Descascando 5 livros escritos por mulheres #2

Roberta Abrantes
descascandooabacaxi
5 min readDec 20, 2018

Como vocês já devem saber, o Descascando o Abacaxi apoia o projeto Leia Mulheres, que incentiva as mulheres escritoras e quer colocar mais nomes femininos na sua estante.

Já faz algum tempo desde o primeiro Descascando 5 livros escritos por mulheres, mas leituras não pararam e a lista de hoje, se tivesse um tema, seria: temas polêmicos escritos de maneira leve e fluída.

Sem mais delongas:

Americanah — Chimamanda Ngozi Adichie

“[…] Esta é a questão: a maneira como o racismo se manifesta mudou, mas a linguagem, não. Então, se você nunca linchou ninguém, não pode ser chamado de racista. Se não for um monstro sugador de sangue, não pode ser chamado de racista. Alguém tem de poder dizer que racistas não são monstros. São pessoas com família que o amam, pessoas normais que pagam impostos.”

Chimamanda se tornou uma das minhas autoras favoritas há algum tempo e o primeiro contato que tive com a sua escrita foi com através desse livro, Americanah. O que mais me chamou a atenção nas suas histórias foi trazer discussões sérias e importantes (como racismo, xenofobia, machismo e religião) de uma maneira fácil de ler e acompanhar, como se fosse diluído para que todos possam engolir.

Americanah conta a história de Ifemelu e Obinze, dois jovens apaixonados, de Lagos, na Nigéria, nos anos 90. Por conta do regime militar, as faculdades e escolas estão sempre em greve e, como Ifemelu tem uma tia nos Estados Unidos, se muda para lá. O plano inicial era que Obinze fosse logo em seguida e encontrasse a namorada lá, mas não foi bem assim que aconteceu.

Embora o livro seja sobre o romance de Ifemelu e Obinze, a maior parte dele é sobre como uma nigeriana vive na América, seus aprendizados adquiridos observando os brancos e o racismo que a cerca.

Excelente recomendação para todos os humanos, especialmente os brancos que não querem ser racistas e negros que querem se sentir representados por personagens maravilhosos.

O Sol É Para Todos — Harper Lee

“Antes de poder viver com os outros, eu tenho de viver comigo mesmo. A consciência de um indivíduo não deve subordinar-se à lei da maioria.”

Apenas pelo título podemos ver que se trata de um livro poderoso. O Sol É Para Todos é considerado um clássico da literatura norte-americana. Ele foi lançado em 1960, ganhou um Pulitzer, inspirou diversas obras literárias e cinematográficas e, quase 60 anos depois, ganhou uma continuação.

A história é dividida em duas partes, ambas narradas por Scout, de 8 anos. Na primeira parte, ela faz suas observações sobre o condado onde vive, sobre as famílias e tradições. Somente na segunda parte, entendemos o que está realmente acontecendo: em pleno sul dos Estados Unidos da década de 30, um lugar e época extremamente racistas, o pai dela, Atticus, um advogado branco, é contratado para defender um homem negro acusado de estuprar uma mulher branca.

A inocência de Scout é instigante e faz com o que o livro fique cada vez melhor, afinal, ela está tendo seu primeiro contato com alguns temas: racismo, puberdade, adolescência, escola, família, direitos humanos.

Uma leitura que vale a pena para qualquer ser humano, sem mais.

Quando Ela Acordou — Hillary Jordan

“Não tivera permissão para usar uma lâmina desde que fora presa. No início, quando os pelos ali e em suas pernas começaram a crescer, passando de eriçados a sedosos, isso a horrorizara. Agora, pensar nessas vaidades femininas a fazia rir, um som feio, alto, no espaço fechado do compartimento. Agora era uma vermelha. Sua feminilidade não tinha a menor importância.”

Sabe aquele livro que você lê sem nenhuma expectativa e acaba amando? Foi o caso com Quando Ela Acordou.

