De contadora a product designer: como migrei de carreira no meio da pandemia

Anna Carolina Coutinho
Conta Azul Design
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8 min readMay 12, 2022

Números e design pareciam assuntos que nunca iam se complementar. Depois de trabalhar como contadora, eu sabia que queria voltar a estudar design. Quer saber como foi o meu retorno a esse mundo? Eu te conto neste artigo.

Infância

Sempre fui uma pessoa extremamente ligada à criatividade. Quando criança, perdi as contas de quanto tempo dedicava aos meus desenhos e outras atividades manuais que envolvessem o olhar atento aos detalhes.

Da mesma forma, lidava com lógica como se fosse algo bem natural ao ponto de gostar de tudo que envolvia números (maratona de matemática que o diga haha).

Faculdades e primeira carreira

Imagina a confusão na cabeça de uma pessoa que se identifica com áreas consideradas opostas no momento de escolher uma carreira para seguir?

Foi desse jeito que acabei prestando vestibular para vários cursos diferentes e escolhi ingressar em duas faculdades: ciências contábeis e design, mundos completamente distintos.

Vivi essa dicotomia por aproximadamente 1 ano, dada a correria que era estar em duas faculdades ao mesmo tempo, junto com as dúvidas persistentes sobre “o que vou fazer como designer?” ou “será que consigo viver de criatividade?”.

Na época, a identificação que sentia estudando contabilidade e a perspectiva de um possível mercado de trabalho mais consolidado me fizeram optar por seguir somente esse caminho.

Recém-formada em contabilidade, me mudei para São Paulo para trabalhar com auditoria em uma das maiores empresas do ramo. As experiências profissionais que adquiri por lá em 3 anos valeram mais do que várias graduações juntas.

A nova cidade trouxe, além disso, novas amizades que trabalhavam com design e que me introduziram ao mundo da experiência do usuário.

A transição

Os anos de auditoria agregaram muito conhecimento. Eu gostava do que fazia, mas não me sentia completa, faltava a sementinha da criatividade plantada desde a infância. A partir de certo ponto, com o apoio de amigas que já trabalhavam como product designers, tomei coragem de sair do emprego para iniciar o processo da transição de carreira.

Peguei muitas dicas de cursos e outros materiais, e busquei, inicialmente, por aqueles que tivessem um investimento menor (ou fossem gratuitos).

Ao longo das pesquisas que fazia sobre esses cursos e livros, passei a descobrir muita gente disposta a ajudar pessoas em transição de carreira, desde mentorias gratuitas até grupos com dicas e experiências de profissionais em situações semelhantes.

A iniciativa de buscar ferramentas com menor investimento acabou gerando um bom networking, de modo que usufruo de seus benefícios até hoje.

Entrando um pouco no detalhe dessas ferramentas de transição (livro e cursos), posso citar como os mais importantes:

Livro essencial para iniciantes: “O design do dia a dia”

Esse livro do Donald Norman começa a abrir nossa mente sobre como enxergar a construção de produtos e sair do nosso próprio modelo mental para compreender que há outras formas das pessoas pensarem.

Nele vemos princípios fundamentais do design, como modelos conceituais, feedback, restrições e affordances — um termo muito importante para a usabilidade — de forma didática e cheia de exemplos do nosso cotidiano.

Meus primeiros cases: cursos facilitadores

Fiz 4 cursos ao longo dessa transição, que surgiram por meio de pesquisas diretas ou indicações de perfis de UX que sigo nas redes sociais. O pequeno networking que tinha até o momento também sugeriu alguns destes:

  • UX & Design Thinking: Experiência do Usuário nos negócios, do Leandro Rezende. Esse foi o primeiro curso que escolhi fazer na área, pois conta com bastante introdução aos princípios do design, além de ferramentas e abordagem dos processos usados no dia a dia da profissão.

    Ao longo do curso é possível praticar com exemplos reais todo conhecimento adquirido. Foi o que eu precisava para abrir a mente para o mundo novo do UX.
  • Bootcamp gratuito de UX design, da How Education.
    Foi um curso de aproximadamente 3 meses, com aulas 2 vezes por semana em um link ao vivo (com muitos participantes, muitos mesmo). Como era uma proposta gratuita, cada aluno podia formar equipes, duplas ou trabalhar individualmente.

