ENTREVISTA — 12

“Como imaginar o resultado de ouvir e gostar de uma música escolhida por um algoritmo?” — Madyana Torres

Marina Meireles
Design Centro
Published in
5 min readJul 28, 2021

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Senior Product Designer no Spotify, Madyana atua na divisão de Home Consumer Electronics. Ela contou um pouco sobre os desafios de projetar interações complexas nos cenários de uso doméstico da plataforma

Ao encontrar no Design uma alternativa para satisfazer o interesse de trabalhar com arte, Madyana Torres foi mais longe. Depois de passar por empresas coreanas, finlandesas e americanas, a pernambucana conquistou mais: a chance de, através dos estudos, derrubar fronteiras e ganhar o mundo.

O interesse pelo digital, até então pouco conhecido em 2007, deu início à jornada profissional de Madyana. "Comecei por acidente, todas as vezes que aparecia uma oportunidade de experimentar, eu estava lá levantando minha mão". Esse interesse rendeu uma iniciação científica com a Nokia, trabalhos como freelancer que criaram mais familiaridade com o universo digital e, anos depois, na Samsung.

Atualmente no Spotify, onde entrou para um estágio do mestrado em 2016 e hoje atua como Senior Product Designer, Madyana compartilha o trabalho com designers responsáveis pela parte visual, de interações, branding, UX writing e prototipações. No caso específico de Madyana, seu trabalho é direcionado à área de Home Consumer Electronics, ou seja, plataformas de uso doméstico como assistentes virtuais ou videogames, por exemplo.

Se, mesmo tangíveis, os projetos para aplicativos já trazem suas dificuldades, os obstáculos para projetar para outros tipos de interface incluem um ponto básico e essencial no processo de design: testar as ideias.

  • Como são os processos de design no Spotify?

A gente tem um bootcamp, que é um processo de design como um “intensivão” onde a gente explica o processo de pesquisa, de design, faz uma conversa entre os profissionais que estão entrando com os designes de lá, para o pessoal saber quem é quem. Pra deixar o pessoal menos isolado, tem esse processo que alivia a entrada na empresa.

A questão é que vão ter muitos métodos e não tem um que é perfeito pra tudo. Se você é uma pessoa que trabalha com prototipagem ou editorial, por exemplo, não adianta eu te forçar a usar um método que é pra uma coisa completamente diferente.

  • O que é o Home Consumer Electronics?

O Home Consumer Electronics trabalha com tudo que está dentro da casa das pessoas. O desafio é que as interações são muito complexas, elas mudam conforme o contexto. A sensação do que é público e privado começa a mudar, também.

Como designers em geral, a gente começou a projetar com botões e coisas físicas antes de projetar com coisas abstratas, mas, ao mesmo tempo, a tecnologia não é tão avançada com a mistura de digital e físico.

  • Com essa diferença em relação ao tipo de produto, como são os entregáveis?

Diagrama, vídeo, apresentação. Não tem como eu fazer um mockup no Figma sobre como um assistente virtual responde pra os tipos de interação. Os entregáveis são bem esquisitos, mas são desse jeito porque precisam ser tangíveis. Não podem ser completamente virtuais, até para as pessoas usarem como referência.

Às vezes eu tenho que realmente prototipar, mas para mostrar o que estou tentando fazer, o que eu estou tentando buscar. Um time focado em personalização vai refinar o tipo de proposta e pode até contradizer o que estou dizendo, mas entendem meu contexto e usam isso como referência.

  • E, nesse contexto, como o que é projetado pelos designers passa a ser trabalhado por outros profissionais para virar um produto?

A atitude do pessoal de engenharia é bem proativa. Todo mundo está sempre bem interessado. Se alguma coisa que eles acham que não faz sentido, eles vão te perguntar — não para testar o seu conhecimento, mas por curiosidade, mesmo.

Não tem um momento que é calmo e sem novidade, especialmente no que tem relação com mídia, cultura, entretenimento. Se você trabalha com qualquer coisa artística, você que sempre ser desafiado.

  • Trabalhar em um produto grande implica em algumas questões de alinhamento, e, no Spotify, são pessoas de vários locais, idades, gostos. Como é possível estabelecer personas? A empresa trabalha com esse tipo de metodologia?

A gente tem um time de op de design e de pesquisa. Agora, a gente lançou o Spotify nos mercados novos, então antes do lançamento, tem um processo de pesquisa da cultura visual do lugar. A gente espera que isso se repita de maneira mais detalhada.

  • No debate sobre questões sociais e identitárias do design, você atua em uma empresa que mexe com cultura sociedade, identidade. É possível enxergar um pouco do processo de descentralização do design nos blog posts do Spotify, mas como são essas iniciativas e como elas se traduzem na prática? E o que você pensa sobre isso?

Quando eu começava a olhar o currículo daqui da Europa e do pessoal da UFPE, eu não via muita diferença. E eu começava a ver que existia essa cultura de que o design europeu era superior e isso era meio conflitante com a experiência que eu tinha na Samsung.

Os designers coreanos não gostavam do que a gente estava produzindo e eram simplesmente duas escolas de pensamento. A gente foi — e ainda é treinado com essa ideia de que design europeu é superior. Existe esse problema fundamental, que é essa parte de modernidade e colonialismo, que é estabelecer o design europeu como superior. E com isso vêm os métodos de design, etnias, racismo, tudo junto.

Valor em design é pensar em coisa nova, em maneiras diferentes de se criar. Não é só focar em método e técnica, mas agora, que design tem mais atenção e provou que faz sentido para as empresas, não precisa representar lucro.

O que falta mesmo é uma disciplina que apresente equidade, respeito, sustentabilidade. Como você incorpora isso dentro do processo de criação. Não vai sair de dentro da disciplina de produto, porque não é do domínio deles. Como a gente trabalha com contato do usuário, seria a parte mais interessante que o design virasse uma disciplina que representasse isso.

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