Levels até o good ending no desenvolvimento de jogos

Texto Letícia Dutra
Ilustração Letícia Dutra, Isadora Fontenele

Glossário

Tasks: tarefas ou atividades que os membros realizam.
Game: palavra ‘jogo’ em inglês
Levels: palavra ‘níveis’ em inglês (no texto, muito usado para se referir à níveis nos jogos)

O desenvolvimento de jogos é como uma longa e árdua jornada, você precisa enfrentar o frio cortante, o deserto escaldante e a enorme correnteza de tasks que lhe aguarda (metaforicamente, claro). Emocionante, como o próprio game que você pode desenvolver. Não se assuste com essa introdução dramática, desenvolver jogos é extremamente divertido, e você vai entender melhor a árdua jornada no momento em que tiver que fazer um Sprint Planning. Mas não tema! Esse texto tem a intenção de guiar você pelos levels até chegar ao seu good ending na criação de um jogo, e utilizarei como exemplo o processo de desenvolvimento do jogo “Totalitaire”.

Level 1

Missão: Organize sua party!

Quando você decide criar um jogo, o primeiro passo é montar sua equipe. Isso vai facilitar bastante a organização do seu projeto, já que cada membro terá suas responsabilidades específicas. Certifique-se de considerar os diferentes “departamentos” necessários para construir o jogo e distribuir os membros de sua equipe de acordo com a carga de trabalho de cada área. Por exemplo, normalmente temos mais programadores, porque há muitas tarefas relacionadas à programação durante todo o projeto. No entanto, isso não significa que haja poucas tarefas para os designers ou artistas; na verdade, há muito a ser feito, especialmente no início do projeto, quando se discutem aspectos como a interface do jogo, que são os elementos que irão persistir durante todo o desenvolvimento. Portanto, é importante não apenas distribuir bem a equipe, mas também garantir uma distribuição equitativa das tarefas durante as sprints para evitar sobrecarregar os membros.

Missão: Organize sua sprint!

Para garantir a conclusão das tarefas, mesmo diante de um grande volume de trabalho e uma equipe com recursos limitados, é fundamental ter um planejamento de sprints bem estruturado com prazos realistas para cada tarefa. Você já ouviu falar do planejamento de sprint? Reúna todos os membros da equipe e coloque em discussão o seguinte: qual é o resultado que precisamos alcançar e quanto podemos realizar em uma semana? Se você desempenha o papel de Product Owner, Project Manager, Scrum Master ou outra função, é importante analisar e dialogar com a equipe. Antes mesmo de iniciar a produção do jogo, é necessário criar a história, definir o tipo de jogo, os personagens, as mecânicas e outros elementos, então pode ser apropriado reservar uma “sprint 0” para se concentrar nessa etapa; por exemplo, quando o entregável envolve atividades relacionadas ao design do jogo. A questão fundamental aqui é estabelecer um diálogo com a equipe responsável por cada tarefa e, de forma colaborativa, analisar o tempo necessário para que cada membro entregue as atividades requeridas. Isso permite que todos tenham uma visão clara dos passos seguintes e saibam quanto podem avançar no desenvolvimento.

Existem muitas ferramentas que você pode utilizar para administrar as sprints, aposto que algumas você até já conhece! Mas mesmo assim, vou listar algumas que são minhas preferidas: Notion, ClickUp e GitHub Projects.

Missão: Escolha a Engine e as Linguagens!

Neste estágio, é crucial escolher a engine que irá impulsionar seu jogo. A missão aqui é avaliar as opções disponíveis, como Unity, Unreal Engine, Godot, e decidir qual se adequa melhor às necessidades do projeto. Além disso, defina as linguagens de programação que serão usadas para criar o jogo. A escolha certa da engine e linguagens pode afetar significativamente a eficiência do desenvolvimento e a qualidade do jogo, tanto que se for uma linguagem/engine nova para o time, o tempo de adaptação deve ser crucial na organização de sprints!

