Contexto é tudo? Os nossos grupos de jogo e os RPGs que criamos.

dreamup
Design e Teoria dos RPGs
15 min readSep 28, 2017
Arte de Tom Lockwood

Entre as várias obras de fantasia que inspiraram o primeiro Dungeons & Dragons, penso que podemos destacar J.R.R. Tolkien e Jack Vance como pontos que definem um horizonte muito variado. Mas curiosamente, o clássico arquétipo do cleric encontra-se praticamente ausente de ambos. Personagens identificadas como priests são relativamente comuns nas obras de Fritz Leiber ou Robert Howard, mas são referências que não coincidem com este arquétipo de inspiração cristã que se juntou às classes de fighting-man e magic-user em 1974. Também não é uma ideia que tenha sido herdada de Chainmail, o jogo de miniaturas que antecedeu D&D no percusso criativo que Gygax e Arneson fizeram ao longo da fantasia medieval. De onde veio então o cleric que tão bem conhecemos como um elemento muitas vezes essencial de uma party?

Relatos da campanha de Blackmoor que Dave Arneson organizava em Minneapolis por volta de 1972, falam-nos de uma peculiar personagem interpretada por Mike Carr, um dos jogadores:

Bishop of the Church of the Facts of Life, who is the administrator of the doctrines of Whatever and the interpreter of the Great Commentaries of wishy-washiness.

Este village priest de nível 3 ficou conhecido por:

in an effort to convert our local magicians to the true religion our priest got drunk and engaged in a totally debauched orgy in Wizard’s wood

…e por, com o ouro que encontrava nas primeiras masmorras inventadas por Arneson:

gives so generously to the poor serving wenches at the taverns.

Por um lado, este é o tipo de personagem cuja moralidade flexível e sentido de humor poderiam facilmente figurar numa qualquer história de Jack Vance. Por outro, tanto Gygax quanto Arneson levavam a sua religião cristã a sério pelo que poderemos especular que, além de poder ser apropriado terem no seu Dungeons & Dragons uma classe para Mike Carr jogar, usarem o nome cleric em vez de priest permitiu-lhes purificar este arquétipo no sentido de algo que achassem bem publicar. Deste possível compromisso terá nascido a única classe que nunca mudou de nome desde a primeira publicação de D&D.

Mas o RPG funciona sequer?

Quem joga RPGs sabe quão poderosa consegue ser a nossa imaginação, quantas ideias abstractas podemos combinar na nossa mente e como podemos escapar da nossa realidade para muito, muito longe. E, no entanto, também sentimos que, ao percepcionarmos um jogo na nossa cabeça, as qualidades que valorizamos, a linguagem que empregamos e as regras que interiorizamos resultam da interacção que estabelecemos com as pessoas que jogam connosco. Da mesma maneira que, na nossa literacia, escrevemos melhor quantos mais livros lemos, na nossa ludofilia, percebemos melhor o que podem ser os RPGs quantas mais experiências de jogo temos com outras pessoas. E sendo certo que os nossos pontos de vista podem assim evoluir, também é verdade que o nosso primeiro grupo de RPG consegue ser muito marcante para a concepção que temos destes jogos.

Se considerarmos a frase muito citada de Theodore Sturgeon segundo o qual “90% of everything is crap”, é também provável que o nosso primeiro RPG seja relativamente fraquinho. Possivelmente é um daqueles que dá permissões sem dar as ferramentas, apontando o grupo para múltiplas direcções eventualmente contraditórias sem dar noção de como chegar à maior parte delas. Havendo motivação mas faltando os meios, o grupo de pessoas com quem jogamos torna-se ainda mais importante. Todos juntos arranjamos uma maneira do RPG funcionar ou, se correr mal, há gente que nunca mais toca em RPG nenhum.

Arte de Tom Lockwood

Se correr bem, na nossa memória, ficam marcadas as primeiras cenas espectaculares, conversas sobre sessões passadas e ideias malucas para personagens, mas também experienciamos as primeiras crises de confiança, conflitos de expectativas e imprevistos desagradáveis. Encontramos uma maneira de falar destes problemas para os ultrapassar ou simplesmente ignoramos as sessões menos boas (ou deixamos de poder aparecer para jogar). Descobrem-se valores implícitos que são partilhados pelo grupo mediante alguma ambiguidade. Toda a gente costuma concordar que o roleplay é importante sem definir propriamente o que essa palavra significa na práctica.

