O perfil de quem é adorador de armas nos EUA: homem, hétero e branco

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4 min readJun 15, 2016
LaVoy Finicum, líder de uma milícia de extrema-direita nos Estados Unidos: herança do KKK, grupos hoje batalham pela liberdade na venda e compra de armas para homens brancos | Foto: Jarod Opperman/The New York Times/Redux

Homem, branco, hétero e de classe média. Esse é o perfil dos adoradores de armas de fogo nos Estados Unidos, um mercado que demonstra em números crescer cada vez mais após ataques com uso de arma de fogo, como foi o caso de Orlando, neste fim de semana.

Após o presidente Obama anunciar as restrições nas vendas de armas em 6 de dezembro do ano passado, os americanos foram às compras.

Nesta segunda-feira, o jornal The New York Times relatou que os preços das ações de fabricantes de armas como Smith & Wesson e Ruger dispararam. Armas vendidas na Black Friday também, três dias após três pessoas serem assassinadas a tiros em uma clínica de aborto no Colorado, e apenas duas semanas após terroristas matarem mais de 100 pessoas em ataques na cidade de Paris. De fato, as vendas de armas têm aumentado de forma constante durante todo o ano, e com isso, o número de casos de violência também.

Mas quem são exatamente os proprietários de armas de fogo nos Estados Unidos?

De acordo com uma pesquisa do Pew, realizada em 2014, são em sua maioria republicanos — em cada 3 proprietários de arma de fogo, apenas um se declararia democrata.

Proprietários de arma também estão geograficamente espalhados: eles são tão propensos a viver no Meio-Oeste dos Estados Unidos (38%), como em outras regiões: Costa Oeste (35%) e Sul (34%), desmascarando o mito de que a posse de armas é mais relevante no sul do país. Já no Nordeste, por outro lado, a posse de armas é menor, em torno de 27%.

Acima de tudo, porém, os proprietários de armas são homens. É verdade que as vendas de armas estão aumentando entre as mulheres, mas a diferença de gênero substancial persiste: em 2013, os homens foram cerca de três vezes mais propensos a possuir uma arma do que as mulheres.

Ao longo dos últimos anos, muitos mais mulheres têm favorecido a proibição de armas semi-automáticas. Um total de dois terços das mulheres a favor dessa proibição, enquanto apenas 48% dos homens, de acordo com um estudo de 2013 do Pew. Na verdade, as mulheres tendem a priorizar restrições sobre direitos de armas em geral, ao contrário do sexo masculino. Junte isso com o fato de que a grande maioria dos jogos de tiro em massa também são para homens, e surge um padrão. O problema da arma nos Estados Unidos não pode ser resumido em apenas uma questão, é claro, mas também é considerável que acima do medo da violência e de ataques terroristas, ou até mesmo da Segunda Emenda, o problema da arma na América tem algo a ver com os problemas da masculinidade no país.

Parantes e amigos das vítimas do ataque em uma boate LGBT em Orlando rezam em memória aos falecidos | Foto: AAP

Como Alçankaar Sharma, um assistente social e pesquisador, disse: “Ter uma arma é considerado por muitos homens, se não a maioria, como uma forma simples de subscrever a masculinidade dominante”. Na sua opinião, o sistema patriarcal, que privilegia um certo conjunto de comportamentos masculinos, valores e práticas, fornece homens com “uma razão clara e justificável para possuir armas”. Ele consolida sua identidade como homens masculinizados.

E para muitos homens hoje, é uma identidade particular. A socióloga Jennifer Carlson argumenta que os homens estão agarrados às armas como uma forma de lidar com uma ampla gama de inseguranças sociais. Autora de um livro sobre a prática social da arma na América, Carlson descobriu que os proprietários de armas muitas vezes partem de uma geração onde seus pais, como homens, tinham papéis importantes a desempanhar na sociedade, como fornecedores e chefes de família.

Mas a participação dos homens na força de trabalho tem vindo a diminuir desde os anos 70. Como a matéria de capa da revista The Economist disse em 2015: “O sexo mais fraco”. Homens mal educados nas sociedades mais desenvolvidas não estão lidando bem com o século XXI. Mudanças na casa e na força de trabalho, especialmente a perda de empregos na indústria, criaram uma classe de homens insatisfeitos, financeiramente inseguros. Enquanto isso, as mulheres, que agora ganham mais graus universitários do que os homens, estão em alta no mercado de trabalho.

Esse comando segue uma pesquisa de Carlson. “Como os homens duvidam de sua capacidade de fornecer”, ela argumenta, “o seu desejo de proteger torna-se ainda mais importante. Eles carregam uma arma como um dever masculino”. Segundo ela, “alguns imaginam cenários onde eles intervêm com suas armas para salvar mulheres e crianças”.

Auto-defesa é uma lógica comum para carregar uma arma, mas estudos mostram que o uso de arma de defesa raramente é como as pessoas imaginam. Atirar em alguém em um cenário de alta tensão é extremamente difícil, mesmo para profissionais bem treinados. Após o tiroteio no caso da revista Charlie Hebdo em Paris, um grupo pró-arma simulou um ataque para demonstrar como eles teriam utilizado armas para salvar vidas. Todos acabaram “morrendo” durante o exercício.

Reportagem por Elizabeth Winkler, do site norte-americano Quartz — traduzido pela Agência Democratize

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