Missão: Documente, Documente, Documente…

A documentação é uma parte essencial do desenvolvimento de jogos. Sua missão é criar documentos que descrevam detalha — damente todos os aspectos do jogo. Isso inclui documentos de design, documenta — ção técnica, documentação de arte e muito mais. A documentação serve como um guia para a equipe e ajuda a evitar problemas de comunicação e retrabalho. Certifique-se de que todos os membros da equipe estejam cientes da importância da documentação.

Missão: Defina Metas Claras

Para manter o projeto no caminho certo, é fundamental definir metas claras. Determine o que você deseja alcançar em cada fase do desenvolvimento. Estabeleça metas realistas para o lançamento do jogo, como datas de entrega de versões beta ou completas. As metas fornecem direção à equipe e ajudam a medir o progresso. Certifique-se de que todas as metas sejam específicas, mensu — ráveis, alcançáveis, relevantes e temporais (SMART).

Level UP!

Cada uma dessas missões desempenha um papel vital no desenvolvimento do jogo. A escolha da engine e linguagens afeta diretamente a viabilidade técnica do projeto. A documen — tação ajuda a garantir que todos na equipe estejam na mesma página e evita problemas de comunicação. E a definição de metas mantém o projeto no caminho certo e permite que todos saibam o que é esperado deles. Portanto, não subestime a importância de cumprir essas missões no Level 1!

Level 2

Missão: Forjando Épicas — Qual é a sua história?

Nada cativa os jogadores como uma narrativa envolvente. Comece criando o esqueleto da história, incluindo o enredo principal, personagens-chave e principais pontos de virada. Considere o mundo do jogo e como ele se relaciona com a história. Desenvolva personagens que tenham objetivos e motivações claras, criando conflitos que impulsionem a trama. Pense na estrutura do roteiro, como atos e arcos de personagens. Lembre-se de que uma história bem estruturada não apenas entretém, mas também guia os joga — dores através do universo do jogo, mantendo-os intrigados e ansiosos por mais.

Missão: Hora de craftar! (pixel à pixel)

Os sprites são os elementos visuais que darão vida ao seu jogo. Considerando a ambientação (seja ela medieval, cyberpunk ou outra), é fundamental definir a estética visual. Considere as dimensões dos sprites para garantir que sejam proporcionais e funcionais no contexto do jogo. Isso é especialmente importante se você planeja que os sprites interajam uns com os outros ou com o ambiente. Lembre-se de manter a consistência visual para garantir que todos os elementos do jogo se encaixem harmoniosamente.

Missão: Escolha seus heróis!

O design de personagens vai muito além da aparência física. Desenvolva cada personagem com profundidade, criando perfis que incluam sua personalidade, história de fundo e motivações. Pense em como cada personagem contribui para a narrativa e como eles se relacionam entre si. Considere o papel deles no jogo, se são heróis, vilões ou personagens secundários. Um design de personagens bem-sucedido não apenas torna os personagens visualmente atraentes, mas também os torna cativantes e memoráveis para os jogadores.

Missão: Crie imersão através do som!

O som é uma parte essencial da experiência do jogo. Ao criar uma trilha sonora e efeitos sonoros, leve em consideração a atmosfera que deseja criar. A música e os efeitos devem se adequar ao tom do jogo, contribuindo para a imersão dos jogadores. Além disso, pense na acessibilidade sonora, incluindo legendas e opções de áudio para jogadores com deficiência auditiva. O som é uma poderosa ferramenta para evocar emoções e aprofundar a conexão dos joga — dores com o jogo.

Missão: Guie através da Game UI!

A interface do usuário é a ponte entre os jogadores e o mundo do jogo. Projete a Game UI de forma intuitiva e atraente, garantindo que os jogadores possam navegar facilmente e compreender as informações apresentadas. Isso inclui a disposição de menus, ícones, botões e barras de sta — tus. Lembre-se de que a Game UI deve ser informativa, mas também discreta o suficiente para não distrair os jogadores da ação principal. Uma interface bem projetada melhora a experiência do jogador, tornando o jogo mais acessível e agradável.

Missão: Tijolo a Tijolo, do Tile ao Tileset!