Toda esta indefinição faz com que o acto de jogar RPG nos pareça frágil, mas também precioso. E, como tudo o que é frágil e precioso precisa de alguém que tome conta, a figura do mestre-jogo torna-se mais do que um papel que vem com um RPG e passa a ser uma pessoa específica em torno da qual o grupo se dinamiza. Este quase contador de histórias também ajuda a tornar o RPG mais parecido com outras formas de entrenimento menos interactivo com as quais as pessoas se sentem mais confortáveis por nelas serem mais consumidoras do que co-criadoras.

Da mesma maneira que o artigo indefinido de “um” mestre-jogo passa para o artigo definido de “o” mestre-jogo, também “o” RPG se pode cristalizar ao acharmos que há uma única maneira de jogar que até funciona mais ou menos. Esta ideia pode ir ao ponto do RPG “puro”, o RPG que depende unicamente do grupo sem precisar de livros. Habitualmente, este RPG será pouco mais do que:

  • uma pessoa a contar histórias do ponto de vista de um conjunto de personagens…
  • …que são propostas pelas outras pessoas do grupo.

Isto não implica necessariamente uma conversa entre elas (muito menos fichas de personagem ou lançamento de dados) e é o máximo de jogo que se pode achar necessário ou até desejável. Mesmo que um grupo não chegue a este limite, é um possível ideal que demonstra quão importante pode ser uma pessoa, ou as pessoas, com quem jogamos. A nossa aprendizagem do que é um RPG, pelo menos em parte, começa por esta identificação com o grupo: o RPG é o mestre-jogo e o mestre-jogo é o grupo. É esta ideia de que não há o RPG sem o mestre-jogo e que não há o mestre-jogo sem o grupo. Ao ganharmos experiência com outros RPGs e outras pessoas, esta é uma casa há qual podemos sempre voltar, talvez já muito mudados, talvez irremediavelmente saudosos, mas sempre cientes de como começamos a jogar RPGs.

Qual é a tua experiência pessoal? Tiveste algum primeiro grupo de RPG que te marcou? De que forma? Encontraram uma maneira própria de fazer “o RPG” funcionar? Quantas destas pessoas quase só jogam ainda desta maneira? Que fragilidades fazem parte deste legado?

Um mundo digital desprovido de contexto

Neste início de século tão bem previsto pelas novelas cyberpunk, muitas pessoas gastam cada vez mais do seu tempo online percorrendo ecrãs de conteúdos montados para prender a sua atenção e extrair delas informação para satisfazer estratégias de grandes corporações. Neste lado massificado da internet, o RPG não escapa ao ciclo diário e efémero que reduz a complexidade do mundo a uma torrente constante de memes oportunistas e reacções superficiais. Em Portugal, temos ainda uma permeabilidade à cultura anglófona que acentua o sentimento de que o RPG nacional é só uma gota de água irrelevante no meio do Oceano Atlântico. E, neste meio de comunicação em que tudo parece cair de pára-quedas na nossa timeline, quem procura ajuda para jogar RPGs, ou mesmo quem só quer conversar sobre algo que lhe interessa, está invariavelmente sujeito a confusões e interferências.

Toda a riqueza do tal contexto primordial em que as pessoas conseguem ter o seu RPG a funcionar pela primeira vez não encontra largura de banda neste mundo digital. Se já é difícil conversar sobre RPGs cara-a-cara, quanto mais em mensagens misturadas por algoritmos indiferentes às nossas perferências. Mais do que isso, por mais caótica ou descontextualizada que seja a vida online, dela emerge uma cultura própria onde “o RPG” também é representado através de memes que se propagam como todos os outros. Pelo que, deste modo, novas gerações de potenciais roleplayers podem formar as suas ideias sobre o que é “o RPG” sem o contexto de terem um seu primeiro grupo que tenta jogar a sua primeira campanha.

Não será demasiado surpreendente vermos que “o RPG” apresentado pelos memes não difere muito daquele a que um grupo habitualmente chega sozinho. Mas como muito do que define o roleplay está implícito à interacção ao vivo e a cores entre pessoas e como vive sempre de ambiguidades nas quais só quem lá estava é que percebe, este é um caso em que o caminho percorrido é bastante mais determinante do que o ponto de chegada. Todo o roleplayer merece ter o seu primeiro grupo de RPG.

Qual é a tua experiência online? Alguma vez conseguiste ter uma discussão satisfatória? Como comparas as sessões jogadas cara-a-cara com aquelas que podes ter pela internet?

