Cama fria

e um pássaro falante não tão mágico

Devanil
Devaneios em Contos
2 min readOct 22, 2013

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Dia quente. Cama fria.

A cama sempre esteve fria. Refletia o seu corpo. O seu coração. Um vento frio também começou a balançar a cortina verde, do nada. As grades, que eram pequenas, permitiu a passagem de um passarinho, que pousou na beira da janela, e ficou olhando fixamente nos olhos dele, que ainda esfregava os olhos, que ainda procurava a coragem pra levantar.

— As grades são pequenas —, ele notou.

— Surpreso?— perguntou o passarinho.

— Oi? Pera… Um passarinho está conversando comigo?

Ele estava conversando com um pássaro. Foda-se como isso ocorreu.

— As grades são pequenas. — o passarinho insistia na afirmação. Ou seria ele?

— Da onde você vem?

— Da onde geralmente veem os passarinhos.

— De algum local mágico? — ele estava tão bobo e fascinado.

— Não, do céu. Estava voando por aí e vi essas grades pequenas. Quis fazer um desafio de ginástica e passar por elas.

— Mas você fala! Como você não vem de um local mágico? Se eu entrar pelo armário você vai me levar pra algum mundo espetacular? — Ele correu em direção, abriu o armário, e ali só estavam as suas roupas.

— Não há nenhum mundo mágico. — O passarinho parecia meio entediado. Parecia falar com pessoas todas as manhãs.

— Então… Nós vivemos em mundo mágico?

— Olha ao seu redor, porra. Isso é um mundo mágico?

Ele olhava ao redor. Era tudo igual. Menos um passarinho. Falando. Sim, aquele mundo era mágico.

— Por que eu falo, né? Isso que você quer saber?

— Não! Eu quero saber como é voar.

— Voar? Eu te pergunto: como é andar?

— Andar?

— Sim, andar, com suas duas pernas. É assim que você se locomove.

— Ah, é normal. Não há nenhum sentimento em especial.

O pássaro ficou em silêncio, bicando suas penas.

— Então, você não respondeu. Como é voar?

— Você respondeu!

— Você tá me dizendo que voar é normal? Você não se sente livre?

— Você se sente livre andando?

Ele estava frustado. O pássaro não estava lhe ajudando em nada em ter um momento incrível. Ele estava falando com um pássaro. Achou que esse momento seria mais… mágico.

Eis então que o pássaro começou a voar, indo embora. Ele correu até a janela, e gritou para que ele lhe esperasse. O pássaro parou e ficou batendo as asas imóvel, como um beija-flor.

— Você veio até aqui, falou comigo, e não tem nada a me dizer?

O pássaro ficou parado por um tempo.

— Sim, tenho.

Mais um silêncio. Era agora que ele esperava que a mágica iria acontecer.

— Coloque uma tela de proteção na sua janela.

E foi embora.

Twitter: @Devanil

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