Proclamação, justiça e louvor
Salmo Penitencial: Restaura em mim a alegria de tua salvação

¹Tem misericórdia de mim, ó Deus,
por causa do teu amor.
Por causa da tua grande compaixão,
apaga as manchas de minha rebeldia.
²Lava-me de toda a minha culpa,
purifica-me do meu pecado.
³Pois reconheço minha rebeldia;
meu pecado me persegue todo o tempo.
⁴Pequei contra ti, somente contra ti;
fiz o que é mau aos teus olhos.
Por isso, tens razão no que dizes,
e é justo teu julgamento contra mim.
⁵Pois sou pecador desde que nasci,
sim, desde que minha mãe me concebeu.
⁶Tu, porém, desejas a verdade no íntimo
e no coração me mostras a sabedoria.
⁷Purifica-me de minha impureza, e ficarei limpo;
lava-me, e ficarei mais branco que a neve.
⁸Devolve-me a alegria e a felicidade!
Tu me quebraste;
agora, permite que eu exulte outra vez.
⁹Não continues a olhar para meus pecados;
remove as manchas de minha culpa.
¹⁰Cria em mim, ó Deus, um coração puro;
renova dentro de mim um espírito firme.
¹¹Não me expulses de tua presença
e não retires de mim teu Santo Espírito.
¹²Restaura em mim a alegria de tua salvação
e torna-me disposto a te obedecer.
¹³Então ensinarei teus caminhos aos rebeldes,
e eles voltarão a ti.
¹⁴Perdoa-me por ter derramado sangue, ó Deus de minha salvação;
então, com alegria, anunciarei tua justiça.
¹⁵Abre meus lábios, Senhor,
para que minha boca te louve.
¹⁶Tu não desejas sacrifícios, do contrário eu os ofereceria;
também não queres holocaustos.
¹⁷O sacrifício que desejas é um espírito quebrantado;
não rejeitarás um coração humilde e arrependido.
¹⁸Olha com favor para Sião e ajuda-a;
reconstrói os muros de Jerusalém.
¹⁹Então te agradarás dos sacrifícios de justiça,
dos holocaustos e das ofertas queimadas;
e sobre teu altar novilhos voltarão a ser sacrificados.
Este Salmo pertence a um grupo de Salmos escritos no mesmo estilo literário, ao qual chamamos Salmo Penitencial. Trata-se de um lamento pessoal do salmista referente a uma circunstância específica. No Salmo 51 estamos diante de uma das mais profundas confissões de um pecador. Somente um coração tomado de arrependimento é capaz de expressar com tanta profundidade emocional e espiritual a dor causada pelo próprio pecado. Estamos diante de um coração dilacerado pela culpa e tomado de arrependimento.
O salmo traz em sua abertura a seguinte descrição
Ao regente do coral: salmo de Davi, sobre a ocasião em que o profeta Natã veio falar com Davi após adultério com Bate-Seba.
Estamos diante do salmo que Davi escreve logo após ser confrontado por Natã em relação ao caso que tivera com Bate-Seba. Quanto tempo depois ele escreveu este salmo? Não sabemos. O que se sabe é que ele é consequência do que pode ser lido em 2 Samuel capítulos 11 e 12 e recomendo que você faça a leitura destes dois breves capítulos. A Bíblia de Jerusalém, edição Católico-romana, traz o interessante subtítulo “Miserere”, tradução latina para “tem misericórdia”, verso que abre o salmo. A título de curiosidade, há uma bela peça clássica sobre o salmo 51, “Miserere mei, Deus”. Recomendo você ouvir. Vamos olhar para este salmo, que clama por misericórdia, e compreender cada uma de suas partes.
- Clamor: versos 1–6: todo clamor parte do reconhecimento de sua condição atual. É interessante notar, nos seis primeiros versos, que o salmista clama por misericórdia firmado não em seus méritos. O “homem segundo o coração de Deus”, no entendimento popular, teria todas as condições de pedir o que quisesse a Deus. Mas não é isso que ele faz. Ele busca ao Senhor sabendo que sua vida não é nada e que somente o amor e a grande compaixão de Deus são capazes de apagar as manchas de sua rebeldia. O reconhecimento do pecado vem com uma necessidade urgente de purificação.