Os cenários são o cenário onde a ação se desenrola. Ao criar tiles e tilesets, pense nos detalhes que tornarão o mundo do jogo vívido e interativo. Considere as texturas, as cores e a coesão visual entre os diferentes elementos do cenário. Certifique-se de que os tiles se encaixem de forma agradável, permitindo a criação de ambientes varia — dos e convincentes. A criação de cenários não é apenas sobre estética, mas também sobre como eles afetam a jogabilidade. Os cenários devem ser projetados de forma a apoiar a narrativa e proporcionar desafios interessantes para os jogadores.

Level Up!

Cada uma dessas missões é fundamental para a construção de um jogo bem-sucedido. Ao explorar o reino dos jogos, você estará moldando o universo que os jogadores explorarão, tor — nando-o cativante e envolvente. Dedique tempo e criatividade a esses aspectos, e você estará no caminho certo para criar uma experiência de jogo inesquecível.

Level 3

Missão: Seja um contador de histórias!

Para criar uma história de jogo cativante, mergu — lhe nas profundezas do conhecimento. Estude aspectos políticos, atualidades, referências históricas e científicas que podem enriquecer o arcabouço teórico da sua narrativa. Lembre-se de como a série “The Last of Us” da HBO Max usou uma cena inicial que discutia a probabili — dade dos fungos consumirem a mente humana para criar uma imersão arrepiante. Compreender o contexto científico por trás disso é fundamen — tal. Da mesma forma, considere cenas icônicas como a de “Lucy” e “e se nós usássemos 100% do nosso cérebro?” que deixam as pessoas intrigadas até hoje. Criar narrativas convincentes é essencial para a imersão e para se destacar no mercado de jogos.

Missão: O mundo nas suas mãos através do Level Design

O design de níveis é a espinha dorsal da jogabilidade. Sua missão aqui é criar ambientes cativantes e desafiadores. Planeje a progressão do jogo, estabeleça os objetivos dos níveis e pense nos elementos que manterão os jogadores envolvidos. Considere a conexão entre os níveis e como eles se encaixam na narrativa global. Lembre-se de que o level design é onde os jogadores passarão a maior parte do tempo, então torne-o memorável e envolvente.

Missão: Seja um Mestre, pesquise e reflita!

A temática do jogo deve refletir o interesse e o conhecimento da equipe. Explore outras realidades, compreenda experiências e dores para criar personagens mais autênticos e conexões profundas com os jogadores. Pergunte-se: o que apaixona a equipe? Qual é a mensagem que vocês desejam transmitir? Ao incorporar temas que vocês entendem e abraçam, o jogo se tornará mais autêntico e impactante.

Missão: Mantenha as engrenagens girando

A jogabilidade é o coração do seu jogo. Sua missão é definir as mecânicas que tornam a experiência interativa e divertida. Pense no ciclo de jogo: o que os jogadores farão repetidamente e como isso os mantém engajados? Considere os desafios que os jogadores enfrentarão e como as mecânicas afetam a narrativa e o progresso. Equilibre o desafio e a recompensa para criar uma experiência envolvente.

Missão: Aprenda com os melhores!

Para entender a construção de um jogo de sucesso, desmonte-o peça por peça. Analise a mecânica central do jogo, o ciclo de gameplay e o desafio que os jogado — res enfrentam. Pergunte-se por que esse jogo é tão atraente e como ele mantém os jogadores voltando. Ao desconstruir um jogo de referência, você aprenderá lições valiosas que podem ser aplicadas ao seu próprio projeto. Neste nível, você estará se aprofundando na criação da experiência de jogo, explorando a narrativa, o design de níveis, a temática, as mecânicas e a análise de jogos de referência. Cada missão é crucial para criar um jogo que seja envolvente, autêntico e memorável, deixando uma marca duradoura no mundo dos jogos.

Level Up!

Agora que você absorveu os prin — cipais fundamentos para o desen — volvimento do seu jogo, está na hora de colocar a teoria em práti — ca. Mãos à obra! E para começar, que tal um tutorial simples sobre como criar um personagem em pixel art usando o Aseprite, uma ferramenta excelente para essa tarefa?

Level 4

1. Instale o software

Se você ainda não possui o Aseprite instalado, faça o download e a insta — lação da ferramenta em seu computador. Não se preocupe, o programa é Open Source e você pode encontrar facilmente o tutorial de instala — ção no repositório do GitHub, mas recomendo fortemente que dêem apoio aos devs, sabemos bem como é, né?