    Não tínhamos um acompanhamento tão de perto e detalhado, por conta do número de inscritos, então as professoras ensinavam cada conteúdo e corrigiam ao vivo alguns trabalhos enviados no tempo disponibilizado.

    Esse foi o pontapé inicial para construir o meu primeiro projeto na área, desde a discovery até a solução final com protótipos, ou seja, um case completinho.

    Finalizei o curso com o pensamento muito forte de que não importava tanto a quantidade de cases no meu portfólio, mas a qualidade por trás do racional construído durante o projeto.
Foi a primeira experiência de entrevistar usuários reais, compilar informações, e ver a diferença entre o que a gente acha que é uma solução, e que o usuário pensa. #ParaTodosVerem: na imagem, há uma montagem com quatro fotos: um print de uma matriz CSD (certezas, suposições e dúvidas); ao lado, um print com insight cards; abaixo destas à esquerda, uma foto minha durante meu trabalho (tenho cabelos loiros, estou usando uma blusa rosa e estou olhando para meu notebook, que está aberto, enquanto escrevo no meu caderno); e, à direita, está um print do duplo diamante, com as quatro fases: imersão, definição, ideação e prototipação.
  • Curso intensivo de UX, da Cel.lep. Em duas semanas, formando equipes de 5 pessoas, aprendemos ferramentas específicas do double diamond e aplicamos em um problema proposto pelos mentores, que acompanhavam cada grupo de perto. Nesse processo notei alguns pontos sobre o meu aprendizado, tais como:
  1. Comecei a desenvolver soft skills durante o curso e percebi o quanto eu já tinha conhecimentos de UX comparada aos demais membros da equipe;
  2. Foi o primeiro contato que eu tive com o que poderia ser o mercado de trabalho e o dia a dia na profissão;
  3. A dedicação até esse ponto tinha feito toda diferença, me sentia cada vez mais pronta a arriscar uma vaga no mercado de trabalho;
  4. Ainda me sentia insegura sobre a parte visual, mais voltada ao UI.
  • UI Boost, do Gilberto Prado.
    Esse foi o primeiro investimento alto em um curso. Logo que me inscrevi, apareceu a oportunidade na Conta Azul (de que eu vou falar no próximo tópico) e, com os novos desafios, resolvi fazer este curso sem tanta pressa.

    Hoje em dia, me organizo para ir terminando os módulos aos poucos, e eles seguem trazendo insights importantes e cada vez mais segurança nos layouts e protótipos criados.

Essa foi a minha caminhada até o design. Tudo bem se você estiver trilhando um caminho diferente. Não existe uma receita certa ou passo a passo definitivo para ingressar na área.

A Conta Azul

Em meados de dezembro de 2020, tudo começou a acontecer para que a transição de carreira fosse concretizada. Houve um post no LinkedIn dos líderes de design da Conta Azul a respeito de uma vaga com um perfil que eles almejavam, caso existisse alguém assim.

“Não somos a primeira empresa que pede um Designer que seja 2 em 1, mas não custa tentar inovar na combinação…” (Post de Mayra Laska, na época Design Manager na CA)

A Conta Azul estava em busca de um novo Product Designer que tivesse conhecimento das regras de negócio do produto e, se possível, com alguma experiência na área contábil para atuar diretamente em CA Mais, produto voltado aos contadores.

Recebi a notificação de que havia sido marcada em um comentário em uma vaga no LinkedIn. Assim que visualizei, percebi que tinha tudo a ver comigo.

Comentário que me abriu as portas para o processo seletivo Conta Azul. #ParaTodosVerem: comentário de Bruna Guimarães no LinkedIn: “Hahahahah não precisa fazer um chamado pro além Mayra Laska, a Anna Carolina Coutinho é formada em contabilidade, ex Deloitte e já tá há uns meses na transição para Design de produto e UX :) Ela vai te chamar para bater um papo!”

No mesmo dia, entrei em contato com os autores do post para entender melhor a vaga, conversei sobre minhas experiências e momento de carreira, e decidi prosseguir com o processo seletivo.

