Alimentando pequenas revoluções
Há alguns meses assisti a uma palestra interessante de uma mãe empreendedora em São Paulo, onde a mensagem central era parar um pouco para apreciar a relevância e os múltiplos papéis que a comida desempenha em nossas vidas.
Para isso, precisamos sair da primeira e mais óbvia função da comida, que é o manter-se vivo, alimentar-se; e pensar que a comida também é um poderoso educador e uma enorme força cultural que influencia quais alimentos decidimos produzir, como processamos, transportamos, armazenamos e até mesmo como o cozinhamos.
Mayra Abbondanza é o nome desta mãe empreendedora, escritora e estrela da Netflix (e TV). Ela tem certeza de que, para tomar melhores decisões em nossa dieta, podemos começar a ter uma maior consciência em casa sobre a importância da comida; e melhor ainda começar a cultivar essa consciência em nossos filhos.
As palestras, livros e consultoria de Mayra são baseados em um desafio que parece ser muito comum entre os pais:
O que eu faço para o meu filho comer direito?
Uma questão que é importante o suficiente para qualquer pai, no entanto, é apenas o veículo que Mayra usa para incitar questões maiores e permitir conversas sobre alimentação que vão além da nutrição infantil.
Aqui estão três pontos da Mayra, na forma de “recomendações para pais”, mas espero que os encorajem a pensar mais sobre alguns aspectos de nossa dieta:
Comida que aparece misteriosamente
Se você está surpreso que sua filha retorne com o almoço intacto, pode ajudar pensar que ela não teve absolutamente nada a ver com aquela refeição. Pense nisso assim: você é um menino de 7 anos, é hora de recesso e você abre a lancheira, voila! A comida magicamente aparece!
O grande problema com este truque de mágica é que ele só funciona uma vez, você fecha os olhos com a esperança de que quando você os abre novamente, outra coisa parece comer, mas nada mudou, a mesma comida ainda está lá.
Qual é a recomendação? Peça ao seu filho para escolher e preparar o que ele vai comer naquele dia ou um dia de antecedência.
Para aqueles que são estranhos ao design, isso é como uma Aula de Experiência do Usuário Básica (ou UX101); se queremos gerar um vinculo maior com a comida, devemos pensar sobre o papel que o usuário final tem na escolha e preparação dos alimentos, o que nos leva ao próximo ponto.
Crianças e facas
Não haverá um vínculo mais próximo com o que eles comem do que participando de sua preparação. Sim, crianças na cozinha. Facas, fogo e sim, uma grande chance de um mega-caos na cozinha.
Ok ok ok. Antes de fechar esta página, pense nos diferentes riscos que uma criança tem fora da cozinha. Qual é a diferença entre o dano de cair de uma bicicleta ou patins, de raspagem de mãos e joelhos para um corte com uma faca ou um ralador? Obviamente, eu não lhe peço para lhes dar facas super afiadas, ou manipular (ou mesmo estar perto) de coisas quentes.
Devemos reconhecer as habilidades e barreiras de cada idade e dar-lhes as ferramentas certas, sempre com a supervisão de um adulto.
Algumas recomendações de Mayra a este respeito:
- Oficina de frutas: dê-lhes frutas e legumes prontas para cortar com moldes, formas ou facas pouco afiadas. O ponto é “brincar” com a comida sem qualquer “obrigação” de comê-la, depois de um tempo sentindo as texturas provavelmente começarão a experimentá-la.
- Aumente a ajuda deles na cozinha: a criança pode começar misturando a salada, mexendo os ovos ou a mistura para um bolo, quebrando e lavando as folhas de alface; e ir aumentando a dificuldade ao usar um descascador ou facas e assim por diante.
- Ajude a limpar: ter filhos na cozinha é uma receita para uma bagunça, sim. Mas eles também podem ajudar a limpar.
O menu da semana
Muitas vezes, quando adultos, não sabemos o que responder à pergunta “o que vamos comer hoje?”. Gostaríamos que, como o almoço da criança, já houvesse uma refeição deliciosa, quente e pronta para servir. A terrível verdade é que não há nada para resolver esse dilema e provavelmente imagine ou já tenha experimentado as consequências da terceirização dessa tarefa para restaurantes ou refeições pré-confeccionadas.
Combinar um menu semanal com toda a família ajuda de várias maneiras. Gera um acordo prévio sobre o que vamos comer durante a semana e evita chegar a essa pergunta infame. Também equilibra nossas escolhas e hábitos porque nos dá uma perspectiva melhor deles. Por isso, será mais fácil ver que o dia em que escolhemos comer hambúrgueres ou cachorros-quentes deve ser compensado com outros dias de vegetais, verduras e frutas. Isso também permite fazer uma lista de compras e, por sua vez, pode melhorar nosso planejamento.
A recomendação é fazer isso uma vez por semana, em família e em uma folha de flipchart que seja visível para todos. Desta forma, evitamos amnésia voluntária e nos desviamos do plano. Na opção mais tecnológica, Mayra tem um aplicativo gratuito que inclui um semáforo para saber se estamos configurando bem o menu ou se é mais como um fast food. No final, se o menu for aprovado, ele também gera uma lista de compras que é enviada para o seu email.
Como criar um cidadão protagonista?
Essa foi a maior provocação que tirei da conversa e que eu trago daquele dia. Ainda não tenho a resposta completa, mas acho que um bom começo está se envolvendo cada vez mais nas coisas que consideramos importantes.
Aparentemente, é a única maneira de recuperar o poder que damos aos outros por preguiça ou conveniência. Quem sabe, a comida pode ser o primeiro campo de batalha e os nossos filhos os revolucionários na vanguarda dessa disrupção.
Vamos começar por aí e continuar com outras coisas que amamos.
A palestra de Mayra Abbondanza pode ser vista abaixo. Creative Mornings é uma comunidade internacional de voluntários que se reúnem uma vez por mês em torno de pessoas e temas inspiradores. O São Paulo Chapter é incrível, além de gerar um vídeo sobre o evento, eles têm facilitadores gráficos e até mesmo levam um incrível músico (Cris Romagna) que compõe um tema inédito para cada evento.
Participe ou seja voluntário do capítulo de Creative Mornings da sua cidade! Eu garanto que você conhecerá pessoas maravilhosas.
Vamos conversar
Que outras maneiras você conhece para envolver as pessoas na cozinha?
Que outras atividades você considera são importantes quanto o cozinhar?
Quais ou quais são as seguintes ideias revolucionárias que devemos discutir?
