PRECISAMOS DE MAIS PRETOS NO DESIGN: O que podemos fazer para mudar esse panorama?
O contexto pandêmico em que vivemos trouxe consigo diversas mudanças, pois acelerou o desenvolvimento de tecnologias que seriam vistas só nos próximos anos, como as mudanças nos locais de trabalho que passaram a ser home office, a virtualização de diversos espaços físicos como museus, locais de exposição de arte, eventos de games, etc.
Com todo esse novo momento acontecendo, não podemos deixar questões sociais de lado como a presença dos pretos no mundo do design, área que foi muito explorada durante a pandemia, tanto na criação de novos produtos e meios digitais (design de produto e design digital), como nas diferentes formas que as marcas se posicionaram durante a pandemia (design gráfico, UX, etc.).
Dados para reflexão
Com a política de cotas, tivemos avanço em gerar mais oportunidades de ingresso na universidade para os pretos, porém ainda são poucos os que entram nos cursos relacionados ao design.
“Diferentes levantamentos, feitos por veículos de imprensa — jornal Nexo e portal G1 -, mostram alguns dos avanços da política de cotas e que o acesso ainda não é o mesmo em todas as áreas. Eles se baseiam nos dados do Censo da Educação Superior de 2016, edição que mostrou a distribuição de estudantes negros no país. Um comparativo do Nexo entre os cursos mais procurados mostram que as graduações que mais incluem alunos pretos e pardos são Serviço Social, Licenciaturas em Letras e em Química, Recursos Humanos e Enfermagem. Já os que contavam com o número menor de pretos e pardos eram Medicina, Medicina Veterinária, Engenharia Química, Design e Publicidade e Propaganda. Dos 50 cursos considerados pelo levantamento do jornal Nexo, nenhuma engenharia tinha mais de 50% dos alunos pretos e pardos.” Felipe Mateus, via Jornal da Unicamp.
Agora partindo para a o mercado de trabalho, segundo os resultados da pesquisa Panorama UX 2020: Diversidade, que investiga todos os anos o perfil de quem trabalha na área de UX (uma das áreas que pagam melhor no design):
“A maioria, 73%, se identifica como branco, 15% como pardo, 5% negro e 3% asiático. Uma representatividade de raças bem diferente da distribuição demográfica brasileira.”
A partir desses dados, é fato que os pretos têm pouquíssimo espaço no mundo do design e pouco chegam nas áreas onde o salário é maior, ficando em empregos que muitas vezes não representam a sua formação. Isso se reflete não só em números de designers, mas em toda a cadeia ligada a isso, como em mockups e fotos, projetos de design, arte, etc.
Nessa pandemia, quando peguei meus primeiros trabalhos de design, percebi que na hora de procurar imagens e mockups de pessoas pretas, a maioria delas eram pagas (o que dificulta o seu uso) e haviam poucas com pretos em altos cargos da sociedade, em contraste com fotos e mockups de pessoas brancas, que se acha de graça e de todas as formas possíveis.
Há bancos de imagens como o https://nappy.co/ e https://ygb.black/ que se propõem a divulgar de graça as fotos de pessoas pretas, porém ainda sinto falta de algo que mostre a realidade dos brasileiros, pois em projetos, precisamos colocar fotos condizentes com a realidade do nosso país e utilizando as fotos desses bancos de imagens estrangeiros, fica fácil notar que são de pessoas de fora do nosso país.
No Brasil, temos a iniciativa DNBR (Designers Negres no Brasil), que já é um começo para a divulgação dos designers pretos do país.
“O DNBR (Designers Negres no Brasil) quer reunir milhares de profissionais com objetivo de estimular ainda mais a visibilidade nacional de pessoas pretas em design.”
Plataforma Mais Pretos no Design
Em pleno 2020, o racismo ainda atinge todas as áreas humanas e no design não é diferente, por isso, precisamos como designers socialmente responsáveis criar meios para que haja condições justas de voz e visibilidade para todos.
Diante desse panorama, resolvi criar a plataforma “Mais Pretos no Design”, onde o foco é dar visibilidade para o design feito por pretos de todo o Brasil. Nessa plataforma, via redes sociais, vamos usar a hashtag #maispretosnodesign para divulgação de designers, projetos, mockups, fotos gratuitas de pretos em altos cargos da sociedade e em diversas profissões, arte e cultura preta e tudo mais que possa ser linkado.