Um contínuo analógico

À medida que ganhamos experência com diferentes actividades no domínio dos RPGs, uma possível progressão que pode nos levar a pensar em criar um RPG poderá suceder-se assim:

  1. Preparar sessões para uma campanha
  2. Adaptar ideias de um ou vários RPGs
  3. Criar cenários para um RPG
  4. Criar RPGs
Arte de Tom Lockwood

Em paralelo, também será de esperar uma evolução no nosso interesse quanto ao jogar com diferentes pessoas, ao conhecer novos RPGs, ao fazer experiências dentro dos vários papéis que podemos desempenhar numa sessão, ao criar conteúdos para os disponibilizar publicamente, etc. Tudo isto é naturalmente uma expressão de quanto gostamos deste hobby, em consonância com o prazer que certamente retiramos do convívio com os nossos grupos, do frisson que sentimos em momentos mais intensos ou do gozo de testemunharmos grandes histórias a nascerem à nossa frente. Muitas pessoas jogam RPGs por estas ou outras razões sem chegarem a se interessar por este domínio no abstracto ou de uma forma altruísta. Mas há uma minoria importante que gosta do RPG pelo RPG e/ou que quer partilhar estes jogos com o maior número de pessoas possível, apontando assim no sentido desta progressão:

1 — PREPARAR SESSÕES PARA UMA CAMPANHA

Sendo verdade que podemos começar a organizar sessões de RPG com o nosso grupo seguindo apenas o que o livro indica e usando cenários pré-feitos (e até personagens já preparadas para se jogar nesses cenários), a partir de certa altura teremos de nós próprios imaginar como uma próxima sessão de uma campanha poderá se desenvolver. É aqui que não só pensamos em como as personagens, eventos, locais, todas as partes do conteúdo ficcional podem evoluir, mas também consideramos como acrescentar mais destes elementos ao jogo. É aqui também que sentimos nem que seja só os efeitos das estruturas narrativas que emergem como um padrão entre as histórias que criamos com outras pessoas. Finalmente, é também de sessão para sessão que ganhamos uma real compreenssão do jogo que é proposto pelos livros, sendo que é habitual verificarmos contradições entre aquilo que o texto explicita e as ferramentas que implicitamente ele dá (ou a falta delas), bem como da maneira como este RPG se encaixa com o grupo. Aliás, o contexto do grupo é relevante para todas estas questões.

A popularidade que certas partes do conteúdo ficcional podem ter entre o grupo não está conscrita ao que é previsto pelo jogo e abrange todo o convívio, sentido de humor e interesses pessoais de cada um. O ritmo e a estrutura das histórias jogadas são fortemente condicionados pela familiaridade que cada pessoa tenha com o tipo de ficção que está a ser recriado ou pela simples disponibilidade para toda a gente estar presente em todas as sessões do princípio ao fim. A concretização daquilo que é proposto pelo livro não se limita a identificar o que é que está menos bem explicado ou suportado pelo jogo, mas acarreta também encontrar uma interpretação que ultrapasse estas dificuldades. O grupo não permite que o RPG falhe.

Que evolução notas na preparação das tuas sessões à medida que jogas com grupos diferentes? Até que ponto pensas na perspectiva de cada pessoa? Como é que certos RPGs até funcionam com um grupo, mas com outro já é mais difícil? Que tipo de histórias notas que as pessoas têm o hábito de replicar? Que arquétipos de conteúdo ficcional se vão repetindo, nomeadamente tipos de personagem? Há talvez ideias que tu gostarias de abordar mas não parece haver lugar para elas? Quais?

2 — ADAPTAR IDEIAS DE UM OU VÁRIOS RPGs

Mas as falhas encontradas num RPG não são indiferentes. A dada altura, podemos já estar cansados de constantemente ajuizar soluções ad hoc e queremos algo mais consistente, algo pré-combinado com o grupo de modo a antecipar problemas. Algo que tanto pode ter a ver com os dados que são lançados como com as premissas do mundo imaginário visto pelos olhos das personagens. E, se não identificamos desde logo um RPG que nos dê estas soluções integradas e prontas para jogar, naturalmente adaptamos aquele que temos e/ou misturamos ideias de vários RPGs. E já não nos limitamos a reinterpretar certos parágrafos menos claros ou a preencher lacunas, pois agora estamos mais confiantes para explicitamente alterar algo que está escrito. No entanto, apesar de o fazermos ao serviço do grupo, a verdade é que este processo de adaptação encontra sempre alguma fricção se insistirmos nele por algum tempo. Habitualmente, o grupo que durante uma campanha se involve neste processo também se cansa de perseguir um alvo em movimento quando não se acerta no que se quer à primeira, ou à segunda, ou à terceira… Sem experiência suficiente, vão-se fazendo apenas alterações incrementais em partes específicas e de sessão em sessão, ignorando a sinergia que o jogo deve estabelecer entre as suas partes para funcionar bem. Além disso, também é habitual verificar-se que este processo de adaptações e misturas é uma tentativa de ultrapassar incompatibilidades de interesses e expectativas entre diferentes pessoas do grupo.

