Dissecando o sucesso financeiro do Paulistão 2018

Augusto Anteghini Oazi
De Cabeça
Published in
6 min readApr 24, 2018

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À primeira vista, os números de público pagante e a renda bruta do Paulistão 2018 podem indicar um sucesso financeiro do campeonato organizado pela Federação Paulista de Futebol (FPF). Com uma média de 9.071 pagantes por jogo e uma renda bruta com bilheteria de 48,4 milhões de reais o Paulistão 2018 se destaca ainda mais quando comparado aos outros principais campeonatos estaduais do país (Carioca, Mineiro e Gaúcho). Parece claro que a FPF acertou a mão e que temos um exemplo a ser seguido na busca pela salvação dos tradicionais campeonatos estaduais.

Comparação entre os principais Campeonatos Estaduais do Brasil

No entanto, essa análise superficial está longe de mostrar a realidade do Campeonato Paulista, que depende excessivamente dos quatro grandes times do estado para alcançar esses valores.

A “grande-dependência” do Paulistão

É comum vermos times dependentes de um jogador ou outro. Analisando o Paulistão 2018, os números mostram que uma Federação também pode ser dependente de alguns poucos times em seu principal campeonato.

O primeiro número a mostrar essa grande-dependência da FPF é a relação inversamente proporcional entre a quantidade de jogos sem envolver os grandes com a renda e público que essas partidas geram. Mais da metade dos jogos do Paulistão envolve dois times pequenos, mas essa maioria de jogos representa apenas 15% do público que foi aos estádio em toda a fase de grupos do campeonato. Analisando a renda bruta, a situação fica ainda pior, sendo que os jogos entre pequenos representam apenas 5% da renda bruta da fase de grupos.

Apesar de serem maioria, os jogos entre pequenos trazem pouco público e pouca renda

Se colocássemos os jogos da fase final na conta, os números ficam ainda mais preocupantes, com os clássicos representando 50% da renda bruta total do campeonato e os jogos entre pequenos apenas 3,7%.

Essa força dos grandes também é vista diretamente no público e renda dos jogos onde os times pequenos foram mandantes na fase de grupos. Foram 18 jogos onde um time pequeno recebeu um grande contra 54 jogos onde o time pequeno teve como visitante outro pequeno. Essa parcela de 25% dos jogos contra grandes representou 54,5% do público que os pequenos tiveram e incríveis 80% da renda deles. Nos gráficos abaixo vemos a representação de cada time grande no público e renda de jogos da fase de grupos que tiveram como mandantes os times pequenos.

Representação dos times grandes no público e renda bruta total de jogos que tiveram os times pequenos como mandantes

FPF e o alto poder de negociação de seus ‘clientes’

Se para os times pequenos, já seria um problema qualquer movimentação dos grandes que desvalorizasse o Campeonato Paulista, para a FPF a situação seria ainda pior. A Federação arrecada 7% da renda bruta com bilheteria dos quatro times grandes e 6% dos times pequenos. Só no Campeonato Paulista de 2018, essa taxa rendeu 3,3 milhões de reais aos seus cofres.

Participação dos times na receita da FPF com a taxa de bilheteria

Esse valor poderia trazer um sorriso de orelha à orelha para os diretores da Federação, mas 82,5% desses 3,3 milhões vêm dos quatro clubes grandes, sendo que só Palmeiras e Corinthians já representam 67,2%. Além disso, os quatro clubes grandes são um dos principais motivos para patrocinadores vincularem sua marca aos campeonatos da FPF.

A FPF na parede

Os números mostrados deixam Palmeiras, Corinthians, São Paulo e Santos muito confortáveis para exigir contrapartidas melhores da Federação na disputa do Campeonato Paulista. Os quatro grandes são a razão do estadual de São Paulo ainda ser relevante econômicamente e em troca eles recebem péssimos gramados nos jogos pelo interior, têm seus principais jogadores lesionados, arbitragens tendenciosas que desvalorizam o produto e um calendário que coloca os únicos jogos que importam na mesma época de jogos pela Libertadores ou datas FIFA.

Os times pequenos também deveriam estar preocupados em encontrar uma nova fórmula de disputa que valorizasse as rivalidades regionais para que seus orçamentos não dependam tanto de um jogo contra um time grande. Não é sempre que você tem a sorte de receber Corinthians e Palmeiras no domingo, como teve o Botafogo na edição de 2018.

O Campeonato Paulista é o mais bem-sucedido entre os Estaduais, mas é preciso ficar atento. Ao invés de ajudar os times pequenos, o que está se criando é uma distância ainda maior entre eles e os times grandes. Além disso, não há garantia de que o Campeonato será rentável para eles. A FPF precisa antever as possíveis movimentações dos times grandes e se movimentar para criar um campeonato mais interessante para todos antes que seja tarde.

Extra

A representação dos jogos contra times grandes na renda e público de cada time pequeno

Botafogo

De 6 jogos em casa, 2 foram contra times grandes (Palmeiras e Corinthians).

Os 2 jogos contra times grandes representaram 75% do seu público no campeonato e 91% de sua renda bruta.

Bragantino

De 6 jogos em casa, 1 foi contra time grande (Palmeiras).

O jogo contra time grande representou 48% de seu público no campeonato e 81% de sua renda bruta.

Ferroviária

De 6 jogos em casa, 1 foi contra time grande (Santos).

O jogo contra time grande representou 26% de seu público no campeonato e 60% de sua renda bruta.

Ituano

De 6 jogos em casa, 2 foram contra times grandes (Palmeiras e São Paulo).

Os 2 jogos contra times grandes representaram 65% do seu público no campeonato e 82% de sua renda bruta.

Linense

De 6 jogos em casa, 2 foram contra times grandes (São Paulo e Santos).

Os 2 jogos contra times grandes representaram 52% do seu público no campeonato e 82% de sua renda bruta.

Mirassol

De 6 jogos em casa, 2 foram contra times grandes (Palmeiras e São Paulo).

Os 2 jogos contra times grandes representaram 64% do seu público no campeonato e 90% de sua renda bruta.

Novorizontino

De 6 jogos em casa, 2 foram contra times grandes (Santos e Corinthians).

Os 2 jogos contra times grandes representaram 59% do seu público no campeonato e 69% de sua renda bruta.

Ponte Preta

De 6 jogos em casa, 2 foram contra times grandes (Palmeiras e Santos).

Os 2 jogos contra times grandes representaram 29% do seu público no campeonato e 41% de sua renda bruta.

Ponte foi exceção. Por causa da invasão da torcida no último jogo do Brasileirão 2017, a Ponte não pode vender ingressos para torcida visitante.

Red Bull

De 6 jogos em casa, 1 foi contra time grande (Corinthians).

O jogo contra time grande representou 68% de seu público no campeonato e 87% de sua renda bruta.

Santo André

De 6 jogos em casa, 1 foi contra time grande (Corinthians).

O jogo contra time grande representou 44% de seu público no campeonato e 80% de sua renda bruta.

São Bento

De 6 jogos em casa, 1 foi contra time grande (São Paulo).

O jogo contra time grande representou 41% de seu público no campeonato e 61% de sua renda bruta.

São Caetano

De 6 jogos em casa, 1 foi contra time grande (Corinthians). Time até levou o jogo para o Pacaembu na esperança de atrair ainda mais a torcida visitante.

O jogo contra time grande representou 52% de seu público no campeonato e 80% de sua renda bruta.

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Augusto Anteghini Oazi
De Cabeça

Palmeirense e fanático por futebol. Engenheiro de Produção formado pela UFSCar Sorocaba. Nascido em São Paulo, mas lemense de coração.