Uma breve análise sobre as empresas de Software da Bolsa Brasileira

Guilherme Lima
DealflowBR
Published in
6 min readMay 7, 2020

Um dos setores que mais me agrada para investimento em ações é o de Software. Sou um pouco enviesado pra falar deste setor pois já trabalho com empresas de tecnologia e conheço métricas e dinâmicas com certa profundidade, mas acho que as empresas de Software disponíveis na Bovespa são boas opções para quem quer se expor a investimentos em empresas de tecnologia. Além disso, elas usam um modelo de negócios escalável ( chamado SaaS — software as a service) e leva, com certo grau, inovação em algumas linhas de produtos, contando estratégias que buscam consolidar verticais de mercado de tecnologia. Se gostar desse texto, assine minha newsletter: http://dealflow.substack.com

Dito isso, e para deixar mais claro, a ideia desse texto é discutir métricas de empresas abertas de SaaS e consequentemente trazer mais olhares para esse mercado, além de levar a análise de empresas de tecnologia para benchmark de empreendedores do setor. Com isso, quem sabe um dia, podemos ter mais opções de empresas com essas características . Disclaimer: As análises e opiniões são minhas e eu não quero, nem posso, fazer indicação de investimento. Espero apenas que esse post possa trazer alguns insights para suas análises, e do mercado software.

Na data deste post, no Brasil, havia quatro empresas de Software nessas caraterística na bolsa brasileira são:

  • Totvs (TOTS3): Software de gestão e ERP para diferentes setores, como Agro, Manufatura, Varejo, entre outros. É maior empresa brasileira de Software, já foi a quinta maior empresa de Software do mundo. É a única das quatros com participação no Índice Bovespa.
  • Linx (LINX3): Líder em software ERP e POS(point-of-sale) para o varejo, com quase 50% do mercado. Foi a primeira empresa SaaS na bolsa brasileira.
  • Locaweb (LWSA3): Software e plataforma digitais para transformação digital de empresas e presença online. A mais recente das quatro na Bolsa.
  • Sinqia (SQIA3): Software de gestão para mercado financeiros. Praticamente uma Startup em late-stage quando inicio na Bolsa, captando R$ 55,5 milhões — tamanho médio de uma Serie B no Brasil nos últimos anos.

Na minha opinião a composição da bolsa no Brasil é, em geral, um pouco desinteressante para mim. Se pegarmos a composição da Ibovespa — índice com as empresas mais negociadas — veremos que quase 50% do índice é composto empresas de commodities e os bancões. As grande parte das que sobraram seguem a mesma linha de empresas tradicionais e com pouca inovação no seu core, com algumas poucas exceções mais claras.

Nos EUA, nos últimos 20 anos, as empresas de tecnologia engoliram a bolsa de valores. Esse video mostra a ascensão das empresas que hoje são chamadas de BigTechs. Acredito que em algum momento no futuro, teremos empresas de produtos digitais despontando.

As características das empresas de software brasileiras

O que me atrai nelas é que todas estão baseadas em modelo SaaS (software-as-a-service), que leva mais escalabilidade e crescimento de produtos/serviços 100% digitais, adicionado a uma cultura de desenvolvimento de seus produtos a partir de metodologias ágeis onde já vivem há alguns anos. Na minha visão, essas empresas vivem no dia-a-dia a transformação digital que muitas empresas hoje almejam.

Outras características que essas empresas de Software da Bolsa têm em comum e que, na minha opinião, as fazer se sobressair de outros setores, são:

  • Base grande de receitas recorrentes — Diferente do antigo modelo de licenças onde havia uma compra do Software por um valor inicial alto, o modelo SaaS funciona como um aluguel, ou direito de uso, do software mediante ao pagamento mensal ou anual em parcelas de forma a não afetar o fluxo de caixa dos clientes.
  • Switching costs (custo da troca) — característica forte de empresas SaaS B2B, como sistemas de ERPs, onde as empresas clientes acabam se tornando tão dependentes do produto, que fazem parte do modus operandi, tendo toda empresa engajada no produto, o que torna muito custoso — como tempo, treinamento, riscos etc… — a troca para outras soluções.
  • Capitalizadas e M&A como uma das principais estratégias de crescimento — As quatro empresas fizeram oferta de ações recentemente, portanto hoje desfrutam de boa posição líquida de caixa, grande parte direcionado para aquisições. As quatro também têm dentro das suas estratégias de crescimento a aquisição de outras empresas para compor oferta de produtos, base clientes e novas tecnologias. Elas têm sido extremamente ativas com diversas aquisições novas últimos anos, através de um modelo programático de aquisições que conseguem agregar valor de mercado diretamente através de novas aquisições (M&A Accretion) ou posição de caixa — Espero explicar melhor esse tema na próxima edição.

Devido a esses pontos principais, essas empresas conseguem crescer acima de dois dígitos anualmente e com boas margens operacionais e de geração de caixa, e assim as fazem poderem desfrutar de bons múltiplos de mercados. Por exemplo, o gráfico abaixo mostra o que quero dizer. Veja que as empresas mais rentáveis e, principalmente, as que mais crescem tem os múltiplos de valor a patamares bem altos (empresas de Software de bolsa americana — retirado do relatório anual da Software Equity Group):

SEG 2020 Annual Software Industry Report

Veja a tabela comparativa com os dados dos resultados de 2019 das quatro empresas de Software da Bolsa Brasileira:

RULE OF 40% — Análise da Regra do 40% pra empresas SaaS

A Regra dos 40% é uma métrica que vi primeiramente no blog do Brad Feld — autor de do livro Venture Deals e investidor pela Foundry Group — que trata de uma métrica mínima da relação entre crescimento e rentabilidade para empresas SaaS saudáveis. Eu particularmente gosto de aplicar esse framework em SaaS para identificar empresas que estão em patamares altos de performance de “Crescimento Sustentável”.

Basicamente, a regra dos 40% é que a taxa de crescimento somado a margem de geração de caixa — ou EBITDA — devem resultar em ao menos 40% para o equilíbrio sadio entre crescimento e rentabilidade — usando sempre métricas anuais. Por exemplo, se você está crescendo a 20% a.a., deve gerar uma margem de EBITDA de 20%. Se você está crescendo a 40%, deve gerar um lucro de 0%. Se você está crescendo a 50%, pode perder 10%. Se você estiver indo melhor do que a regra dos 40%, isso é ótimo.

Segundo o autor, essa métrica pode ser usada em empresas que já faturam a partir de US$ 1MM, e só funciona para empresas comparar empresas que têm margem bruta alta, acima de 70%+, normalmente visto em empresas SaaS.

Um artigo recente da Nfx, sobre o equilíbrio de crescimento e rentabilidade, menciona a Regra dos 40% e apresenta visualmente esse framework.

Já vi algumas análises da Regra dos 40% para empresas das bolsas americana, e resolvi fazer para as empresas de software brasileiras:

Claro que outros diversos fatores tão importantes quanto o crescimento e rentabilidade devem ser levados em conta numa análise de valor de uma empresa, mas, nessa perspectiva, por exemplo, é possível sugerir que a Locaweb por ser a mais bem posicionada no gráfico é a que apresenta a performance mais saudável e ‘faz por merecer’ ter múltiplos de valuation maiores.

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Guilherme Lima
DealflowBR

Brazilian venture investor @astellainvest and editor-writer @dealflowbr .