É como se tentássemos reparar uma bicicleta a meio de uma viagem com os nossos amigos enquanto não temos ainda bem a certeza de para onde vamos. É uma aventura definida em grande parte por quem nos acompanha e pelas circunstâncias de cada ponto de paragem. Talvez arranjemos uma maneira da bicicleta ir sempre a descer se optarmos por uma meta que está no fundo de um vale. Talvez acabemos por ir a pé se quisermos mesmo chegar ao topo de uma montanha. Por um lado, é irrelevante se a bicicleta verdadeiramente funciona, o que interessa é o convívio e a experiência. Por outro, a viagem pode tornar-se cansativa ou até frustrante. Será inegável a importância que o contexto do grupo tem nestas situações.

Que aventuras tens para contar de um teu grupo literalmente perdido pelos meandros do RPG? Qual foi o ponto a que chegaram? De que modo o jogo resultante reflectiu a presença de cada pessoa à volta da mesa? Como é que as tuas expectativas evoluíram ao longo da campanha? O que é que do teu ponto de vista foi mais gratificante? E menos?

3 — CRIAR CENÁRIOS PARA UM RPG

Chega uma altura em que tomamos uma iniciativa criativa que não começa no nosso grupo, mas é antes iniciada por momentos de inspiração e reflexão através dos quais fomos construindo uma perspectiva mais abstracta dos RPGs, algo que é mais lato que o nosso contexto pessoal e que pode até fazer chegar as nossas ideias a pessoas que não conhecemos. Um primeiro instante dessa distanciação entre jogo jogado e jogo sonhado pode muito facilmente ser um de paixão por determinado RPG. Temos assim um jogo que desperta em nós mais do que o contexto de um grupo pode satisfazer. Queremos levar a premissa deste RPG mais longe, a cenários que não foram previstos ou que apenas foram reconhecidos implicitamente pelos seus autores. Queremos que haja no mundo mais conteúdo para se jogar este RPG e sentimos em nós uma inquietude para fazer isso acontecer. Consideramos assim os talentos que temos para escrever, desenhar, programar, filmar ou gravar esta nossa expressão de criatividade. Publicar algo que escrevemos será a opção mais habitual.

Paralelamente, o contexto de um grupo em que possamos jogar esse RPG integra-nos num ciclo de inspiração e experimentação: criamos este conteúdo não só influenciados pelas pessoas com quem jogamos, mas também direcionados para o experimentar com elas contando que seja algo de novo e que valha a pena explorar. Mas, em contraste com o ponto anterior, deixar a bicicleta pelo caminho não é uma opção. A ideia que temos na nossa mente tem de funcionar independentemente das circunstâncias nas quais o grupo se quer meter. E aqui deparamo-nos com um interessante ponto de equilíbrio. Tanto há conteúdo prescritivo em que uma proposta é assumida e reforçada por uma série de recursos oferecidos, como há conteúdo descritivo em que o autor pode chegar ao ponto de dizer “não sei quanto a vocês, caros leitores, mas eu no meu grupo jogamos assim esta história”. No momento em que tentamos pôr ideias no papel podemos tomar consciência de como a nossa linguagem é suportada não só pelos livros que lemos, mas também pelas conversas que temos com quem jogamos: as suposições, o humor, as personagens, os tempos gastos, as justificações. Estes ritmos, estes hábitos tornam-se parte daquilo em que pensamos quando pensamos em RPGs, são o cenário dos nossos cenários.

Que RPGs contam com as tuas contribuições no seu espólio criativo? As tuas criações reflectem mais cenários que tu gostarias de jogar ou cenários que já jogaste com um teu grupo? Que ideias são transversais aos teus jogos jogados e jogos sonhados? Que transformações elas sofrem entre as mesas de jogo e as páginas que escreves? Que saltos dás para longe daquilo que conheces? De que referências pessoais não abres mão?

