de homicídio da região — números comprovados pelos dados do Instituto de Segurança Pública do Rio de Janeiro (ISP — RJ). O problema está na abordagem naturalizada e banalizada da violência pela mídia e da opção editorial em privilegiar sempre esses casos. É a exploração da pobreza como pautas do noticiário. Prevalece, para a grande mídia e para seus milhões de espectadores, a ideia de que na periferia só é notícia aquilo que serve para reafirmar esses territórios como “não-cidade”.
Não quero dizer que basta mostrar o “lado bom” das periferias, mas de representar a realidade de maneira que o morador da periferia se reconheça também nos noticiários.
Essas afirmação nos engendra questionamentos: como podemos fazer para expandir o foco dos editorias da mídia tradicional? Como podemos contribuir individual e coletivamente no processo de construção de narrativas que fujam do sensacionalismo? Como dar voz ao morador da periferia? E como fazer com que ele seja ouvido e representado?
Alguns grupos de comunicação comunitária e mídia livre já desenvolvem trabalhos que buscam responder a esses questionamentos — como o Voz da Comunidade e o Site da Baixada. Nesse sentido, o data_labe (e minha participação aqui) surge como uma aliado na disputa pela construção de narrativas mais diversas sobre as realidades, contribuindo para o processo de emponderamento dos sujeitos das periferias através do acesso, difusão e produção de informações. É a periferia produzindo sua própria caixa de som pra dar volume e argumento a sua voz.