O Slow Design como forma de pensar os modos de produção e o consumo.

Fernando Alves
DesignUrbano
Published in
6 min readJan 4, 2023

Esse texto é adaptado da pesquisa do meu Trabalho de Conclusão de Curso intitulado “Desenvolvimento de Mobiliário com Referência Ao Modernismo Brasileiro A Partir Dos Conceitos Do Slow Design” (Fatec Tatuapé — Curso de Design de Produto — 2022).

O Slow Design é o movimento global que vai em busca de ferramentas para desacelerar o consumo através da conscientização, valorizar a produção local através do desenvolvimento econômico e social sustentável e projetar itens que tenham um melhor ciclo de vida, sendo mais durável e que tenha melhores formas de descarte.

O termo foi usado pela primeira vez pelo designer, escritor e professor Alastair Fuad-Luke, em 2002. Fuad-Luke acredita que o aumento do conhecimento de questões sustentáveis “estimula a comunidade do design a atuar em mudanças para com o meio ambiente e para uma maior responsabilidade social” (RODRIGUES, apud LUPO, 2019).

O professor propõe que a forma de produção seja repensada, levando em consideração as necessidades sociais, a partir da preocupação com o bem-estar de todos os envolvidos no processo; das necessidades ambientais, pensando no meio ambiente como fator a ser preservado; e contemplado um mercado virtuoso, que possa alinhar as preocupações sociais e ambientais com uma produção industrial lucrativa.

De acordo com Voronovicz e Zacar (2011), o conceito de Slow Design então parte de 4 premissas básicas:

  1. Caminhar em direção a um novo modelo de sociedade, valorizando o bemestar individual e global, incentivando o design com foco na sustentabilidade e estimulando os consumidores a serem indivíduos conscientes e críticos nas suas escolhas;
  2. Considerar a dissociação dos pensamentos econômico, tecnológico e político atuais e prever que estes devem seguir modelos que contemplam os pressupostos do Slow Design;
  3. Adoção do abrandamento do metabolismo social, ou seja, reduzir os fluxos das transformações humanas, econômicas e industriais;
  4. Considerar que a dissociação dos modelos atuais de consumo representa uma oportunidade para explorar a durabilidade do design.

Dessa forma, pode-se perceber que são diversos e complexos as premissas que norteiam um projeto a partir do slow design. Para que um produto seja considerado slow design, ele precisa estar em consonância com os 6 princípios listados por Alastair Fuad-Luke e Carolyn Strauss.

A partir dos 6 princípios do Slow Design de Fuad-Luke, percebe-se que os conceitos trazidos por estes, tem caráter próprio, onde o design se coloca acima do papel de um simples objeto e passa a existir como apoio a causas sociais, ambientais e culturais (RODRIGUES, 2019) e se coloca à disposição como catalisador de mudanças na sociedade. Ou seja, um design que seja slow precisa seguir preceitos que irão além da fabricação massiva e do uso alienado, sendo feito para e pensando no indivíduo e não apenas no lucro das corporações.

Como um exemplo de Designer que cria levando em consideração princípios do Slow Design, podemos citar Zanini de Zanine. A abordagem do designer é caracterizada por uma atitude em relação aos materiais acompanhada da reciclagem como condição obrigatória. Isso se reflete no uso de madeira recuperada, matéria prima já enraizada na cultura brasileira, e no reaproveitamento e reciclagem de outros materiais como plástico, metal, palha etc.

Em entrevista para a Revista Planeta (2013), o designer avalia que há uma trava cultural ainda no Brasil para que os processos slow possam ser trabalhados e que, por causa das pesquisas aprofundadas que esses projetos demandam, acabam tendo seus lançamentos não assimilados.

“Acredito que a única forma de equilíbrio seria uma reeducação com campanhas que abordem o assunto, acelerando assim essa assimilação”, diz o arquiteto. A tarefa não parece simples. A percepção da necessidade de desaceleração também sofre de abrangência limitada, na opinião de Zanini. “Não vejo esse aspecto muito claro para todos. Vejo marcas e lojistas sedentos por novidades instantâneas, perdendo assim a oportunidade de valorização de peças duráveis com projetos de fabricação de pouco impacto.” O consumidor da Europa, por sua vez, é o que está mais ciente das novas direções, “mais do que em qualquer outro lugar”, conclui

Poltrona Moeda (2009) — Zanini de Zanine, designer adepto do slow design.

Dessa forma, o Slow Design pode ser entendido como um processo de criação que desenvolva produtos que tragam valores como o resgate de técnicas, a colaboração, a sustentabilidade e a durabilidade. Não se trata de demorar para desenvolver um produto, mas de entregar valores que criem vínculos mais afetuosos com o objeto e trabalhar o design para um maior propósito com o trabalho.

Slow Movement

O Slow Movement é um movimento que tem desafiado o culto à velocidade, pregando a desaceleração, a qualidade de vida e a qualidade nas relações pessoais. Carl Honoré, escritor e jornalista escocês, vem sendo o maior divulgador das ideias desse movimento através de diversas publicações. O autor cita que o Slow é um movimento cultural que luta contra a noção de que a rapidez é o melhor caminho a se seguir (Honoré, 2004).

De acordo com Batista et al (2013), a filosofia Slow não propõe uma simples desaceleração, não traz uma ideia de “parem as máquinas”, mas sim que as atividades devem ser feitas numa velocidade certa que corresponderia com satisfação e qualidade de vida. A reflexão sobre o movimento Slow é a de que não devemos voltar às eras pré-industriais, mas sim conseguir chegar a um equilíbrio para que se viva nessa modernidade, que está dentro de um contexto “hiper-capitalista”, de forma mais qualitativa.

A partir do movimento Slow, diversos outros vêm surgindo como desmembramentos deste, em diversas áreas, como por exemplo: a alimentação — através do slow food, já discutido desde os anos 1990 na Europa, que busca uma alimentação mais saudável e melhor aproveitada -, a moda e a arquitetura — com o slow design, que tem por prioridade fazer uma reflexão sobre a produção e o consumo de produtos a partir de um viés de responsabilidade ambiental, social e econômica -, a decoração da casa — com o slow living, que busca criar espaços de refúgio e relaxamento em casa –, saúde — com o slow medicine, que exige mudanças na prática médica-, e a criação dos filhos — através do slow kids ou slow parenting, que prega que crianças sejam crianças, brinquem e tenham menos atribuições.

Conclusão

O Slow Design, apesar de ser uma nova forma de pensar o design, vem se tornando parte difundida de um novo pensamento de sociedade, que se propõe mais crítico, humano, justo, funcional e sustentável.

Muitas pessoas já não pensam mais o mundo de forma fast , abrindo espaço então para que a produção e o consumo desenfreado possa ser repensado. O Slow tenta chamar atenção das pessoas para a construção de uma sociedade mais justa, funcional e sustentável, se conectando a tantos outros conceitos encontrados quando se fala em sustentabilidade e design, mostrando que se encontra alinhado aos anseios da da sociedade atual.

Bibliografia

FUAD-LUKE, Alastair. Slow Theory a paradigm for living sustainably? 2004. Disponível em: https://fluido.files.wordpress.com/2006/07/slow-design.pdf. Acesso em Junho de 2022

LUPO, Eleanora. Slow Design: “cultivating” culture and sensoriality in the artifacts shape and use. 2012. 28 p. 44–55. Disponível em: http://www.raco.cat/index.php/Temes/article/view/263247. Acesso em set de 2017.

RODRIGUES, Isabela Torres. Slow Design no Brasil : Uma Primeira Abordagem. UNIFESP, São Paulo. 2019

--

--