Catastrófico
2016 tem sido (foi?) um ano formativo pra mim. Na verdade, acho que todos os anos da minha vida adulta têm sido muito formativos pra mim, não vejo a hora de ter um pacífico, talvez até sabático em relação a essa minha constante formação. Mas que 2016 tem sido formativo, ah, isso ele com certeza tem. E tudo isso por causa de uma simples decisão que eu finalmente tomei no mês de Julho. Aliás… Que tomei e não voltei atrás por algum motivo qualquer. A decisão de ir ao psiquiatra.
Alguns amigos sabem bem que eu já havia resolvido procurar esse tipo de ajuda inúmeras vezes, quase sempre no meio de alguma crise existencial, e acabava deixando pra lá. O que estava me incomodando acabava passando e eu voltava a um estado de contentamento padrão (estupor?) e me convencia que aquilo era desnecessário. Até que disse ‘basta’ e dei esse passo depois de alguns episódios particularmente ruins. (Não há registros desses episódios particularmente ruins. Minha sanidade não se afeta tanto assim.)
Depois de pedir algumas indicações a um amigo que é médico, acabei encontrando meu psiquiatra no Google mesmo. O site era bonito, bem feito e bem escrito. Se eu tivesse encontrado um erro ortográfico, jamais teria marcado uma consulta com ele. (O que é algo que eu talvez deva mencionar em alguma consulta. Esse tipo de neura pode não ser saudável. Eu devia anotar essas coisas.) Então peguei o número, liguei e marquei um horário. Foi uma das melhores coisas que eu já fiz. (Pensando bem, talvez eu devesse fazer outras coisas que decido e depois desisto. Tipo a tatuagem que eu já tô me devendo há uns três anos. Mesmo tipo de decisão, né?)
Tive a sorte de encontrar um excelente profissional com quem me dei muito bem logo de primeira. OK, logo de primeira é um exagero, houve alguns momentos de estranheza na primeira consulta quando ele usou uma palavra que parecia muito com uma outra palavra e a minha mente imunda não conseguiu deixar passar (maturidade zero, eu sei). Mas, em geral, nos demos bem muito rápido. É possível que eu tenha me esforçado um pouco mais que de costume pra me dar bem com ele pra fazer valer o preço da consulta (amarrados of the world, unite!), mas é o tipo de situação na qual os meios justificam os fins.
Falar sobre si mesmo para uma pessoa que não te conhece é uma experiência muito interessante. É como se você tivesse uma tela em branco para se pintar da forma que se vê, o controle é todo seu. Você poderia até se aproveitar da situação pra se mostrar como acredita que outras pessoas te vêem. Mas não usei a situação para testar a forma como a minha mãe me vê e confirmar minhas suspeitas de que qualquer psiquiatra me diagnosticaria como um narcisista patológico; fui sincero e falei sobre como eu de fato me sinto sobre mim mesmo, a vida, o universo e tudo mais — um pessimista patológico. Essa pode ou não ter sido uma boa ideia. Ainda não decidi. Mas continuei firme nessa abordagem em todas as consultas desde então.
Claro que, depois que eu choro minhas pitangas, é a vez dele falar— tão impassível que nem parece que acabou de ver um homem adulto e maior que ele quase(?) chorar falando de coisas que aconteceram há mais de uma década.
Minha experiência com psiquiatras se resume a esse único indivíduo, mas acho que encontrei um que realmente sabe o que está fazendo. Ora, logo de primeira ele já deixou claro que me achava catastrófico e infantil. Também já me chamou de petulante. Acho que é assim que você sabe que o babado é certo: ele está te cobrando uma pequena fortuna por uma hora do tempo dele e nem por isso deixa de dizer umas verdades na sua cara. (Ou talvez eu ter gostado disso signifique alguma coisa que eu ainda não havia identificado sobre a minha personalidade, mas, seja como for, a despesa está valendo.)
Eis que ele me diagnosticou com Transtorno de Ansiedade Generalizada. No shit, Sherlock. O arrá (ahá? a-há? Como se escreve essa interjeição?) veio mesmo no tratamento. Depois de alguns ajustes na medicação, eu tenho me sentido melhor que me senti por muito tempo. Ele também identifica erros de raciocínio que eu cometo nas minhas decisões e ressignifica alguns episódios que relato. O resultado tem sido que minhas relações interpessoais e minha autoestima se transformaram pra além do que eu achava que estava no domínio das possibilidades e continuam progredindo. A seis meses atrás nada disso parecia possível e eu previa uma vida inteira de dor e sofrimento. (Catastrófico, não nego, exagero quando puder.) Várias coisas continuam imperfeitas, claro, mas me incomodam bem menos, e eu lido bem melhor com elas. E agora eu acredito que talvez eu não termine a vida como um ermitão que vive com duas dúzias de gatos e é comido por eles horas depois de um inevitável infarto fulminante, como dizem as escrituras. (Mas essa sempre vai ser uma distinta possibilidade, sejamos realistas.)
Então acho que é isso. Eu não sabia bem onde eu queria chegar quando comecei a escrever esse texto, mas acho que a mensagem é aquela de sempre: tá uma merda, mas tem jeito. Talvez o jeito seja aceitar que você tem uns parafusos soltos na cabeça, e não há nada que se envergonhar disso. É super normal e você continua sendo lindo(a), cheiroso(a), inteligente e tendo uma bundinha gostosa pra cacete. Não deixe a ansiedade e a depressão te privarem de viver como você merece. Procura uma ajuda e vai lá ser gauche na vida, prometo que vale a pena.