4 — CRIAR RPGs

Quando nos perguntamos anteriormente se o RPG funciona, vimos quão comum é a experiência de encontrarmos um jogo fraquinho que é salvo pelo voluntarismo de um grupo que força as coisas a funcionarem. Por isso, estão em minoria os roleplayers que se acham capazes de talvez melhorar este estado de coisas criando o seu próprio RPG. Como podem se imaginar a dizerem aos outros como jogar? Não é o grupo 100% responsável pelo que acontece à mesa de jogo? Que relevância pode ter um autor que escreve algo que alguém eventualmente lê e a seu tempo mostra a outras pessoas para talvez jogarem? Podemos dizer que tem toda a relevância e nenhuma.

Criar um jogo não é fácil, pois parte sempre de alguma presunção de originalidade e de utilidade. Acreditamos que estamos a acrescentar algo de útil ao enorme universo dos RPGs. Presumimos que alguém dificilmente chegará aquilo que propomos se não tomar conhecimento daquilo que temos para oferecer. Imaginamos que esta pessoa não está a jogar com o seu grupo do modo que sempre jogou recusando saber de mais nada e que nos dá um pouco do seu tempo para termos a oportunidade de lhe dizer como jogar talvez de maneira diferente. Em contraste com o ponto anterior em que nos dirigimos a alguém que já joga um RPG e lhe perguntamos se quer mais do mesmo, temos agora o desplante de tentar que alguém se apaixone pelo nosso jogo. Que alguém crie conteúdo para um RPG feito por nós.

Projectando-nos assim nos céus da nosssa criatividade, ficamos bem distantes da pessoa que somos nos nossos grupos de RPG. Pensamos nos jogos que criamos como estrelas que terão talvez um lugar nas várias constelações de RPGs que conhecemos. Tantas maneiras diferentes de jogar e tantas pessoas diferentes, todas potencialmente distintas do nosso contexto pessoal, do que sabemos e do que compreendemos. O que é que temos para dizer ao universo? Como podemos comunicar criativamente para fora do contexto do nosso grupo?

E, se um roleplayer conseguir expressar-se assim criando um RPG, as pessoas com quem ele joga estarão ainda presentes nos seus jogos? Quando lemos um RPG, o que é que podemos especular sobre o grupo no qual o autor costuma jogar? Que podemos dizer de um John Wick, de um Luke Crane ou de um Vincent Baker? Quem estará por trás dos seus “clérigos”?

Como cada pessoa segue o seu percusso, também é de assinalar a possibilidade dos próprios grupos em que jogamos evoluirem connosco e que, além de serem o contexto que se esconde por trás das nossas ideias, poderão ser também pessoas com quem as testamos e discutimos ou até outros criadores de RPGs com quem poderemos jogar. Nesta espiral criativa, é possível voltarmos ao primeiro ponto desta progressão num ciclo que nos faz voltar a casa para de novo partirmos em busca de outros feitos. Para melhor sabermos construir, temos de também saber desconstruir os nossos castelos de areia.

Que experiências de publicação já tiveste? Alguma vez criaste um RPG para o ofereceres a alguém em particular? Quem poderá estar por trás dos teus “clérigos”? Quais as semelhanças e as diferenças entre “o RPG” que tu aprendeste e aquele que procuras ensinar? Que ideias essenciais para ti sobrevivem ao virar dos anos? Que projectos já abandonaste ou conseguistes recuperar? Qual é o papel que os teus grupos de jogo tiveram nas tuas iniciativas criativas? Que importância sentes que este tipo de contexto pode ter nos jogos dos teus autores favoritos?

Design & Teoria dos RPGs é uma série de artigos movidos pela paixão de criar e jogar. Podem ser lidos aqui no Medium e alguns também podem ser ouvidos nesta playlist de vídeos. Partilha os teus favoritos com os teus amigos roleplayers e contacta o autor no Twitter ou através do e-mail jogadorsonhador arroba gmail ponto com.

Ricardo Tavares foi o criador do podcast “Jogador-Sonhador”, o primeiro podcast sobre RPGs em Portugal. Foi também organizador do evento criativo RPGénesis em todas as suas edições e escreveu uma variedade de RPGs, cenários e adaptações. É um dos anfitriões do grupo Roleplayers - Porto que procura promover o hobby dos RPGs nesta cidade. Fez parte da administração do site abreojogo.com (antigo RPG Portugal).

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