O VAZIO
DA REALIDADE VIRTUAL
O experimento proposto foi desenvolvido em linha com a análise da música “TERRA” de Caetano Velso em que foram selecionadas 10 palavras marcantes de sentimentos e sensações que são: Saudosismo, Lembrança, Herança, Nostalgia, Inesquecível, Origem, Conexão, Paixão, Memória e Terra. Também em linha com o tema da relação “Corpo e Cidade”, tiramos o insight de que Caetano olha a Terra e sente falta do lar, percebe o espaço vazio entre ele e o mundo. Da saudade do lar e da cultura vinha uma necessidade de reconexão, a construção de uma figura de alguém que está “longe de casa”, um imigrante forasteiro. Este personagem — o “forasteiro” que está longe de casa, busca se reconectar com seu passado, memórias e cultura, mesmo estando em outro lugar.
PRIMEIRA ETAPA: IMERSÃO NA CIDADE
O contexto de pandemia trouxe inicialmente algumas implicações práticas sobre os espaços da cidade e quais situações de observações seriam possíveis de se realizar, dentro de bairros representativos e característicos, por exemplo. Desta imersão, encontramos um comerciante boliviano que vendia comida de sua cultura e que durante a pandemia essa possibilidade de “compartilhar” seus costumes e a si mesmo foi limitada. O que gerou um grande desajuste — as pessoas foram e deixaram nele e na cidade um vazio. Um vazio cuja sensação é correlata com a de um forasteiro: “um dia eu vou voltar para o local da minha origem”.
Um sentimento de “vazio” que fez o personagem não ser percebido, não ser identificado, não ser encontrado, nem por ele, nem pelos outros, pois ele vende e representa sua cultura. Porém, mesmo vivendo e enraizado na sua cultura (com suas tradições culinárias como forma de resgatar o seu passado e herança) busca a evolução e o adiante. E esse adiante não é um caminho que o leva de volta para “casa” nos lembrando da música Terra, quando Caetano preso, vive a nostalgia de sua terra ao vislumbrar o futuro — uma foto do planeta tirado do espaço. Ver o tempo correr o fez sentir com nostalgia o tempo que viveu e de onde veio. A feira vazia trouxe um certo tédio ao vendedor a espera por clientes. Ou seja, existe uma percepção de que há saudades de apresentar sua cultura para outros que não a conhecem. “O corpo também é presença e sua ausência também é sentida — o corpo em movimento preenche este o vazio”.
SEGUNDA ETAPA: ENTENDER A IDEIA E O SENTIMENTO DE VAZIO
Seguimos então para uma etapa de discussões de como poderíamos entender melhor esse vazio? O vazio da cidade na pandemia ficou em evidência, a ausência dos corpos tornava a cidade vazia. A dinâmica entre a cidade e os corpos é a narrativa do lugar. Os corpos vivem a cultura do lugar e a formam. Analisar e ver a cidade “vazia”, o arquétipo do “vazio” — o vazio da cidade, a saudade do lar, um pedaço que falta e a pausa no tempo. O que é o vazio para nós? E o que é o vazio para o forasteiro?
Sair de cena, refletir entre nós como analisar e fazer experimentos capazes de gerar sentimentos para entender o “vazio” e seus contrastes. Exemplos: ser observador/ser observado, como o ambiente me afeta e me constrói? Quanto mais exposto, mais vazio eu me sinto? Como me achar nesse vazio? Entender a dimensão que meu corpo dá nesse vazio! Através de uma nova imersão na cidade, foi escolhido um novo local que pudesse gerar a sensação de vazio e entender por exemplo como é a vida de alguém que precisa vender e ter contato com clientes e não consegue vender, por estar em um lugar completamente vazio. O local escolhido na nova imersão foi o Shopping Città — complexo empresarial e comercial.
Das ações de ficar a maior parte do tempo sentada esperando algo acontecer, ou que alguém viesse conversar, ao mesmo tempo que andar vagamente, enquanto tentava analisar e observar quantas pessoas entravam e saiam, quantas pessoas estavam comprando algo ou comendo, vieram os sentimentos e sensações de desconforto corporal, frio, audição aguçada pelo silêncio do entorno (percepção de eco ao redor), tédio, solidão, abandono e além de tempo perdido, como também de que as poucas pessoas presentes ali não queriam estar.
TERCEIRA ETAPA: EXPERIMENTAÇÃO COM REALIDADE VIRTUAL
Em conjunto e em continuação ao contexto de pandemia, além de buscar por um lado capaz de explorar melhor a sensação de “vazio” de uma relação individual já que de forma generalizada seria insuficiente, partimos para um experimento de recolocar os corpos nas cidades onde viveram, pois a origem de cada um é diferente além da sensação de completude também ser diferente para cada um. Tentar resgatar o saudosismo e o vazio que é a “ausência” do lar, através da busca de pessoas que tiveram a experiência de viver e/ou migrar de uma cidade natal para outra. Foi tomada a decisão de usar vídeos de realidade virtual prontos, porém através de uma seleção que pudessem despertar os sentimentos correlacionados aos temas sendo o seu conteúdo tour virtuais em cidades e com um roteiro de entrevistas e perguntas antes e depois da imersão na realidade virtual.
Formulário Antes:
- Qual o seu nome?
- De onde você é?
- De onde sua família é?
- Do que você sente falta em sua cidade?
- Do que você não sente falta?
- Faz quanto tempo que você não vai para lá?
Formulário Depois:
- Como foi essa experiência?
- O que te lembrou?
- Você sente um vazio ou não?
- A cidade te lembrou de algo?
- Como você se sentiu com o seu corpo estando de volta nessa cidade?
- Ver a cidade virtualmente foi suficiente?
- Você se sente feliz ou sente mais saudade após a experiência?
Participantes convidados:
INSIGHTS E CONSIDERAÇÕES FINAIS: A CIDADE COMO UM PALCO
É de outro corpos que as pessoas sentem falta? O corpo habita na cidade, mas é ele que constrói a narrativa ou enxerga a narrativa. Eles sentem falta das pessoas e cultura, não da cidade. O vazio é percebido pela falta de pessoas! A saudade das cidades é das pessoas, não do lugar. A cidade é mutável — aquilo que sentimos saudades as vezes nunca mais vai ser possível reviver. Nós achávamos que o corpo e a cidade compunham uma narrativa e que a ausência da cidade causava nostalgia. Nossa hipótese era: levar os corpos para as cidades iria amenizar esse vazio. Descobrimos que não — que essas cidades não existem mais, que as pessoas não são mais as mesmas e que o vazio é de toda uma cultura/narrativa e de outros corpos que existiu e não existe mais. É uma fome que nunca vai ser saciada. A memória é tão inesquecível que eles não desapegam do que foi, e não se conectam ao hoje.
POSSÍVEIS DESDOBRAMENTOS: INTERVENÇÃO NO MUSEU DO IMIGRANTE — SP
Para finalizar, imaginamos como seria uma possível aplicação desse experimento através de uma intervenção no Museu do Imigrante em São Paulo. O intuito é gerar sensações personalizadas aos visitantes e coletar relatos e opiniões dos mesmos com o seguinte blueprint de design service (agradecimentos a Prof. Fernanda De Divittis):
Obrigado!
Trabalho realizado por: Ana Paula, Antonio, Bruna e Naemy.
Turma: 2020.2 | Pós-Graduação em Design Estratégico.
Disciplina: Design Experimental
Prof: Anderson Penha
IED — São Paulo
Originally published at https://medium.com on August 25, 2021.