- Necessidade: versos 7–11: purifica-me, lavam-me, remove as manchas. Expressões que se repetem ao longo do salmo e que mostram, principalmente neste trecho, como o salmista se sentia. Só se purifica o que é impuro, só se lava o que está sujo, só se remove manchas do que está manchado. Quando se trata do pecado, não há força humana capaz de fazê-lo e o salmista sabia disso: não me expulses de tua presença e não retires de mim teu Santo Espírito. A necessidade de purificação expressa uma vontade do salmista.
- Vontade: versos 12–15: restauração. O que o salmista deseja é ser restaurado, é viver novamente as bençãos de Deus em sua vida. Percebam, não é retornar ao estado anterior à revelação de seu pecado. É viver um novo momento, perdoado e restaurado, na presença de Deus. Esta restauração é na alegria da salvação de Deus, que produzirá como efeito a proclamação dos ensinamentos acerca de Deus aos rebeldes, o anúncio da justiça e o louvor a Deus. Uma vida restaurada é marcada pela proclamação, justiça e louvor. A vontade expressa do salmista está firmada numa verdade.
- Verdade: versos 16–17: Espírito quebrantado. Quebrantado é uma palavra usada muito pelos cristãos, principalmente depois da música do mesmo nome. Quebrantar significa quebrar algo, abater, arrasar. Um espírito quebrantado é um espírito arrasado, abatido. Como assim Deus quer um espírito abatido, quebrado, arrasado? Parece cruel, não? Sim! Pois, somente quem reconhece seu erro, sabe da necessidade de purificação, compreende que sua vontade deve ser a de Deus é que pode se achegar ao Senhor sabendo que nada é. Quem muito se acha, quem se coloca como o cristão de moral ilibada, o que se apresenta como “santo” diante dos outros, estes não possuem o espírito arrasado. Mas aquele que confessa seu pecado sabe que Deus não rejeitará um coração humilde e arrependido.
- Prólogo: versos 18–19: os versos finais parecem um tanto deslocados em relação ao restante do salmo. Percebam que durante todo o salmo se fala de arrependimento e mudança de atitude diante do Senhor. De repente aparecem Sião e Jerusalém, não citadas até então no salmo. Diria até que o verso 19 contradiz o verso 16. Isso tem uma explicação. Há uma grande possibilidade dos versos finais do Salmo 51 serem um acréscimo efetuado após o exílio, no período anterior a Neemias e Esdras e a reconstrução dos muros de Jerusalém. O clamor pela reconstrução dos muros se dá por compreenderem ser este uma necessidade para segurança que só seria possível de se executar com intervenção divina. Então devemos desconsiderar o prólogo do salmo 51? De forma nenhuma. Há uma explicação para essa inserção: o grave pecado de Davi encontrou perdão, o grave pecado de Israel também encontrará perdão. É como se os judeus do pós-exílio estivessem dizendo: “vejam, o homem segundo o coração de Deus encontrou perdão para seu pecado. Vejam como ele era pecador e como ficou após ser confrontado por Natã. Vamos nos arrepender!”
Como vimos, são tantas as lições a serem extraídas destes dezenove versículos que caberiam um estudo aprofundado sobre cada um deles. Quero destacar o versículo 10. Conhecido por muitos de nós, a oração do versículo 10 deve ser repetida diariamente: cria em mim, ó Deus, um coração puro; renova dentro de mim um espírito firme. A expressão usada pelo salmista para o verbo criar é a mesma, no hebraico, usada na narrativa da criação, o que nos demonstra a disposição do salmista a ser reduzido a nada, e a partir do nada, ter sua vida criada pura e inabalável diante de Deus. Todos somos alvos de impurezas e podemos ser abalados pela ação do pecado. Desejar a pureza e o espírito inabalável é desejar não ser seduzidos pelo pecado e seus falsos benefícios. Ao apresentar seus pedidos diante de Deus, apresente também sua vida, desejando ter um espírito inabalável diante das tentações e um coração puro, para desejar a Deus em primeiro lugar em nossas vidas.
O presente texto foi escrito para a aula de Escola Dominical da Igreja Presbiteriana Independente de Tucuruvi, São Paulo, SP, em 27 de março de 2021
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O índice é atualizado no artigo da primeira lição.