A história começa com a protagonista, Hannah Payne, acordando vermelha. Não queimada de sol ou corada, literalmente vermelha. Isso gera um estranhamento até entendermos como funciona a sociedade criada por ela: alguns crimes deixaram de ser punidos com prisão, ao invés disso, os criminosos ganham uma cor de pele de acordo com o tipo de delito cometido. Hannah é vermelha porque cometeu um assassinato, um aborto, na verdade, mas é assim que a sociedade do livro enxerga essa questão.

Hannah foi criada em uma família extremamente religiosa e numa sociedade muito conservadora para ser uma mulher submissa e sem opinião. Entretanto, depois de se tornar uma Cromo (como são chamadas as pessoas que têm as peles pintadas), ela é rejeitada pela família e precisa achar um novo modo de viver em meio ao preconceito e dificuldades.

O livro traz ótimas reflexões sobre racismo, fanatismo religioso, aborto (dã) e empoderamento. Altamente recomendado para quem gosta de distopias e/ou gostou de O Conto da Aia, de Margaret Atwood.

A Cor Púrpura — Alice Walker

“[…] o Deus pra quem eu rezo e pra quem escrevo é homem. E age igualzinho aos outro homem queu conheço. Trapaceiro, isquecido e ordinário.

Ela falou, Dona Celie, é melhor você falar baixo. Deus pode escutar você.

Deixa ele escutar, eu falei. Se ele alguma vez escutasse uma pobre mulher negra o mundo seria um lugar bem diferente, eu posso garantir.”

A Cor Púrpura é outro livro clássico que se passa no sul dos Estados Unidos na década de 30. A primeira vista sua leitura assusta porque é escrito em forma de cartas de uma negra pobre, a protagonista Celie, para Deus.

Celie conta sobre os seus dias, os abusos que sofre, sobre a irmã, sobre o marido. Ela passa por tudo calada, porque foi criada para ser assim.

Ela tem diversos problemas de autoestima, nunca foi amada de verdade e seus pedidos para Deus nunca foram atendidos até que: bam, acontece uma coisa que muda tudo mas seria spoiler.

Um livro pesadíssimo que fala sobre racismo, religião, importância do amor próprio e papel da mulher na sociedade. Altamente recomendado para qualquer ser humano.

Nota mental: fazer uma versão com muitos spoilers dessa resenha.

Eleanor & Park — Rainbow Rowell

“Você pode ser o Han Solo. Eu vou ser o Boba Fett. Vou cruzar o espaço por você.”

Apesar de ser a citação mais curta e, aparentemente, boba, esse livro fala de coisas sérias como: bullying e relações familiares abusivas.

O motivo de este livro infanto-juvenil estar aqui é: ao contrário das outras histórias desse gênero, o amor aqui é uma cura para os problemas que ambos têm em casa e não um objetivo.

O enredo é simples: Eleanor é nova na escola, tem um pai ausente e um padrasto alcoólatra que bate na mãe, é muito pobre (a ponto de não ter roupas ou escova de dentes) e sofre bullying por causa de sua aparência “desleixada”. Park é o único coreano do bairro, tem uma família de margarina que não o entende muito bem e, no fim do dia, é só um cara normal passando pela adolescência.

Eles se conhecem no ônibus, se odeiam, mas não brigam. Começam a se aproximar com gibis e músicas até que as segundas-feiras passam a ser esperadas porque eles vão se ver.

Cada página desse livro é um cobertor para um coração cansado e gelado. Cada referência nerd é um sorrisinho para quem já assistiu Star Wars.

Esse livro foi deixado por último porque, no fim das contas, é o mais leve e é o que mais vai aquecer coraçõezinhos. Não recomendado para quem se apaixona com facilidade.

Essa foi uma lista bem variada e, com certeza, tem um livro que combina com o seu estilo literário. Espero que vocês gostem. Beijos da Abucaxi.

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