Processo seletivo

Estas foram as fases da seleção para a vaga de Product Designer:

Entrevista 1: RH
O primeiro passo foi uma conversa com o RH para análise de currículo, nivelamento de expectativas e mais detalhes sobre a empresa.

Entrevista 2: PM (Product Manager)
A segunda conversa foi com uma Product Manager que também era contadora e tinha feito a transição de carreira.

Durante essa entrevista (que teve mais uma carinha de bate-papo, visto que nos entendemos muito bem), falamos sobre coisas mais específicas de contabilidade e pude entender melhor onde cada coisa se encaixava no produto.

Foi a partir desse ponto que a minha certeza cresceu em relação às chances de ter um grande match com a Conta Azul.

Entrevista 3: DM (Design Manager)
Tive um bate-papo com uma das líderes de design. Conversamos sobre a minha trajetória, os cursos que eu tinha feito, meu conhecimento em design. Ela explicou o resto do processo e me deu duas alternativas sobre um case, para eu apresentar:

  • algum projeto pronto que eu já tivesse feito
  • ou resolver o desafio da Conta Azul

Concordamos que seria melhor eu fazer o desafio porque envolveria resolver problemas relacionados ao produto e eu poderia demonstrar melhor o meu conhecimento em contabilidade e design. Tive uma semana para fazer esse desafio.

Desafio
Em suma, eu tinha que trabalhar em um um problema relacionado às práticas de contabilidade e propor melhorias.

De primeira, pesquisei muito sobre a Conta Azul. Fiz uma desk research (pesquisa para reunir conhecimentos sobre um determinado tópico, dados secundários e entender o contexto) seguida de análise de concorrentes para entender os pontos mais importantes sobre a funcionalidade.

Em seguida, parti para pesquisa qualitativa e fui atrás de empreendedores que estivessem usando a plataforma.

Busquei esses empreendedores a partir das redes sociais da Conta Azul e comecei a lidar com uma questão que até hoje é comum no design: recrutamento de usuários para entrevistar, especialmente na pandemia.

Segui tentando contatar cada um no tempo e ferramentas que eu tinha, levei muitos "nãos", mas não desisti.

Finalmente consegui recrutar e entrevistar 4 usuários da Conta Azul. A partir das conversas, compreendi melhor o contexto do problema e tirei muitos insights.

A partir disso, montei o racional, trabalhei em cima dos dados para chegar a uma hipótese de solução e montei a apresentação final do desafio.

Ao fim dos sete dias, apresentei o case para três líderes de design, de diferentes segmentos do produto. Tive uma hora de agenda, sendo 45 minutos para apresentação do case e 15 minutos de dúvidas e questionamentos.

Desafio Conta Azul. #ParaTodosVerem: três slides da minha apresentação: o primeiro explica a minha imersão no desafio, o segundo, como recrutei os usuários para as entrevistas (usuários Conta Azul; idade entre 26 e 41 anos; diferentes níveis de conhecimento financeiro; 1 contador e 1 colaborador, 1 peq. empreendedor e 1 MEI; 3 homens e 1 mulher; business de varejo e serviço), e o terceiro slide mostra a capa da minha apresentação, com o texto “Product designer — Desafio Conta Azul — Anna Carolina Coutinho”.

Apresentei o trabalho mentalizando que havia construído um case sólido e totalmente dentro do que havia agregado de conhecimento nos meses de estudo.

Recebi ótimos feedbacks, incluindo o de que, com minha apresentação, eu já havia conseguido responder às perguntas que poderiam ser feitas.

Além disso, pontuaram observações do que poderia ser trabalhado, sempre considerando o meu momento de carreira. Eles também apontaram que gostaram muito do meu processo de ir atrás dos usuários, e da persistência em obter informações de quem realmente utilizava a plataforma.

Por fim, veio a resposta tão esperada: eu passei no teste!

Passar por esse seletivo foi a certeza de que eu estava preparada para migrar de área e iniciar uma nova carreira. Minha jornada como Product Designer estava apenas começando.

Hoje, passado mais de 1 ano da minha entrada na Conta Azul, tenho muito o que contar sobre o que aprendi aqui. Mas isso fica para um próximo artigo, tá?

E você, já migrou ou pensa em migrar para o design? Conta aqui nos comentários.

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