2. Crie um Novo Projeto

Abra o Aseprite e crie um novo projeto definindo o tamanho da tela (por exemplo, 32x32 pixels) e a paleta de cores que você deseja utilizar, baseado em todo o estudo que você já tem sobre o seu personagem.

3. Crie um Esboço

Comece com um esboço do seu personagem. Use a ferramenta lápis para desenhar os contornos e as formas básicas do personagem, no entanto, para ajudar à criar formas mais “certinhas” você pode utilizar a ferramenta de pixel-perfect, deixando seus traços mais simétricos.

4. Preenchimento de Cores

Com o esboço em vigor, preencha as áreas do personagem com as cores apropriadas. Lembre-se de que, em pixel art, a precisão e o uso inteligente das cores são essenciais, até mesmo porque os sprites são bem pequenos, então um pontinho aqui e outro ali pode fazer uma diferença considerável!

5. Detalhes e Sombreamento

Adicione detalhes ao seu personagem, como olhos, roupas e acessórios. Use tons mais escuros para criar sombras e dar profundidade ao personagem.

6. Animação Frame a Frame:

a. Frame Inicial (Idle): Crie o primeiro quadro da animação, que será o estado “idle” do seu personagem. Mantenha-o em uma posição neutra, como se o personagem estivesse parado. Certifique-se de que todas as características estejam alinhadas e coerentes com o design.

b. Frame Seguinte: Crie um novo quadro para a animação, levemente deslocado do quadro inicial. No caso da Bellatrix, a protagonista do jogo Totalitaire, deslocamos um pouco a posição dos braços e modificamos as feições dela. Use o “onion skinning” do Aseprite para ver o quadro anterior como referência.

c. Repita o Processo: Continue criando quadros subsequentes, fazendo pequenos ajustes a cada novo quadro para simular uma animação suave. Pode ser uma leve oscilação ou uma animação de respiração, dependendo do personagem.

d. Exportação: Quando estiver satisfeito com a animação, exporte-a em formato GIF. Você pode fazer isso selecionando “File” > “Save for Web” e escolhendo o formato GIF. Isso permitirá que você crie uma animação em loop para o personagem.

e. Crie um Repositório no GitHub: Para manter seu trabalho documentado e compartilhá-lo com sua equipe, crie um repositório no GitHub. Faça o upload dos arquivos, incluindo a animação GIF e quaisquer outros recursos relacionados ao seu jogo. Isso facilitará a colaboração e o controle de versões.

Lembre-se de que a prática é fundamental para aprimorar suas habilidades em pixel art e animação. Continue experimentando e refinando seu personagem e suas animações até alcançar o resultado desejado. Divirtase e aproveite o processo criativo!

Level Bônus

Desenvolver jogos é uma jornada desafiadora, e o sucesso de um time de desenvolvimento de jogos depende principalmente de uma gestão eficiente. Reconheça e enfrente os obstáculos com determinação e saiba como engajar os membros da equipe para manter o ritmo e a motivação elevados. Lembre-se de que o processo de criação de jogos pode ser trabalhoso, mas a recompensa de ver seu projeto ganhar vida é incrível.

Além disso, considere a monetização como uma etapa importante. Existem diversas maneiras de rentabilizar seu trabalho, desde a venda de sprites e outros ativos até o lançamento e comercialização do próprio jogo. Explore oportunidades de negócios adicionais, como a criação de um site dedicado ao seu jogo, para expandir sua presença no mercado e atrair mais jogadores.

Não subestime a importância de avaliar os tipos de investimento necessários para o seu projeto. Isso inclui custos de exportação do jogo e outros recursos. Avalie os riscos e viabilidades para tomar decisões informadas que ajudarão a manter seu projeto dentro do orçamento e prazo.

Lembre-se também de que não há problema em deixar algumas tarefas em standby, desde que a equipe esteja entregando no geral. Ao reconhecer os avanços da equipe e manter uma comunicação transparente, você promove um ambiente de trabalho saudável e produtivo, onde todos podem contribuir para o sucesso do projeto.