O broto do meu âmago

Declama, Mulher!
declamamulher
Published in
2 min readAug 6, 2022

Eu nunca senti muita segurança para me expressar. E quando digo isso, digo
de todas as formas possíveis: por palavras escritas ou verbais, pelo desenho ou
pintura e até como movimento meu corpo. Eu sabia que poderiam rir de mim ou ter problemas conforme o que iria dizer, fazer, agir. Me expressar significava me expor. O resultado disso foi que bem cedo, não sei com quantos anos, eu transformei quem eu realmente sou (e queria ser) em semente e a plantei bem escondido entre meus órgãos e sangue.

Tudo que queria criar ou escrever se limitava ao espaço mental, onde
imaginava, desenvolvia e me distraía. Era também um alimento para a semente que estava escondida em mim. Dessa forma, ela era preservada.

No entanto, com o passar dos anos, essa semente começou a brotar. Os
brotos frágeis e assustados começaram a fazer cócegas no estômago, no pulmão e de repente, torneavam minha garganta e me faziam engasgar. Foi aí que aos poucos, tentava transformar sentimento em expressão artística com desenhos e alguns pequenos textos.

Nessa época, eu ainda morava em Portugal e tinha convicção de que em breve
voltaria para o Brasil, então sabia que não podia escrever ou desenhar muitas coisas porque precisaria fazer todo meu ser caber em algumas poucas malas e com limite de peso. Isso acabou por podar o broto que estava tomando forma e crescendo pelo meu corpo.

De fato, eu retornei para o Brasil e agora tenho tempo, espaço e materiais para
me expressar de diversas formas, mas eu não consigo nem sei lidar com uma
liberdade que nunca tive. É estranho pensar que posso fazer um desenho maior que uma folha A3 ou que posso comprar diversos cadernos, se quiser, para escrever tudo que passeia em minha mente. Na verdade, eu não coordenei o broto com uma vareta de madeira ou metal indicando qual direção ele deveria seguir, por isso, agora estou perdida comigo mesma na liberdade que sempre sonhei. O broto não sabe reconhecer o sol.

Aos poucos eu tento ensinar ao broto sua direção ou seus diversos possíveis
destinos, desde que cresça. Descobri que na verdade não era só de liberdade que ele precisava, mas de amor. Amor-próprio, me conhecer e gostar do que me tornei, afagar minha criança interna que foi tão limitada por diversos fatores e medos. Quando conseguir em outro momento como este me expressar e converter meus pensamentos e sentimentos em palavras/arte, espero que diga que o broto não é broto, mas é planta e planta com raiz, plantado em um solo quentinho.

TEXTO ENVIADO POR REN | Chamada aberta tema AMOR E LIBERDADE | Natural de Goiânia e formada em Línguas, Literaturas e Culturas em francês pela Universidade do Porto. Além da escrita, fotografa desde 2012 e tem tentado se expressar e se conhecer pelo desenho e pintura. Grande parte do seu processo criativo é imaginário, mas aos poucos, tenta transformar imaginação em realidade.

--

--

Declama, Mulher!
declamamulher

Mulheres que escrevem Mulheres que declamam Mulheres que têm voz e não se calarão