Com a campanha em pleno funcionamento, teremos maior uso e demanda por mockups, fotos e projetos de pretos, gerando uma maior representatividade nesse mundo onde a branquitude impera. Futuramente, a ideia é virar um repositório brasileiro de design feito por pretos, para que estes saiam da invisibilidade histórica imposta e tenham seus projetos e estudos expostos em uma plataforma de abrangência nacional, sendo reconhecidos o suficiente para aparecer nas bibliografias básicas das faculdades brasileiras.
Posteriormente, teremos um site para publicação de projetos, notícias, estudos, fórum de debates e itens da marca sendo comercializados (como as camisetas que estão no post acima), para que este seja um movimento que extrapole o virtual e ganhe as ruas, sendo motivo de orgulho por parte de seus usuários.
Nas redes sociais, a página irá encorajar discussões design-raça por meio de lives com designers pretos de todas as áreas do país, para que sejam levantados novos meios de combate ao racismo estrutural que está enraizado na cultura brasileira.
A plataforma teve como inspiração o movimento Black Lives Matter, que teve grande destaque nessa pandemia por pedir o fim do racismo policial e na fala em um vídeo de um ilustrador que assisti há muitos anos atrás, em que ele pedia para as pessoas usarem pretos nos seus projetos de arte, pois não há tantas pinturas de pretos como há de brancos, tendo essa fala um impacto muito grande em mim e na minha carreira como designer. Ela foi concebida na matéria da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) de Design Digital chamada “Design em Tempos de Pandemia” dentro da aula da professora Roberta Coelho Barros, que se chama Design socialmente responsável (em tempos de pandemia)”.
Considerações Finais
Tendo em vista os aspectos observados é imprescindível que todos se conscientizem de que precisamos de mais pretos no design, pois com sua maior presença, teremos um design mais amplo e que abrange melhor a diversidade racial do nosso país, incorporando ideias que hoje são pouco ouvidas e pouco utilizadas.
Como designers, acredito que devemos ter ideias que geram impacto na vida das pessoas e que agregam diferentes saberes, seja por meio de campanhas como a Mais Pretos no Design, como por palestras, workshops, diálogos em salas de aula, etc. que abordem os mais diversos temas sociais do país.
Acredito que com a campanha Mais Pretos no Design no ar, consigamos trazer foco e ação para essa discussão tão pertinente e que vem ganhando espaço nos últimos anos.
Não deixe de nos seguir nas redes sociais, o projeto está em fase inicial e será posto de pé em 2021.
Instagram @maispretosnodesign
Facebook @maispretosnodesign
E não se esqueçam, Precisamos de Mais Pretos no Design.
REFERÊNCIAS:
Carolina Leslie. Resultados da pesquisa Panorama UX 2020: diversidade. 2020. Disponível em: https://www.dw.com/pt-br/fa%C3%A7a-voc%C3%AA-mesmo-e-sua-hist%C3%B3ria-na-alemanha/a-19278728. Acesso em 06 dez. 2020. Acesso em 13/12/2020.
Hon Porfirio. A história do Cadê os Pretos no Design. 2019. Dísponivel em: https://medium.com/@honporfirio/a-hist%C3%B3ria-do-cad%C3%AA-os-pretos-no-design-4213c484ba1f. Acesso em 13/12/2020.
Edison Silva. Percentual de estudantes negros nas universidades ainda é baixo. 2020. Disponível em: https://blogdoedisonsilva.com.br/2020/11/percentual-de-estudantes-negros-nas-universidades-ainda-e-baixo/. Acesso em 13/12/2020.
Designers Negres no Brasil. 2020. Disponível em: https://designersnegresnobrasil.com.br/. Acesso em 13/12/2020.
Felipe Mateus. Jornal da Unicamp - Racismo no mundo acadêmico: um tema para se discutir na universidade. 2019. https://www.unicamp.br/unicamp/ju/noticias/2019/11/19/racismo-no-mundo-academico-um-tema-para-se-discutir-na-universidade. Acesso em 13/12/2020.
